Tá Na Letra #13: Radiohead – Creep

Hoje é dia de Tá Na Letra! No Tá Na Letra você fica por dentro de interpretações sobre o significado das músicas. Claro que interpretações distintas são válidas, afinal, a arte não possui verdade absoluta e cada um entende a mensagem de uma forma. Aqui nesta série tentamos colocar apenas mais uma possível compreensão da música. A música de hoje é Creep do Radiohead.

Radiohead é uma banda britânica de rock alternativo, formada no ano de 1985 em Oxford por Thom Yorke (vocais, guitarra e piano), Jonny Greenwood (guitarra e piano), Ed O’Brien (guitarra, sintetizadores e vocal de apoio), Colin Greenwood (baixo e sintetizador) e Phil Selway (bateria e percussão).

O som da banda ficou bastante conhecido por trazer letras introspectivas, tristes, densas, reflexivas e, muitas vezes, depressivas. Uma das mais conhecidas faixas da banda é Creep, a escolhida do Tá Na Letra de hoje.

A faixa foi o primeiro single da banda, lançado em 1992. Quando apresentado, a gravadora achou que não vingaria por ser muito diferente de tudo o que estava acontecendo no fim dos anos 80. A música também saiu no primeiro álbum da banda, o Pablo Honey, de 1993 e foi um sucesso.

O que a gravadora não havia percebido era que a temática das músicas, a levada e a intensidade havia mudado com a virada da década. O Grunge de Seattle vinha com uma temática parecida com o trabalho que o Radiohead queria apresentar e vinha ganhando muito espaço na cena do rock mundial. Bandas como Nirvana, Alice in Chains, Pearl Jam, Soundgarden, Screaming Trees, entre outras, traziam fortes cargas emocionais em seus trabalhos, reflexões sobre a juventude que parecia perdida e triste com os rumos que a vida parecia lhes mostrar. O Radiohead apresentou num tom diferente, uma temática parecida, onde parecia esquisito tudo ao redor.

A temática da música conversava diretamente com muitos jovens da época que se sentiam deslocados dentro do mundo em que viviam. O eu lírico não representa apenas o autor, mas todo um grupo de jovens e adolescentes que gostariam de serem notados sem ter que mudar quem são e quem eram.

Creep (Insignificante)

Quando você esteve aqui
Não conseguia te olhar nos olhos
Você é como um anjo
Sua pele me faz chorar

Você flutua como uma pena
Em um mundo tão belo
Eu queria ser especial
Você é especial pra caralho

Mas eu sou insignificante
Eu sou um esquisitão
Que diabos estou fazendo aqui?
Eu não pertenço a este lugar

Eu não ligo se isso machuca
Eu quero ter o controle
Eu quero um corpo perfeito
Eu quero uma alma perfeita

Eu quero que você perceba
Quando eu não estiver por perto
Que você é especial pra caralho
Eu queria ser especial

Mas eu sou insignificante
Eu sou um esquisitão
Que diabos estou fazendo aqui?
Eu não pertenço a este lugar

Ela está fugindo pela porta
Ela está fugindo
Ela corre, corre, corre, corre
Corre

Seja lá o que te faz feliz
Seja lá o que você deseje
Você é especial pra caralho
Eu queria ser especial

Mas eu sou insignificante
Eu sou um esquisitão
Que diabos estou fazendo aqui?
Eu não pertenço a este lugar
Eu não pertenço a este lugar

https://www.youtube.com/watch?v=k3_RU30tEIE

Assim como nas músicas das bandas de Seattle, podemos ver a tristeza muito presente. O fato do eu lírico se colocar para baixo, a tristeza e a carga emocional presente na letra mostram que ser positivo não era o forte dele. Mas, mesmo sendo assim, ele encontrou alguém que ele  julgava ser muito especial. Tão especial que o eu lírico mal podia se aproximar. Havia um distanciamento emocional muito grande, um medo do fracasso e, ao mesmo tempo, uma enorme vontade de ser notado.

Aqui vemos um cara comum se apaixonando por alguém que parece fazer parte do grupo mais popular. O eu lírico sabe que não é notado, mas deixa claro que faria tudo o que pudesse para que isso acontecesse. Há um grande distanciamento do amante até a pessoa amada, assim como acontecia na literatura no romantismo: o eu lírico não se sente bom o suficiente para a pessoa amada e se considera um verme, algo insignificante para ela.

Há um esboço de esperança em alguns trechos, mas desaba quando ele percebe que são de mundos diferentes. O eu lírico não se sente pertencente ao local, é como se fosse um total estranho, de outro país, de outro planeta; é como se não pensasse igual, não agisse igual, não tivesse nada em comum com a amada e com o grupo de pessoas com quem ela convive.

Refletindo como se fosse um adolescente na década de 80, era como se o eu lírico fosse uma pessoa comum que destoava dentre os populares e esportistas da escola. É como se ele fosse mais um que não era notado enquanto a garota que ele mais amava estava rodeada de rapazes e amigas populares, chamando a atenção e mal sabendo da existência do adolescente que se sentia esquisito apenas por não fazer parte daquele grupo.

A música é bem triste, mas fala de algo que acontece com frequência entre os adolescentes do mundo todo. Quantos e quantos jovens não se sentem sempre para baixo, não se sentem sempre tristes apenas por não fazerem parte de um grupo de garotos mais populares? Quantos e quantos jovens não se sentem deslocados apenas por não gostarem das mesmas coisas, dos mesmos esportes, dos mesmos assuntos, dos mesmos lugares? Aliás, é um assunto até delicado, pois toda essa carga negativa pode atrair problemas maiores, como depressão, por exemplo.

O canal do Youtube Tá Na Capa fez uma interpretação bastante interessante da música. No vídeo, Julio Victor fala sobre a letra e o contexto de onde ela foi escrita. Confira o vídeo abaixo.

De certa forma, a música (mesmo não tendo esta intenção), acaba servindo como um alerta. Nem todos conseguem força suficiente para deixarem este sentimento negativo não tomar conta da vida num todo.

A música falou com toda uma geração que se sentia e se sente desvalorizada até hoje. Fala do amor idealizado, do amor platônico, da enorme submissão ao amor que, muitas vezes, nem é revelado por medo, insegurança e falta de confiança.

A faixa acabou sendo regravada pelo Korn em seu Unplugged MTV, em 2007. Confira abaixo a performance da banda.

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