Sepultura: Chaos A.D. completa hoje 25 anos

Hoje, 19 de outubro, coincidentemente a mesma data em que Max Cavalera lança seu mais novo álbum com o SOULFLY, Ritual, Chaos A.D., o disco que mudou a minha vida (e provavelmente a de muitos headbangers), completa a sua bodas de prata. Sim, já são 25 anos desde o lançamento do quinto álbum de estúdio da maior banda brasileira de Metal da história. É, meus amigos, o redator está ficando velho e provavelmente o caro leitor também. É o disco que iniciou uma virada na carreira do SEPULTURA.

Eu tenho por este álbum um carinho mais que especial, e aqui fica impossível que eu não relate as minhas emoções pessoais. Conto na minha bio, que vocês podem conferir mais abaixo, a minha relação com este álbum. Era 1994, eu morava em Niterói, tinha 15 anos e já trabalhava ajudando minha mãe, que vendia quadros de pintura à laser. Conheci uma guria, linda. Adriana era o nome dela. Mais velha que eu, tinha namorado, óbvio que ela não me daria bola. Contentei-me com sua amizade. E certa vez ela me emprestou uma fita cassete de 90 minutos, onde do lado A tinha o álbum “VS”. do PEARL JAM e no lado B, tinha o “Chaos A.D.” O meu interesse era pelo Pearl Jam, banda que foi a minha preferida até pouco tempo depois quando eu mergulharia de cabeça no mundo do Metal. Escutava sempre somente o lado A, e voltava com a caneta para escutar de novo. Até que um dia eu enchi o saco e resolvi botar o lado B para tocar. E assim, como num passe de mágica, eu estava me tornando um headbanger e não sabia.

É claro que no começo, eu achei meio estranho aquele groove, soava “muito pesado” para os meus ouvidos. Mas uma música me chamou atenção, na verdade, duas. Não, três: “Propaganda“, “Biotech is Godzilla” e “Polícia“, o cover dos TITÃS. A última eu já conhecia e foi legal escutá-la com andamento bem mais rápido que a versão original. Percebam que eu comecei gostando das músicas mais rápidas do disco.

O tempo passou e “Chaos A.D.” foi o segundo cd que comprei na vida (o primeiro, claro, foi o “VS.”) e aos poucos fui me acostumando e gostando. “Refuse/Resist” com aquela mistura das batidas cardícas de Zyon, o filho primogênito de Max Cavalera, depois as batidas tribais avassaladoras de Igor na intro, juntamente com os riffs animais da dupla Max e Andreas, que pareciam estar em sintonia fina, abrem o disco de forma magnífica. Tempos depois, a música acabou sendo tema dos protestos que tomaram as ruas do Brasil contra o governo federal e contra a farra do dinheiro público utilizado na Copa do Mundo.

Territory” chega da mesma forma avassaladora, com a melhor introdução de bateria da história do Metal. Que coisa louca é aquela que Igor protagonizou. A música, com muito groove é uma das melhores da carreira da banda e mesmo nos dias de hoje, quando o setlist da banda costuma ser 50% da fase clássica e 50% da fase atual, esta música não fica de fora. E nem deveria.

Slave New World” é uma composição da banda junto com Evan Senfield, baixista e vocalista do BIOHAZARD que traz muita raiva. Uma intro arrastada, que se torna veloz na primeira estrofe, depois cai para o groove. Era a banda abandonando de vez o estilo que utilizariam até o “Arise“, de velocidade total nas músicas, o que gerou comparações, na época, com o SLAYER. Ainda que em “Arise” já tenha um pouco do tribalismo e da brasilidade sonora que a banda passaria a usar.

Em “Amen“, uma música mais arrastada, dramática, densa, pesada, com canto gregoriano no meio em que nada atrapalha. Excelente canção.

Uma pausa no peso para aqui ouvirmos tudo que jamais esperaríamos ouvir de uma banda de metal: “Kaiowas“.  violões, batucadas, Andreas Kisser nos brindando com toda a sua técnica, incorporando vários estilos tipicamente brasileiros, especialmente a música caipira. A banda, na época soltou a seguinte nota sobre a música:

Esta canção é inspirada por uma tribo indígena brasileira chamada “Kaiowas”, que viviam na floresta tropical. Eles cometeram suicídio em massa, como uma forma de protesto contra o governo, que estava a tentar a tomar a sua terra santa”.

Só um parágrafo, o redator torna-se historiador por um momento, na verdade a tribo ainda existe, é conhecida como Guarani-Kaiowá e de fato, eles tiveram a sua terra tomada pelos grandes latifundiários, com total omissão do governo federal. Eles vivem em pequenos loteamentos na região do Mato Grosso do Sul e é verdade, muitos cometeram suicídio e os que resistem, ameaçam repetir o feito. É uma forma de a tribo atrair a atenção da opinião pública e das autoridades para esta atrocidade que fazem com os verdadeiros donos dessa terra que nós, homens brancos chamamos de nossa.

Voltando a parte musical, temos a primeira música que me despertou interesse pela banda: “Propaganda“. Uma letra de protesto, que começa com a bateria de Igor (na verdade, ele usa só os pratos) e logo, as guitarras nervosas da dupla Max e Andreas tomam conta de tudo, junto com as batidas tribais.

Biotech is Godzilla” foi outra que me chamou atenção de início, era o SEPULTURA soando mais punk, com letra escrita pela lenda viva Jello Biafra. Eis aqui um esboço da velocidade que a banda explorava até “Arise“.

Nomad” é sem dúvida, outra das melhores composições da banda. Peso, groove, riffs intrincados e bateria insana. Igor Cavalera certamente se reafirmava em sua melhor fase, a maior performance pessoal em estúdio e o cara começava a ser notado como um dos grandes da cena.

We Who Are Not As Others” é uma música que nada mais é cantado além de seu título, mo que não é demérito. Pois a mescla de guitarras pesadas com bateria que viaja entre o groove e o tribalismo dá a música a qualidade que ela merece. E mantém o disco lá na ionosfera. Uma curiosidade pessoal era que eu morria de rir com as gargalhadas que eles colocaram na última faixa do disco e depois eu percebi que tais gargalhadas são utilizadas no final desta faixa, dando um aspecto desesperador nela.

Manifest” conta a história do massacre do Carandiru, para os mais novos, era um presídio situado na região norte da cidade de São Paulo, onde, em 2 de outubro de 1992, policiais despreparados invadiram o complexo e ceifaram várias vidas. A rebelião que começou após desentendimentos dos presos que estavam no famoso “Pavilhão 9” e que disputavam uma partida de futebol, Voltando a parte musical, em 90% da música, ele não canta e sim recita a letra, contando a história. A introdução maravilhosa das guitarras, a parte do refrão bem rápida e ríspida põe pra fora toda a revolta dos “jungle boys” para com o que acontecia em terras tupiniquins. Bom lembrar que o evento ganhou as páginas de jornais do mundo inteiro e os caras já faziam residência nos EUA.

E ai temos um cover. Foi aqui que o SEPULTURA começou a se especializar nos covers mais improváveis. Se em “Arise” eles foram de “Orgasmatron“, que na época de Max, era obrigatoriamente a música que fechava os shows, hoje ela nem é lembrada pela formação atual, aqui eles foram buscar uma música do NEW MODEL ARMY, The Hunt e… Caramba, a versão Thrash Metal que eles fizeram para a música ficou fenomenal.

Fechando o disco (ao menos na versão gringa), “Clenched Fist“, uma música sensacional, que viaja entre o groove e a velocidade na sua parte final, lembrando mesmo os bons momentos de “Arise“.

Para nós brasileiros, tinha ainda “Polícia“, o cover dos TITÃS, que como disse Andreas Kisser em recente entrevista concedida a Gastão Moreira, “eles praticamente roubaram a música” da banda paulistana e por muito tempo, sobretudo na era Max, a música também era presença certa no setlist da banda.

“Chaos A.D.” era o quinto full-lenght do SEPULTURA. Produzido por Andy Wallace, gravado no “Rockfield Studios“, no País de Gales, e lançado pela “Roadrunner Records” e pela “Epic“.

O álbum certamente foi o divisor de águas da banda, que passou a ser reconhecida por ter um som próprio, por influenciar diversas bandas que vieram depois, sobretudo as de “New Metal” e que também acabou com aquela comparação de que a banda era uma mera cópia do SLAYER.

Era o primeiro disco que Paulo Xisto gravava as suas partes de baixo, história contada por Max em seu livro “My Bloody Roots” e confirmada por Andreas na entrevista recente concedida a Gastão Moreira.

Quanto ao redator aqui, depois que ele se apaixonou de vez pelo SEPULTURA, ele foi buscar o VHS “Third World Chaos“, e os álbuns anteriores. Ainda teve a oportunidade de acompanhar o último show com a formação clássica aqui no Brasil, em novembro de 1996, porém, deixou de acompanhar a banda na formação atual, mesmo admitindo que eles fazem um excelente trabalho.

Foi na turnê deste álbum que o SEPULTURA fez diversos shows importantes, como a apresentação no icônico festival Monsters of Rock, em Castle Donnington, Inglaterra. Além da famosa tour com o PANTERA pelos EUA, ambas em 1994.

Enfim, um álbum clássico, que abalou as estruturas da cena mundial. Que merece todo o nosso carinho e respeito. É o Brasil que fazia bonito há 25 anos e isso abriu portas paras as várias bandas que vieram depois como ANGRA, KRISIUN, CLAUSTROFOBIA, TORTURE SQUAD, entre outras. E eles ainda inovariam mais com Roots, o lançamento posterior, não fossem os desentendimentos com a ex empresária Glória Cavalera que levou a demissão dela e a saída do frontman, não é nenhum absurdo dizer que o SEPULTURA poderia fazer frente até mesmo com o METALLICA, que por sua vez, atravessava uma crise não só de identidade, mas também de criatividade.

E longa vida ao “Chaos A.D“.

Formação:

Max Cavalera – Vocal/Guitarra

Andreas Kisser – Guitarra/Backing Vocals

Paulo Jr. – Baixo

Igor Cavalera – Bateria/Percussão

Track List:

01 – Refuse/Ressit

02- Territory

03 – Slave New World

04 – Amen

05 – Kaiowas

06 – Propaganda

07 – Biotech is Godzilla

08 – Nomad

09 – We Who Are Not As Others

10 – Manifest

11 – The Hunt

12 – Clenched Fist

13 – Polícia

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