Estamos no ano de 1996 e em 28 de Maio, o SLAYER lançava um álbum de covers de Punk. Era a época em que a mídia tentava “matar” o Metal ao mesmo tempo que apresentava bandas como GREEN DAY e OFFSPRING como expoentes do Punk. Nada contra estas duas bandas, que eu até admiro alguns dos trabalhos realizados ainda naquela época, porém, nem de longe aquilo era verdadeiramente Punk.

E Pensando nisso, Tom Araya, Jeff Hanneman, Kerry King e Paul Bostaph se juntaram e na companhia do produtor Dave Sardy, a banda entrou no “Capitol Studio“, em Los Angeles, para gravar esta verdadeira pérola. Uma banda de Thrash Metal tendo que ensinar o que era Punk Rock. E o tiro fora certeiro, pois a banda optou por deixar de fora os nomes mais conhecidos como RAMONES, SEX PISTOLS, DEAD KENNEDYS (o verdadeiro e não esse que arregou em vir ao Brasil com medo dos “reacinhas” de plantão) ou AGNOSTIC FRONT, por exemplo, apostando em nomes como VERBAL ABUSE, D.I., DR. KNOW, mas também abrindo espaço para bandas conhecidas no cenário como MINOR THREAT, TSOL, D.R.I. e The Stooges.

Em pouco mais de 32 minutos, o disco mostra toda a raiva que a banda procurou (e conseguiu, com êxito) passar. Lembro-me que à época, li uma entrevista concedida por Tom Araya para a revista “Rock Brigade” em que ele dizia que estava furioso em ver bandas que não tinham nenhuma atitude sendo chamadas de Punk e que por isso, resolveram lançar este tributo.

Daí a gente coloca a bolacha para rolar e de cara, temos 4 músicas do VERBAL ABUSE, então desconhecida por mim… Lembremos que em 1996, não tínhamos as facilidades de um YouTube, Spotify ou Deezer. A internet somente era acessível após a meia-noite e dependia da linha telefônica, e adquirir discos, embora fosse muito mais fácil do que na década anterior, ainda ficava complicado. Mas ao escutar estas 4 músicas, divididas em dois “medleys“, eu pensei comigo: “Uau! Isso é realmente sensacional”. E foi o sentimento que a banda conseguiu passar com “Desintegration/Free Money” e “Verbal Abuse/Leeches“. Todas pesadas, rápidas, cruas e grosseiras.

A faixa três é uma homenagem ao T.S.O.L, com “Abolish Government/Superficial Love“, que ficaram absurdamente boas! Curtas e grossas, você escuta e acha que GREEN DAY é como se fosse a “Galinha Pintadinha”.

Aqui temos o SLAYER tocando ao vivo em 1996 Abolish Government/Superficial Love

Temos nas músicas quatro e cinco, respectivamente, “Can’t Stand You” e “Ddamm” que eram originalmente pertencentes ao projeto Punk de Jeff Hanneman, Dave Lombardo e Rocky George (SUICIDAL TENDENCIES), chamado PAP SMEAR. Juntas, as duas somam pouco mais de 2 minutos. Enquanto que a primeira é uma paulada bem direta e crua, a segunda é mais trabalhada e ficou perfeita tendo as guitarras lapidadas pela dupla Hanneman/King enquanto que os gritos de Araya nesta música soam bastante pertinentes.

A faixa seis traz até o momento a banda mais conhecida das que estão sendo homenageadas: O MINOR THREAT se faz homenageado através da maravilhosa “Guilty of Being White“, rápida e certeira.

O VERBAL ABUSE volta a ser alvo de tributo dos caras na faixa sete, com a nada menos do que estupenda “I Hate You“, onde a música além de ser excelente, pesada e com um andamento não muito comum para o estilo Punk. E a letra é raivosa, onde a pessoa que é o alvo do ódio é simplesmente execrada. Imagine alguém dizendo a outra pessoa que “ela é um desperdício de esperma”. É mais ou menos disso que a letra trata. E os caras produziram um videoclipe oficial, que chegou a ser veiculado na MTV, em tempos que a emissora evocava (em vão) pelos quatro cantos do planeta, que o Metal estava morto. Hoje temos a certeza de que não passava de um blefe.

Temos de volta na faixa oito, uma nova homenagem ao MINOR THREAT com o medley para “Filler/I Don’t Hear You“, que confesso, foi logo de cara a música que me chamou a atenção e por algum tempo foi a minha favorita deste disco. Velocidade e raiva são a tônica destes dois sons. O MINOR THREAT já é bom por si só, sendo tocado por uma banda que dispõe de mais recursos técnicos, e consequentemente, consegue melhorar o som, beira a perfeição.

Spiritual Law” traz mais uma banda do undergrond sendo homenageada: desta feita é o D.I.. A música ficou pesada demais na versão do SLAYER. Impressionante escutar a banda soando muitíssimo bem tocando Hardcore. Que o caro leitor não queira me matar pela afirmação que farei, mas GUARDADAS AS DEVIDAS PROPORÇÕES, desde o icônico “Reign in Blood” que a banda não conseguia tocar assim tão rápido. Exceção feita, a música “Dittohead“, do álbum anterior, “Divine Intervention“.

A música dez é hoje, a minha favorita deste play e atende pelo nome de “Mr. Freeze“, uma homenagem ao DR. KNOW. Desde os riffs da introdução, que ficaram sensacionais, passando pela parte do refrão onde o pau come solto e a velocidade beira a da luz, até a quebrada no andamento. Perfeita! Perfeita!

Violent Pacification” traz uma homenagem a outra das poucas bandas mais conhecidas na cena punk: O D.R.I., que tem uma pegada mais para Crossover. E nesta música que começa violenta ao extremo, temos um pouco de tudo: partes mais cadenciadas, velocidade no final. Boa música.

Richard Hung Himself” é uma nova homenagem ao D.I..Essa música é a que menos me agrada no play, mas não ao ponto de pular. Eu escuto, até porque tem bons momentos, sobretudo na bateria certeira de Paul Bostaph, que colocou sua competência ao cubo para brilhar aqui.

A bolacha já chega ao final, e temos aqui o SLAYER melhorando a música do THE STOOGES. Eu não curto a banda, muito menos seu vocalista, Iggy Pop, mas tenho o maior respeito por eles. Mas aqui, além de Tom Araya e cia. terem melhorado a música, ainda trocaram o título original: “I Gonna be Your Dog” virou “I Gonna be Your God“. E novamente Paul Bostaph brilha nesta faixa, mas as guitarras não ficam atrás não. Riffs nervosos dão à música a roupagem que ela precisava.

A última música não é Punk e nem tampouco cover: trata-se da autoral “Gemini“, uma música mais voltada para o Metal, que encerra bem o disco. Ela tem o clima das músicas do álbum anterior, “Divine Intervention“, tendo um andamento mais arrastado, ganhando agressividade e (um pouco de) velocidade ao seu final. E mais uma vez Paul Bostaph, quebrando tudo nas viradas, encerra o disco de maneira excepcional.

A minha relação com este disco é simplesmente sensacional, de amor, eu diria: primeiro, porque foi a minha porta de entrada ao conhecimento da música do SLAYER (tudo bem, este não é propriamente um álbum de músicas do SLAYER, mas eram músicas com a cara do SLAYER). Foi um dos primeiros discos que comprei na vida. Escutei e ainda o escuto com boa regularidade até os dias de hoje. Na época, eu ainda não era um fã de Metal, já curtia o SEPULTURA e algumas coisas do METALLICA, mas este álbum me inspirou a procurar mais lançamentos do SLAYER e, consequentemente, de outras bandas de Metal. Em algum momento da década de 1990, eu emprestei este CD para um colega na escola e adivinhem… O cara sumiu com meu disco (a galera com mais de 30 anos sabe bem o que representava essa época, você emprestava discos e alguns não voltavam, diferentemente de hoje, onde cada um baixa seus discos ou escuta via streaming, essa facilidade nós não tínhamos). Mas depois de um tempo, eu comprei-o novamente e ele está muitíssimo bem guardado no meu armário aqui na minha casa, enquanto que uma cópia está igualmente segura no cartão SD do meu smartphone.

Eu era fã de OFFSPRING e de GREEN DAY nesta época, mas depois de escutar “Undisputed Attitude“, eu simplesmente pensei: “Essas bandas não são e nem nunca serão Punks”. Agradeço ao SLAYER lá fora (e ao RATOS DE PORÃO aqui pelo Brasil) por me apresentarem bandas Punks e Hardcore que realmente valem a pena. Embora o SLAYER tenha lançado alguns bons discos após este, mas em minha opinião, “Undisputed Attitude” é o último excelente disco deles. Estarei no Rock in Rio para vê-los em sua turnê de despedida, e é uma pena que eles não tocarão nenhuma faixa deste play que arregaça. Não tem problema, este disco merece todos os elogios. Os caras deram a cara a tapa e ensinaram para a turminha o que era Punk de verdade. E é tão somente por isso que eu presto essa homenagem para este disco que envelhece muito bem, obrigado.

Lineup:
Tom Araya – Baixo/Vocal
Kerry King – Guitarra
Jeff Hanneman – Guitarra
Paul Bostaph – Bateria


Tracklisting:
01 – Desintegration/Free Money
02 – Verbal Abuse/Leeches
03 – Abolish Government/Superficial Love
04 – Can’t Understand You
05 – Ddamm
06 – Guilty of Being White
07 – I Hate You
08 – Filler/I Don’t Hear You
09 – Spiritual Law
10 – Mr. Freeze
11 – Violent Pacification
12 – Richard Hung Himself
13 – I’m Gonna Be Your God
14 – Gemini

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