MIL NOVECENTOS E SETENTA E CINCO! Que ano fantástico foi esse na história da música? Porque não é considerado emblemático e fundamental como outros? A quantidade de clássicos absolutos concebidos chega a ser surreal! Na primeira parte do TOP 5 referente a “magia de 75”, vejam aqui as preciosidades que foram escolhidas: https://roadie-metal.com/top-5-albuns-que-marcaram-1975/
Assumo que pela primeira vez nesse quadro, minha escolha terá que ser afetiva TAMBÉM, porque o número de maravilhas que tivemos que deixar de fora, parte o coração… Primeirão “matador” do Rainbow (uma das melhores estreias da história, além de apresentar Ronnie James Dio para o mundo), “Ritchie Blackmore’s Rainbow “ (inicialmente era para ter sido um álbum solo do guitarrista); o ápice de Elton John, com seu disco mais vendido (sem single de sucesso para puxar vendas) e incensado (obscuro e repleto de influências dos Beatles e de rock progressivo) até então, “Captain Fantastic and the Brown Dirt Cowboy”; “Sabotage” do Black Sabbath, e seu lado experimental exacerbado (muitos acham genial, outros o início do declínio da fase Ozzy), que nos deu o hino “Symptom of the Universe”; uma das obras-primas do folk-rock, o intimista “Blood On The Tracks”, de Bob Dylan; o estouro de Patti Smith com o poderoso proto-punk “Horses“; a consagração definitiva do Aerosmith, com o arrasa-quarteirão, “Toys in the Attic”; UFA!
Ainda tínhamos o AC/DC lançando seus primeiros trabalhos em solo australiano (resultaria no compilado “High Voltage”, ano seguinte); a fase mais gloriosa do Fleetwood Mac no disco homônimo; o experimento fantástico do “soul da Filadélfia” de David Bowie, “Young Americans”; o marcante “Zuma”, de Neil Young and The Crazy Horse; o sensacional “Fruto Proibido”, de Rita Lee & Tutti Frutti; o seminal “Criaturas da Noite”, do O Terço, clássico do progressivo nacional… Meus deuses, são MUITOS TOP 5 em 1975!!! Mas com bastante dificuldade na escolha (vocês perceberam!), vamos aos meus:
Alice Cooper – Welcome to my Nightmare
Esse projeto representou a ruptura da Alice Cooper Group para a carreira solo do frontman e líder Vincent Furnier (que atende pelo pseudônimo que dava nome ao bardo). A banda vinha de uma fase fantástica, com clássicos construídos recentemente, como “Killer”, “Love it to Death”, “School’s Out” e “Billion Dolar Babies”. Com o desmantelamento após a turnê pela América do Sul (com direito a apresentação histórica no Brasil), Alice não podia deixar “a peteca cair”, e investiu PESADO em sua nova incursão. “Welcome to my Nightmare” era uma premissa tão ambiciosa quanto grandiosa.
Multimídia! Além do álbum conceitual com ares de ópera-rock (com direito a instrumentos eruditos emulando uma orquestra), contando a sinistra saga dos pesadelos da criança chamada Steven, um especial de TV com direito a participação do mestre do horror, Vincent Price, que também fez narrações incríveis no disco. Esses 40 minutos de audiovisual impactaram tanto, que posteriormente Vincent foi chamado para a narrativa revolucionária de “Thriller”, do Michael Jackson, no início dos anos 80 (sua gargalhada ao final da canção foi emblemática!). E o show da turnê, foi uma mega-produção com ares de Broadway, tendo ainda mais efeitos visuais, terror, bailarinos, figurinos em profusão, etc. Mas voltando ao disco “Welcome to my Nightmare” em questão, simplesmente mais um clássico foi concebido com louvor! Para muitos fãs, talvez o maior deles. Acompanhado do fiel escudeiro Bob Ezrin na produção e a parceria musical de Dick Wagner, desce maravilhosamente de uma tacada só, tamanho brilhantismo na diversidade musical proposta.
Cinco canções são basicamente obrigatórias nos shows de Cooper até os dias atuais, como a singular faixa-título, que harmonicamente flerta com o soul-jazz numa aura vaudeville; a singela e maravilhosa balada “Only Women Bleed” (um dos seus maiores clássicos) sobre o universo feminino, se tornou um líbelo feminista gravado por Tina Turner, Lita Ford, Etta James, entre outros; “The Black Widow“, com a narração sinistra de Price, é um rockaço de ares psicodélicos que geralmente promove a abertura dos shows; em “Cold Ethyl“, Alice Cooper aborda a necrofilia repleta de humor negro, em que o protagonista tem envolvimento com uma figura fria e inanimada durante seus delírios do sono; e a catarse de “Steven”, que começa intimista com um piano de “ares terroríficos” e o refrão é poderoso até a medula! Destaques a parte, todo o álbum é magistral em seu preceito de abordar a fundo o inconsciente de desdobramentos mentais através dos pesadelos, muito antes do surgimento de Freddy Krueger. A saga termina com um questionamento: os acontecimentos propostos foram apenas fruto do pesadelo de Steven? Ou através de sonambulismo, atos se conceberam? MAGISTRAL! Tivemos uma segunda parte do álbum em 2011, mas aí é outra história…
Lançamento: 11 de março de 1975. Produção: Bob Ezrin. Gravadora: Atlantic Records.
Bruce Springsteen – Born to Run
Consagração! Esse é o álbum que apresentou Bruce Springsteen para o mundo, e considerado um dos seus maiores clássicos. Foi certeiro, só tinha mais esse projeto antes de finalizar o contrato com a gravadora CBS/Columbia. A pressão juntamente a possante E Street Band era enorme, apenas o sucesso de crítica que determinou ao “The Boss” (que tinha apenas 24 anos) a alcunha de “novo Bob Dylan”, não bastava para seguir adiante… O terceiro disco da carreira foi o responsável por fazer Bruce Springsteen alcançar o mainstream, ficando em terceiro lugar na Billboard e chegando a marca de milhões de cópias vendidas. Através de extensas verves poéticas sobre o amor (histórias sensíveis, como manda a tradição folk), uma de suas características artísticas vitais viria a tona: a interlocução direta com o cidadão médio americano. E musicalmente, temos um primor instrumental, com destaque absoluto para o saxofonista Clarence Clemons, e os vocais de Springsteen, repletos de personalidade e cada vez mais afiados!
A “bolacha” já começa com um dos seus maiores clássicos, “Thunder Road”. A indefectível introdução com gaita, discorre para um crescente sonoro juntamente a belíssima letra (homenagem velada ao estilo de Roy Orbison), que culmina no poderoso refrão. CLÁSSICO! E temos outros em “Born to Run”, que nunca saíram do set-list: “Tenth Avenue Freeze-Out”, e sua irresistível influência jazzística; a faixa título, um dos grandes hinos do rock’n’roll, daqueles que nasceram para multidões cantar junto em estádios, é a maior marca-registrada do estilo Bruce Springsteen; “Jungleland”, épico arrepiante com contundente arranjo de cordas, no alto de seus 9 minutos, um retrato fidedigno à diversidade musical apresentada (concentrada nas raízes da música americana), encerramento magistral do disco! E ainda temos o primor acústico DE CHORAR,“Meeting Across The River”, os rockaços “Night” e “Backstreets”, e a levada “bluesera” de “She’s the One”… Valeu a pena terem ficado 14 MESES envolvidos ferrenhamente nas gravações! O lamento jorra pela curta duração, o gostinho de “quero mais” é inevitável. Uma das grandes obras-primas da música mundial!
Lançamento: 25 de agosto de 1975. Produção: Bruce Springsteen, Mike Appel e Jon Landau. Gravadora: CBS/Columbia.
Deep Purple – Come Taste the Band
O Deep Purple fez cair por baixo a premissa que toda banda que está se desmantelando, tendo uma esfacelação interna, produz trabalho ruim. “Come Taste the Band” é o “canto dos cisnes” do grupo nos anos 70, com chave de ouro! E impressionantemente, sem Richie Blackmore!!! O genial e temperamental guitarrista deve ter “pago um dobrado” pelo acento swingado que rolou no anterior e poderoso “Stormbringer”. Tanto que após debandar, montou o Rainbow como “patrão”, o trauma em não ter o controle absoluto foi grande pelo visto… Glen Hughes e David Coverdale brilharam os olhos, e partiram para uma imersão BEM MAIOR no funk-soul, dentro do hard rock pesadaço característico da banda, que já arrebata pela ousadia. Mas não é que “pegou” maravilhosamente em termos sonoros?
A entrada de Tommy Bollin (ex-James Gang) foi fundamental para essa liga, o cara se sentiu em casa e “soltou os bichos’, literalmente! Trabalho magnífico de guitarra (o solo de “Owed To ‘G'” é antológico!), mas lamentavelmente foi sua despedida, já que uma overdose o levaria logo depois (não viu o disco ser lançado). Glen, desde os tempos de Trapeze mostrava sua incrível influência black, e estava bastante impressionado com os lançamentos de grande sucesso da gravadora Motown ao redor, era impossível não se “contaminar”. Aliás, pérolas como “I Need Love”, “Gettin’ Tighter” e “Dealer”, poderiam ter sido gravadas por Stevie Wonder, Marvin Gaye, Diana Ross e outras estrelas da companhia. Mas o inconfundível Deep Purple de outrora se fazia presente em “Drifter” (Paice destruindo como sempre!), as riffzeras incríveis de “Comin’ Home” e “Love Child” (Jon Lord mete um solo cheio de efeitos sensacional!) podem figurar entre os grandes clássicos da lenda. Mas o ENCERRAMENTO é coisa de outro mundo, com as incríveis pérolas soul, “This Time Around” (Glen Hughes soberbo nos vocais) e a mais pesada “You Keep on Moving” (um dos maiores duetos de voz já concebidos). Simplesmente é de CHORAR!!!
Coverdale mais do que nunca AQUI, deixava claro que já era um dos maiores vocalistas da história. Uma pena que após a prematura morte de Bolin, todos perceberam que estavam pegando muito pesado com as drogas, foram se “salvar” e encerraram atividades. O disco para a banda tem essa pecha de “maldito” pelas questões pessoais que estavam enfrentando e por não ter sido trabalhado como o usual, não teve o sucesso que merecia. Os fãs? Bem, o mais xiita dizia que o som era mais “acessível” que o habitual, poderia ter sido mais pesado, mas RUIM, fatalmente ninguém alegou… Tem “louco para tudo”, mas esse é um caso IMPOSSÍVEL de acontecer com “Come Taste the Band”!
Lançamento: 10 de outubro de 1975. Produtor: Deep Purple & Martin Birch. Gravadora: EMI (Reino Unido), Warner (EUA).
Kiss – Alive!
Se não fosse por esse registro ao vivo, o KISS fatalmente teria sucumbido e não seria essa imponente lenda planetária do rock’n’roll. É o primeiro álbum live que seleciono no quadro TOP 5, por ser ESSENCIAL para o sucesso da banda e reconhecidamente quase que por unanimidade, um dos mais impactantes discos ao vivo da história! Os dois álbuns anteriores (homônimo e “Hotter than Hell”) e o recente “Dressed to Kill”, (também lançado em 1975), apesar do fantástico repertório, desagradavam a banda no quesito produção e não aconteceram como o esperado. Lembrando que o sucesso de vendagens no momento vigente era algo primordial (a indústria fonográfica crescia assustadoramente!), ainda mais para uma gravadora nova como a Casablanca. O Kiss era a maior aposta da corporação, tinha todo o suporte, shows lotados (foram “expulsos” de várias turnês como banda de abertura por “roubar a cena” da atração principal), mas os discos infelizmente encalhavam nas lojas…
O maior questionamento do grupo era que a captação potencial das apresentações ao vivo, não conseguia ser transmutada para o estúdio, e isso era primordial para impactar o ouvinte de “primeira viagem”. Aqueles que já tinham tido acesso através dos shows, se deslumbravam visualmente com tudo que o KISS trazia (maquiagens, pirotecnia, teatralidade e MUITA energia!) e quando compravam o material, percebiam que faltava algo na sonoridade… Foi quando o executivo Neil Bogart teve o ousadíssimo insight: “vamos fazer um disco ao vivo então”? Além de caro para os padrões da época, registro live sem possuir um hit radiofônico qualquer? Era loucura e uma premissa muito associada a concepção de “tudo ou nada”, depois de todo o investimento feito. E felizmente para todos nós, o risco deu certo! A divulgação de “Rock’n’roll all Night” do “Alive!” por rádios diversas, fez um dos maiores hinos musicais da história explodir. Detalhe que havia sido lançada no mesmo ano em “Dressed to Kill”, e NADA havia acontecido! Impressionante como esse disco realmente capta o furor enlouquecido de uma apresentação do KISS. E ainda serviu para apresentar todo o repertório magistral dos três registros de estúdio, e vários clássicos fomentaram ao grande público.
O produtor Eddie Kramer conseguiu fazer um excepcional trabalho. O som resgatado de apresentações das mais diversas (Wildwood, New Jersey, Davenport, Iowa, Cleveland e Detroit) enlouquecia os ouvintes que ficavam intimados a ir ao show, e a lenda surgia desde então! Ok, mais tarde todos assumiram que a maior parte da captação foi refeita em estúdio… Era uma época em que o público realmente acreditava que o disco ao vivo era um retrato fiel da apresentação. Mas hoje entendemos plenamente que a banda não tinha “mais cartuchos para queimar”, e o resultado não poderia ser outro que não fosse O SUCESSO. E fatalmente essa precisão no material apresentado foi deveras fundamental para o arrebatador resultado. Impossível não destacar o solo matador da bateria de Peter Criss durante “100.000 Years”, juntamente a interação enlouquecida de Paul Stanley com a platéia na íntegra! Isso não era nada comum na época em discos ao vivo, e só transportava ainda mais diretamente o ouvinte para o espectro sensorial do show, além de colocar a platéia como protagonista, não apenas a música. KISS “ALIVE!” é revolucionário!
Lançamento: 10 de setembro de 1975. Produtor: Eddie Kramer. Gravadora: Casablanca.
Rush – Caress of Steel
Eu realmente NUNCA conseguirei entender porque “Caress of Steel” foi tão injustiçado e erroneamente subestimado por crítica, fãs e até mesmo pela própria banda desde o seu lançamento. Além de ser um dos melhores álbuns de transição sonora já concebidos, o repertório é absurdamente especial! O Rush trouxe em seu álbum de estreia a sonoridade pesada hard-setentista que era habitual, os levando diretamente a uma comparação com o Led Zeppelin. A entrada de Neil Peart na bateria trouxe maior consistência (além de ser um letrista formidável), o que foi percebido em “Fly by Night” (muito bem recebido!), lançado no início de 1975. E a química se deu de forma tão mágica, que no mesmo ano teríamos essa pérola lançada, deixando bastante claro para todos que o Rush seria MUITO além de mais um grupo querendo tocar “blues-virulento-distorcido” e se estabelecer naquela cena. Por já terem conquistado um significativo público desse segmento, talvez isso não foi muito bem entendido na época…
O mercado progressivo começava a dar sinais de desgaste, então porque migrar para caminhos experimentais e mexer no que estava dando certo? Aí que está! Era muito talento, criatividade e virtuosismo junto para os canadenses serem “mais um na multidão” e se acomodarem. E nesse disco, isso soa latente em sua obviedade! A introdução com a pesadaça “Bastille Day”, traz exatamente o que já vinham fazendo, nada de sustos. A letra diferenciada sobre o grande evento da revolução francesa e os vocais mais diversificados e afiados de Geddy Lee, fazem desta uma das melhores canções dessa fase. “I Think I’m Going Bald” surpreende por ser mais acessível, e trazer uma narrativa repleta de senso de humor. Nítida influência do cenário mais festivo americano. “Lakeside Park” é simplesmente maravilhosa, uma sonoridade mais etérea e intimista para descrever uma viagem ao passado. Alex Lifeson mostra toda a sua versatilidade genial em uma das mais belas canções do Rush.
E então, o jogo vira de vez! A FENOMENAL “The Necromancer”, com seus quase 13 minutos, divida em três peças: “Into The Darkness”, “Under The Shadow” e “Return Of The Prince”. A letra é inspirada em “O Senhor Dos Anéis” e os três viajantes citados seriam Frodo, Sam e Gollum. E na terceira parte, o personagem “By-Tor”, protagonista de “By-Tor And The Snow Dog”, do álbum anterior, representava o vilão, mas retorna aqui como um herói. É uma das viagens mais irrepreensíveis da banda, e DEVERIA figurar entre os grandes clássicos surgidos na fase progressiva. Assim como “The Fountain Of Lamneth”, com seus vinte minutos de duração, dividida em várias suítes e ocupando todo o lado B do vinil. Temos aqui duas das mais incríveis composições da história do rock progressivo, SOBRA raro talento e criatividade em todas as passagens, é admiravelmente brilhante! COMO essas maravilhas não figuram entre os grandes clássicos da banda? Tudo bem, o que não faltou mais a frente foi ALTO NÍVEL em composições, talvez por isso a visibilidade merecida não tenha vindo. O estouro no formato progressivo viria no trabalho seguinte “2112‘, mas foi com “Caress of Steel”, que tudo começou…
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