Tá Na Letra #22: Will Vasconcellos – Vermelho

Hoje é dia de Tá Na Letra! No Tá Na Letra você fica por dentro de interpretações sobre o significado das músicas. Claro que interpretações distintas são válidas, afinal, a arte não possui verdade absoluta e cada um entende a mensagem de uma forma. Aqui nesta série tentamos colocar apenas mais uma possível compreensão da música. A música de hoje é Vermelho do músico Will Vasconcellos.

Will Vasconcellos é um músico de Ribeirão Preto – SP, líder e vocalista da banda Verbo Perfeito, mas que também possui um trabalho solo autoral que possui 2 álbuns: Mesmo Assim Me Perdoa (2015) e Funeral (2019). Ambos podem ser ouvidos no canal oficial da banda Verbo Perfeito no Youtube.

O trabalho solo de Will apresenta uma temática um pouco diferente do trabalho que produz junto da Verbo Perfeito. A temática aqui apresenta algo bem mais introspectivo e reflexivo, onde ressalta muito a angústia e as reflexões do ser humano no seu cotidiano. Questões como saudade, amor, cotidiano e vida são bem disseminados em sua obra.

Além de uma temática bem mais específica que o trabalho com a Verbo Perfeito, a sonoridade do trabalho de Will Vasconcellos também é bem mais livre que o da sua banda, permitindo que experimente estilos que não aparecem no seu outro trabalho. Em seu trabalho solo, seu ar introspectivo é bem mais evidente, casando perfeitamente com os instrumentos e apresentando um produto final bem complexo e denso.

A faixa de hoje do Tá Na Letra é a faixa que abre o primeiro disco solo da carreira do músico. O nome dela é Vermelho e se encontra no álbum Mesmo Assim, Me Perdoa (2015). Confira a letra na íntegra abaixo.

Vermelho

Você me atirou
no lado frio da vida,
mas teu lado do colchão
era quente quando estava aqui
quando você estava aqui…

Mesmo assim, me perdoa
por pedir de volta, tua paz…
E que se foda,
a amargura da minha voz…

E quando pintei,
de cinza o nosso céu,
um vermelho surgiu,
dizendo ser o amor,
vestido de azar…

Mesmo assim,
me perdoa por pedir de volta, tua paz…
E que se foda,
a amargura da minha voz…

Eu tinha tanta fé,
porque hesitaras?
Num golpe final,
o amor fugiu da gente,
fugiu da gente,
de mim e de você,
de mim e de você.

A faixa é bem intensa e com uma temática bem definida: um pedido de perdão sincero e melancólico. O eu lírico diz que a pessoa que partiu representava sua paz e pede perdão por querê-la de volta, talvez por acreditar que não consiga mudar e ser o que a outra pessoa precisava, entendendo, assim, que será melhor para ela ir embora e seguir seu caminho sem ele.

Aliás, talvez seja a forma mais pura de amar: deixar a pessoa ir embora por saber que ela pode viver melhor longe de você; representa, então, querer o melhor para o outro, mesmo que para isso custe a própria felicidade. Forte, intenso, direto e melancólico.

Já dizia Humberto Gessinger na faixa Descendo a Serra presente no disco Várias Variáveis (1991) da banda Engenheiros do Hawaii: “É sempre mais difícil dizer adeus quando não há nada mais pra se dizer”. Explicar que a vida era melhor ao lado da outra pessoa e pedir perdão por querê-la de volta sabendo que, para a outra pessoa, é melhor ficar distante, é a maior dor do eu lírico; pois não há mais nada o que dizer depois do “adeus”, tudo já foi dito. O que restou então foi apenas um pedido de perdão.

A amargura da voz do eu lírico não o incomoda. Não importa o quanto ele sofra, o quão ruim seja demonstrar este sentimento. Mostrar-se talvez seja a maior prova de que existe o amor e não há o medo de deixar claro que é sincero, não tem por que fingir frieza; a cara limpa e a honestidade são o que definem uma prova de amor, mesmo que seja com uma voz amarga de saudade.

O início da música, que consequentemente é o início do álbum, acontece de uma forma genial e inesperada: é a voz do amor da vida do eu lírico que abre o álbum dizendo o que ele precisa fazer para ser feliz, sendo direta e dizendo o quanto ela se importa, dando conselhos do que ele precisa fazer para conquistar seus próprios sonhos. A voz vai direto ao ponto e diz os erros do eu lírico perante sua carreira musical, perante o que ele quer fazer da vida (viver de música) e apresentando o caminho que ele precisa percorrer para que isto aconteça. O eu lírico sabe que a dona da voz do recado foi a melhor coisa que já lhe aconteceu e sente a falta dela, por isso pede para que ela volte, pois sabe que precisa dela em sua vida para, ao menos, tentar ser uma pessoa melhor.

“Mesmo Assim, me perdoa” não só é a frase mais importante da música, como também é o que norteia todo o álbum. O trecho representa que, mesmo com todas as falhas do eu lírico e mesmo que ele saiba que a outra pessoa está melhor sem ele, a música baseia-se em pedir perdão por querê-la de volta.

A cor vermelha pode representar a raiva, pode representar o sangue, a dor, o corte na alma do eu lírico por querer a pessoa ao seu lado e dizer que o “azar” foi o que o fez perdê-la.

O eu lírico questiona por que ela hesitou, por que a pessoa da voz do início da música desistiu dele; mas, no fundo, ele sabe o motivo, ele sabe que não vai mudar e sabe que para ela é melhor ficar longe dele. Essa parte de “nunca mudar” fica claro na obra de Will Vasconcellos com sua banda Verbo Perfeito quando ele diz “Mas meu amor entenda: eu nunca vou mudar; eu tô tentando te dizer para que não espere muito de mim”. No trecho, o eu lírico deixa claro que já tentou mudar, que já quis ser uma pessoa melhor e isto casa perfeitamente com a faixa Vermelho de seu trabalho solo, uma vez que ele sabe que deu seu máximo, que fez o que podia, mas que fracassou e perdeu o amor de sua vida. O pedido de perdão que ele faz é por saber que ele tentou e por não querer vê-la sofrendo, mas deixando claro que ele chegou à conclusão que nunca vai mudar. O trecho citado é final da música Enquanto o Céu Explode presente no álbum O Quinto Ato (2018).

Aliás, este “céu que explode” pode ser o mesmo céu que ele diz ter pintado de cinza mas que foi manchado de vermelho (trecho da faixa Vermelho de Will Vasconcellos) ao sentir que estava perdendo o amor de sua vida. O vermelho representa esta dor, este corte, representa o sangue escorrendo em forma de “adeus”.

A faixa Vermelho se encerra com mais recado da pessoa amada. Neste fim, a voz encerra a música dizendo que ela gosta muito dele e por isso não vai “passar a mão em sua cabeça”, deixando claro que ela não será cúmplice dos erros do eu lírico: ela vai ser firme e sincera, ela o ama e quer vê-lo bem; não quer vê-lo jogando seus sonhos no lixo ou desistindo deles.

Uma última observação é que a faixa acontece entre os dois recados de seu amor: existe toda uma história escrita antes disso e toda uma história, ainda em construção, depois disso. Assim como no livro Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres (1969) de Clarice Lispector, que se inicia com uma vírgula e termina com dois pontos, representando que ali está apenas uma parte pequena de toda uma história: há uma eternidade antes e uma eternidade depois; assim também é na faixa Vermelho e, com certeza, o que é cantado ali e tudo o que foi vivido e está representado ali moldará o infinito que veio e ainda virá depois do fim da música.

Talvez seja isso: eles se amam, mas não ficarão juntos, pelo menos por enquanto. Será que ele nunca irá mudar mesmo ou precisa apenas amadurecer? Será que ela ainda esperará por ele? “Enquanto o Céu Explode”, ou melhor, enquanto isso, ele apenas pede perdão por querê-la de volta, por sentir sua falta e por querê-la ao seu lado para preencher o colchão vazio e o vazio deixado em sua vida.

Para conferir o trabalho solo do músico Will Vasconcellos, basta clicar nos links abaixo.

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Dica do Grunge #1: Will Vaconcellos: http://144.217.7.140/dica-do-grunge-1-will-vasconcellos/
Álbum Mesmo Assim, Me Perdoa (2015): http://twixar.me/htC1
Álbum Funeral (2019): http://twixar.me/vtC1

Para conhecer o trabalho de Will Vasconcellos na banda Verbo Perfeito, basta clicar nos links abaixo.

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