A primeira década do século/milênio se despedia, acenando perfeitamente com o cenário que encontraríamos adiante: o rock começando a perder toda a sua representatividade em termos mainstream. O cenário alternativo, com o “boom” iniciado pelo grunge nos anos 90, definitivamente demonstrava perda de fôlego. O ano de 2010 foi infestado por cantoras POP nas paradas (Kate Perry, Kesha, Demi Lovato, Selena Gomez, etc, todas nessa seara), mas também se caracterizou por bandas que lançaram seus trabalhos mais discutíveis ou menos inspirados: o “modorrento” The Final Frontier, do Iron Maiden; o lamento por ver um gênio em seu instrumento como Mike Portnoy, figurar no cansativo “Nightmare”, do Avenged Sevenfold; o disparadamente pior na carreira de Ozzy Osbourne, “Scream”; e a tentativa fracassada de mudança com o Helloween em “7 Sinners”.
Mas tivemos bons destaques, como o primeiro do Ghost (“Opus Eponymous”) e o terceiro do Alter Bridge (“AB III.5”); os vigorosos power metal: “The Clans Will Rise Again”, do Grave Digger, e “Time to be King” do Masterplan; as “pérolas extremas”: Deathspell Omega (“Paracletus“), Triptykon (Eparistera Daimones) e Demonic Ressurrection (“The Return to Darkness”); a incrível releitura acústica de Robert Plant (“The Band of Joy”); o prog-metal competente do Pain of Salvation (“Road Salt One”); o thrash-metal retrô de Death Angel (Relentless Retribution) e Overkill (“Ironbound”); o “revival hard” sueco do Crashdïet (“Generation Wild”) e os alternativos Tame Impala (“Innerspeaker”) e Arcade Fire (“The Suburbs”). No Brasil podemos destacar o ótimo “Discipline of Hate” do Korzus, e os corretos de Shaman (“Origins”) e Angra (“Aqua”). Agora, vamos a sempre árdua tarefa em selecionar o TOP 5:
ACCEPT -“Blood Of The Nations”
RENASCIMENTO! Podemos afirmar com exatidão que “Blood For The Nation”, foi responsável por uma das mais surpreendentes retomadas da carreira de uma banda de hard rock/heavy metal. E podemos creditar a isso, um dos maiores dilemas sofridos por instituições na indústria musical: a troca de vocalista! Geralmente, o excesso de expectativa por parte dos fãs e a ausência da dita “química” entre os integrantes, proporciona fracassos retumbantes (o próprio Accept já havia passado por isso). A entrada do americano Mark Tornillo (no posto eternizado por Udo Dirkschneider) representou exatamente o contrário das agruras mencionadas. Com um timbre mais rasgado (perceptível ecos de Jon Oliva e Brian Jonhson em seu estilo) e cheio de “bluezy”, impressiona como “casou” perfeitamente ao estilo revigorado do Accept, 14 anos depois do seu último lançamento.
Canções empolgantes, riffs inspirados e contagiantes, coros dotados daquela característica influência épica e algumas das melhores letras na trajetória do bardo alemão. Sim, fez a diferença alguém que sabe compor em inglês, isso ficou notório, mais um ponto para Mark! O seu visual a la “Easy Ryder”, completamente dispare ao de Udo, trouxe um diferencial (que teria tudo para dar ruim) e repito, fez o Accept RESSURGIR com força para a década que batia na porta. Vale destacar o trabalho incrível das guitarras de Wolf Hoffman e Herman Frank, aliado a produção “azeitadíssima” de Andy Sneap. Figura facilmente em qualquer relação dos maiores clássicos da banda e da história do heavy metal!
Lançamento: 20 de agosto de 2010. Produção: Andy Sneap. Gravadora: Nuclear Blast.
BLACK COUNTRY COMMUNION – “Black Country Communion”
SUPERGRUPOS: projetos resultantes de músicos que são verdadeiras estrelas em suas carreiras, e que resolvem se juntar em uma premissa ambiciosa. Na maior parte das vezes, a expectativa acaba sendo maior que o resultado apresentado, e durante a história os fracassos acabaram se prevalecendo aos parcos sucessos. A ponto de muitas das vezes o público “torcer o nariz” para reuniões desse tipo, que acabaram sendo mais vistas como oportunismo, do que as possibilidades que a química desses super-astros poderiam vir a oferecer.
Só que aqui não! Glen Hughes (baixo e voz), Joe Bonamassa (guitarra), Derek Sherinian (teclados) e Jason Bonham (bateria) construindo uma ode aos anos 70, com hard rock, blues e funk, repleta de peso e maestria? Um bálsamo sonoro é concebido pelo Black Country Communion em seu auto-intitulado álbum de estreia! É extremamente saudosista, mas com vigor e inspiração para soar atemporal. A junção desses talentos exorbitantes possibilitou um dos grandes discos do ano em sua totalidade, mas experimente ouvir a versão para “Medusa” do Trapeze, e não se emocionar com tanta emotividade e talento. MAGISTRAL!
Lançamento: 20 de setembro de 2010. Produção: Kevin Shirley. Gravadora: Mascot, J & R Adventures.
JON OLIVA’S PAIN – “Festival”
Podemos dizer que esse é o melhor trabalho do Jon Oliva’s Pain, desde que o projeto do vocalista, tecladista e compositor se iniciou após o prematuro término do Savatage, em 2001. O excepcional bom gosto no repertório que transita por esferas ainda mais progressivas, descamba em elementos de diversidade jazzística e folk, mas sem abandonar o peso característico do heavy-metal pomposo de sua ex-banda. Apesar de dar vários passos a frente em “Festival”, Oliva consegue conectar-se ao passado em um contexto extremamente emocional.
Algumas gravações “perdidas” do seu irmão Criss Oliva (ex-guitarrista do Savatage morto em um acidente automobilístico na década de 90), são aproveitadas no álbum. É inevitável não remeter a sonoridade do Savatage de imediato, impressionante essa “marca-registrada” em seus riffs e solos. Apesar disso, o contexto total das 11 canções soa moderno. A evolução de Oliva nas composições (absurdamente homogêneas e inspiradas) e nos vocais (tecnicamente impecáveis e emocionais) é realmente preponderante, e contribui para um dos GRANDES discos do ano!
Lançamento: 19 de fevereiro de 2010. Produção: AFM Records. Gravadora: Christopher Kinder, Jon Oliva, Tom Morris.
ROB ZOMBIE – “Hellbilly Deluxe 2”
Despontando como promissor diretor de filmes de terror, Rob Zombie estava ausente da cena musical, desde o lançamento do não tão inspirado quanto seus dois antecessores, “Educated Horses”, de 2006. E o “retorno” se deu em grande estilo! Apesar do título, “Hellbilly Deluxe 2” (que ficou dois anos “engavetado”), pouco tem a ver com a sonoridade de sua estreante e multiplatinada incursão solo. Podemos creditar a “continuação” na temática das letras. O universo bizarramente fantástico dos filmes de terror B, está lá “firme e forte”: sexo fetichista, zumbis, alienígenas, escatologia, monstros e obsessões macabras das mais criativas. Mas paramos por aí quanto a qualquer comparação com o clássico de 1998…
Agora, MUSICALMENTE é que a coisa pega fogo! O resultado é bem mais orgânico, temos aqui um hard rock da pesada (algumas incisões southern, psichobilly e goth), com as esquisitices eletrônicas de outrora ficando em segundo plano. Claro que o lado “industrial para as pistas” e experimental se faz presente, mas não tem o protagonismo dos seus 3 registros anteriores. Petardos inspiradíssimos, riffs empolgantes somados a solos bem construídos (o ex-Marilyn Manson, John 5, “possuído”!), e uma “sujeira” de ares horror punk e shock, consistindo uma retomada as suas raízes mais roqueiras. É “diversão pervertida” de alto nível!
Lançamento: 02 de fevereiro de 2010. Produção: Rob Zombie. Gravadora: Roadrunner Records.
SLASH – “Slash”
A exemplo de “Hey Stoopid”, de Alice Cooper em 1991 (que ele participou), uma constelação DA PESADA se faz presente no primeiro álbum solo do emblemático guitarrista, um dos fundadores do Guns N’Roses e então membro do supergrupo Velvet Revolver. O projeto “Slash & Friends” veio sendo construído desde 2007 com um planejamento impressionante, e denota o prestígio do “homem da cartola” na comunidade musical.
Sintam a POTÊNCIA dos convidados, só nos vocais: o “príncipe das trevas” Ozzy Osbourne, Ian Astbury (The Cult), Iggy Pop, Fergie (grata surpresa cantando rock), Lemmy Kimilster, Chris Cornell, Myles Kennedy (Alter Bridge, performance tão espetacular que saiu como cantor na turnê), Alice Cooper, Adam Levine (Maroon 5), M. Shadows (Avenged Sevenfold), Kid Rock (que também produziu o álbum), entre outros. Como instrumentistas, podemos destacar os ex-companheiros de GNR, Izzy Stradin e Duff McKagan, e Dave Grohl na bateria, até porque se fossemos descrever todos aqui, não teria espaço para falar do disco, foi MUITA gente de raro talento participando!
E sabe o que é mais incrível? O resultado é grandioso, seu estilo inconfundível de tocar, adaptou-se aos convidados em questão, e a contribuição “deu liga”. Registro vibrante, energético, diversificado, inspirado e “contagiante até a medula”. A festa do rock’n’roll mundial é garantida! Foram inevitáveis as comparações com o sofrível “Chinese Democracy”, lançado 1 ano antes (levou 13 anos para sair), com Axl Rose bancando uma banda de aluguel para sustentar a marca Guns N’Roses. O espírito promulgado pelo grupo para o mundo nos anos 80, foi definitivamente mais associada pelo público ao primeiro álbum solo de Slash. Sucesso retumbante, chegou ao número 1 em diversos países. DISCAÇO!
Lançamento: 02 de abril de 2010. Produção: Eric Valentine, Kid Rock, BigChris Flores. Gravadora: EMI (América do Norte), Roadrunner Records (Europa), Universal Music (América Latina)