Desde o início dos tempos
O destino do homem é o mesmo dos piolhos
Igual a parasitas
Movendo-se sem seus olhos
Um dia de acerto de contas
Quando a penitência for queimada
Juntos agora na contagem regressiva
Digam as palavras
Que irão aprender


NR: Trecho extraído de “Year Zero” – Ghost

HISTÓRICO: Ghost é uma banda sueca lançada em meados de 2010 na cidade de Linköping. A banda foi originalmente fundada em 2008 e só foi oficialmente publicada dois anos depois, graças a gravação de uma demo com três músicas apenas: “Death Knell”, “Elizabeth” e “Prime Mover“. Sua discografia é composta até o momento, além da demo já mencionada, de 4 álbuns de estúdio, 1 disco ao vivo, 9 singles e 2 Ep’s.  

O estilo da banda mistura doom metal, heavy metal tradicional, rock psicodélico típico dos anos 70, somado ao rock alternativo mais moderno. As letras das músicas são, em sua maioria, de cunho satanista – porém de forma teatral, o que contrasta com a sensibilidade pop e os vocais limpos que permeiam as canções. Os teclados vintage e a produção muito limpa, sem exageros de compressão, fazem os álbuns soarem inteiramente analógicos e também remeterem à década de 70.

Os membros da banda são originalmente anônimos, porém, após uma série de conflitos legais tornou-se público que o vocalista e líder da banda seria o músico sueco Tobias Forge. As apresentações do sexteto trazem uma atmosfera cênica inspirada em rituais satânicos e filmes de terror clássicos, com todos os membros caracterizados como sacerdotes em uma missa negra. O vocalista adentra o palco vestido como um pontífice e carregando um turíbulo utilizado nas litanias católicas.

DISSECANDO O DISCO: a abertura do disco (que é a faixa-título) se dá com um característico “canto gregoriano”, entretanto, a lá Ghost – óbvio – contando com suas habituais blasfêmias. Temos aqui um versinho bem “gostoso” de cantarolar e de fácil assimilação. De súbito, encaixa-se a faixa “Per Aspera Ad Inferi”, que traduzido significa algo próximo de “pelas dificuldades até o inferno”. Tentando não ser redundante ao falar do Ghost, pode-se afirmar que a letra desta track, é satânica até os ossos! Diga-se isto pelo fato de algumas das músicas possuir uma temática (apenas) obscura, com uma mensagem mais subjetiva. Este é até hoje um dos maiores clássicos da banda, e quase sempre tem composto o setlist em apresentações ao vivo. Na sequencia, temos o primeiro single do disco, “Secular Haze”, que surpreende os ouvintes desavisados com seu farfalhar de teclas circenses, acompanhado pelo ribombar atordoante da bateria. Esta track trás consigo umas das letras “menos satânicas, e mais obscuras”, conforme mencionado há pouco. Também pode ser considerado um clássico ad eternum da banda. A faixa recebeu um trabalho visual, bastante “pitoresco”:

Ghost B.C. – Secular Haze

“Jigolo Har Megiddo” acompanha a mesma essência de sua antecessora, apresentando um clima mais “descontraído”, porém, mais animado – nada monótono como a faixa anterior. A temática desta track é um tanto quanto “lasciva”, destacando os conhecimentos de “Goetia” de Forge. “Ghuleh / Zombie Queen” recupera a monotonia de “Secular Haze” – pelo menos no início. Quanto à letra, continuamos explorando aqui alguns dos mistérios da “Goetia”, onde Forge destaca o mito do súcubo (demônio que supostamente toma a forma de mulher e vem perturbar o sono dos homens mantendo com eles conjunção carnal), aqui incorporado pelo personagem “Rainha Zumbi“. Pode-se até afirma que esta track seria uma “mescla” entre suas duas antecessoras, contando com o clima sombrio de “Secular Haze” e a temática lírica “sexual-diabólica” apoiando “Jigolo Har Megiddo”. Certamente, o maior destaque do presente registro fica por conta de “Year Zero”. A música, além de muito atrativa, tem uma letra muito forte (no sentido do satanismo bíblico impregnado), criando um clima denso e pesado ao entoar o nome profano de várias entidades infernais. “Year Zero” foi o segundo single do disco, e em seu lançamento em 12 de Março de 2013 recebeu uma curiosa versão reproduzida “ao contrário (ou de trás para frente), assim como faziam os headbangers mais “trues” no passado num ato rebelde de “girar o vinil ao contrário”. O clipe da música teve sua versão original censurada (aplicando-se tarjas pretas nas partes íntimas – “diga-se peitos” – das mulheres que contracenam no vídeo). Contudo, a versão “sem censura” ainda encontra-se disponível para os menos “impressionáveis”:

Ghost B.C. – Year Zero (Censored)

O clima “descontraído” – no quesito musical – se retoma com “Body And Blood”, pois, em se tratando da letra, aqui temos versos de arrepiar: “Essa sepultura fede a morte; O cheiro forte da terra; Como o bafo do cão; A respiração de um morto; A tampa do caixão está fria; Esperando dentro; Alguém está petrificado?; Que fede a velho“. Eu senti calafrios, você não? “Idolatrine” mistura um clima harmonioso vintage – que é bastante intrínseco no âmago da banda – denotando a felicidade de Emeritus ao condenar a idolatria dos tolos: “Idolatria para os imbecis; Idolatria para os débeis e os simplórios”. “Depth Of Satan’s Eyes” declama profanidades “aos olhos de Satã”. A letra ataca diretamente a Bíblia e a fé Cristã – em sua temática. Trechos como: “À fonte de sabedoria; Além das mentiras da bíblia; À profundidade sem fim; Dos olhos de satã”, retratam como a banda leva sua ideologia acima de qualquer suspeita. O disco original encerra-se com “Monstrance Clock”, que apresenta uma cadência “encantadora”, com um trabalho de guitarras de muita personalidade. Os solos diversos ao longo da track prendem a atenção do ouvinte, e são capazes de criar uma viagem atmosférica. O final da música pode-se considerar um dos mais atraentes do disco, pela proposta e pela originalidade. Algumas versões do álbum contam com faixas bônus: na versão Deluxe, além do cover de “I’m a Marionette” do Abba, nos deparamos com a “curiosa” faixa “La Mantra Mori” que acrescenta continuidade à viagem iniciada no clima proposto por “Monstrance Clock”. Trata-se literalmente de um “mantra”, que conta apenas com os versos: “Nós nos concentramos em sua morte; Nós nos concentramos em sua morte; Você não compartilha nosso sangue, nosso, nosso; Assim, vamos nos concentrar na sua morte” repetidos incansavelmente. Para os adeptos – e/ou pacientes – há uma versão interessante da faixa postada no Youtube por “terceiros alheios ao Ghost”, onde contamos com pouco mais de “1 hora(!)” do referido mantra repetido em loop:

https://www.youtube.com/watch?v=I1Ik7XvDUI8
Ghost – La mantra mori [one hour loop]

NR: Mantra é uma sílaba ou poema, normalmente em sânscrito. Os mantras se originaram do hinduísmo, porém são utilizados também no budismo e jainismo, bem como notoriamente por práticas espirituais que não têm vínculo com religiões estabelecidas. No tantrismo, são usados para materializar as divindades.

Por fim, na versão japonesa do disco encontramos o cover de “Waiting for the Night” do Depeche Mode. A faixa também está disponível nas plataformas de streaming e no Youtube. 

OPINIÃO: O Ghost foi uma das bandas que mais me surpreendeu nos últimos anos – quiçá, a que mais surpreendeu! Conheci os caras, praticamente, no show deles, quando foram suporte aos shows de Slayer e Iron Maiden, em 2013, enquanto na tour particular de promoção do disco abordado nesta matéria. Posso destacar que percorri mais de 600 kms para ver os headliners, satirizando muito os (coitados) da até então desconhecida “banda de abertura” – um erro que jamais tornarei a repetir, visto que a volta da viagem foi amarga, por ter que conviver o resto de meus dias engolindo um “cabo de guarda-chuvas” por conta de ter tornado o agora conhecido por mim Ghost, como sendo uma de minhas bandas preferidas. Este disco considero impecável, dos principais de cabeceira, audíveis em qualquer situação, com qualquer companhia: seja para distrair, para estudar, para transar, para se alimentar, ao tomar banho, numa festa, onde quer que você esteja, ouça “Infestissumam” sem medo!

Apesar de ter neste trabalho o Ghost se distanciado levemente da obscuridade demonstrada no trabalho anterior – o também primoroso “Opus Eponymous” – continuo neste registro absorvendo em grandes doses o ocultismo e os segredos das artes negras pregadas incansavelmente por Tobias Forge. O disco é praticamente “anti-enjoativo”, repleto de variações sonoras que vão do pop ao metal com extrema facilidade e sincronia, criando loopings que saltam do entusiasmo à depressão. É um trabalho exemplar, assim como todo o trabalho da banda. Até mesmo os peculiares covers soam muito atrativos e condizentes com a proposta da banda. Mas, claro, essa é a minha opinião!

CONCLUSÃO: “Infestissumam” é um dos poucos trabalhos que registram um marco histórico nas Pedras Sagradas do Metal, por sua originalidade, sua harmonia e sua coragem, de inovar, de arriscar, e principalmente, por entreter e cativar tanto os mais ortodoxos – para não dizer teimosos – headbangers, assim como os não-bangers. Considero este um disco indispensável, devendo ser obrigatório sua audição a todos, mesmo que à nível de conhecimento para um posterior registro de “não gostei”.

Ghost – “Infestissumam”
Lançamento: 09 de Abril de 2013
Gravadora: Loma Vista Recordings

Tracklist:
01. Infestissumam
02. Per Aspera ad Inferi
03. Secular Haze
04. Jigolo Har Megiddo
05. Ghuleh/Zombie Queen
06. Year Zero
 07. Idolatrine
08. Body and Blood
09. Depth of Satan’s Eyes
10. Monstrance Clock

FORMAÇÃO NO DISCO:
Papa Emeritus II: vocais
Nameless Ghouls – cinco instrumentistas (2008-presente):
Fire: guitarra solo
Water: baixo
Air: teclado
Earth: bateria
Éther: guitarra base

FORMAÇÃO ATUAL:
Papa Emeritus IV
and Nameless Ghouls