Se há uma coisa difícil para todas as bandas novas que vivem no underground, é manter uma constância de shows, coisa que ocorre por “N” razões, seja por falta de oportunidades, estrutura, dinheiro, ou em alguns casos, de comprometimento e de atitude dos integrantes.
Mas, para uma banda formada há apenas 4 anos, os irmão “gaúchos/pernambucanos” do Monticelli têm conseguido vencer bem esse obstáculo, sendo eles, uma das bandas no cenário recifense que mais consegue se manter na ativa.
Isso ocorre porque o trio não se prende a apenas se apresentarem em eventos locais voltados exclusivamente ao Rock, tendo eles também tocado em eventos particulares e em bares e pubs, apresentando tanto o próprio repertório autoral, presente em seu disco homônimo lançado em 2016, e também covers de clássicos do Rock.
Durante a cobertura que fiz da despedida do Matanza em Olinda – evento onde o Monticelli foi uma das atrações -, o trio Artur Monticelli (guitarra e vocal), Vítor Monticelli (baixo) e Bruno Monticelli (bateria), concedeu uma entrevista a Roadie Metal falando um pouco desse fato, e também, outras informações referentes a sua carreira. Confira:
Roadie Metal: Como a banda começou?
Artur: A banda começou desde criança, basicamente, a gente despertou o interesse por música, cada um foi se aproximando de um instrumento musical, e desde sempre a ideia foi ser uma banda de Rock, a gente nunca pensou em fazer outro tipo de música, a gente sempre quis o Rock, bastante influenciado pelo Nirvana, Metallica e tal. Então, foi uma coisa que aconteceu naturalmente, e entre irmãos, a gente pensou que seria mais fácil a coisa rolar, e foi assim cara, foi um processo naturalmente. Profissionalmente a gente está na estrada desde 2014. Há 4 anos que a banda Monticelli está oficialmente em operação.
Roadie Metal: O fato de você serem irmãos facilitou as coisas?
Artur: Muito, essa é uma das maiores vantagens de fazer uma banda entre irmãos, é que os compromissos de banda sempre se resolvem de uma maneira muito fácil. Quando tem ensaio, está todo mundo ali, perto, próximo, pode resolver isso, muito mais fácil do que quando tem um cara que mora muito longe. Então, isso facilita muito, principalmente em ensaio e composição.
Bruno: E a gente procurou transformar um quarto em estúdio, então além de estar morando juntos, os três, a gente transformou um quarto em um homestudio, onde a gente pode ensaiar, praticar, estudar, e procurar compor. Nesse sentido facilitou também no quesito “local para tocar”, porque a galera se preocupa muito com essa questão de “onde ensaiar”, e para se encontrar, a galera às vezes mora longe, e além de sermos família, bagunçamos a casa, transformamos um quarto em estúdio e estamos brincando até hoje lá.
Roadie Metal: É perceptível que vocês são abertos para tocar em qualquer local, diferente de muitas bandas, seja cover ou autoral. Porque vocês fazem isso? Há um setlist específico para cada ocasião?
Vítor: Na verdade é o seguinte, é a música que paga nossas contas, então a gente não está focado apenas em eventos grandes, porque querendo ou não no Brasil não existe uma frequência muito grande de grandes festivais. Por exemplo, hoje estamos tocando aqui na despedida do Matanza, mas não é todo mês que o Matanza se despede, então a gente tem que arrumar meios de tocar em todos os meses do ano. A gente tem um repertório, além do autoral, com mais de 100 músicas, todas dentro do Rock em todas as épocas, então, qualquer casa que chamar a gente teremos um material dentro do estilo para agradar o público deles.
Artur: Sempre adaptando, óbvio que você não chegará em uma casa de pequeno e médio porte mandando Thrash Metal, você vai usar o bom sendo e vai fazer uma seleção adaptando as proporções da casa.
Roadie Metal: Como é ser uma das bandas de abertura na despedida do Matanza?
Artur: Por um lado a gente fica triste porque a despedida de uma banda que conseguiu seu espaço em um cenário difícil que é o do Rock nacional, mas antes de mais nada acho que é importante a gente agradecer a promoção do evento, o pessoal do Burburinho, que deu essa oportunidade para gente está tocando, e por um lado é bom, porque existe um movimento, a galera se reúne, a gente rever alguns amigos do underground. Então é essa divisão de sentimentos.
Roadie Metal: Vocês acham que as outras bandas deveriam abrir mais a mente em relação a tocar em qualquer lugar?
Vítor: A gente procurou usar uma estratégia, além de mostrar nossas músicas autorais, que é importante a galera conhecer coisas novas, não ficar preso apenas as grandes lendas do passado, a gente procura ser estratégico, coloca de vez em quando um cover que se encaixa em nosso perfil, uma influência, mas sempre dentro do clássico. A gente procurou trabalhar dentro do Heavy Metal e do Hard Rock, mas sempre buscando as influências clássicas e mesclando. A cada tipo de show que faço, de acordo com o perfil da casa, eu direciono o meu repertório para atingir aquele público, então eu estrategicamente coloco uma música minha autoral no meio, coloco um clássico, depois outra autoral, então isso vai aos poucos fazendo com que o público comece a assimilar minha música, sem deixar de cantar os grandes clássicos.
Artur: E sobre as outras bandas, isso vai do perfil de cada um, porque para nós funciona, mas para outras bandas pode ser que não funcione, pode ser que os próprios membros da banda não se identifiquem com isso. Então, vai de cada um mesmo.
Vítor: Tem banda que só toca autoral, e não quer tocar cover, no máximo um cover só para a galera cantar junto, mas é a estratégia de cada um. A gente procura mesclar para tentar agradar gregos e troianos, porque o Rock já é muito segmentado, então agente procura tocar de tudo um pouco para tentar agradar todo mundo.
Bruno: Inclusive hoje a gente tocou todo nosso álbum, e terminou o show, mas a galera pediu mais e liberaram mais uma música para gente, e soltamos um Twisted Sister, e aí fechou com chave de ouro com aquela farra final. Mas nosso objetivo hoje era tocar só as autorais.
Artur: Era apresentar o nosso trabalho autoral realmente, porque querendo ou não, mesmo a gente sendo uma banda de 4 anos, as vezes sempre aparece alguém que não conhecia a banda. Então é bacana para a gente apresentar nosso trabalho realmente de fato, invés de estar focando nos cover, então a gente mostra nosso trabalho autoral, nossa cara.
Bruno: A gente mandou o álbum “Monticelli”, nosso primeiro álbum todo na íntegra. Inclusive esse álbum foi gravado no estúdio SomMax, que é o mesmo que gravou Chico Science, Alceu Valença, Dominguinhos, estúdio muito importante. E nós somos a única banda de Rock que eles apostaram, então para gente é um orgulho está dentro desse time.
Roadie Metal: Abrir para a Tarja Turunen foi um “kick” inicial para a banda?
Artur: Foi muito bacana, uma coisa que queria falar antes disso é que chegamos conhecer ela pessoalmente, fomos no backstage, tiramos uma foto e conversamos um pouco com ela – que se mostrou uma pessoa simpática e receptiva. Foi muito legal porque foi nossa primeira grande oportunidade de mostrar nossa cara para um grande público.
Bruno: Foi uma vitrine que deu visibilidade para gente na cena local, e a partir daí muitas pessoas passaram a nos seguir, e essas pessoas que nos conheceram lá nos seguem até hoje.
Artur: E foi uma oportunidade bacana porque vieram outras pessoas de outros estados, enfim, a gente conseguiu plantar uma semente muito fértil.
Bruno: E um exemplo dessa amizade que fizemos foi o Sebastião Critovão, de Vitória de Santo Antão, que produz um evento lá chamado “Blizzard Of Rock”, tendo ele nos chamado para tocar lá no ano seguinte. Ou seja, a gente planta a semente e a mesma germina.
Roadie Metal: Em três oportunidades vocês abriram para o Edu Falaschi aqui em Recife, isso gerou algum tipo de relação entre vocês e ele?
Vítor: Na verdade, na segunda vez que a gente viu ele, nós fomos a banda dele, porque na ocasião, a turnê “Metal Classic Tribute”, onde ele passa nas cidades e pega uma banda local para tocar. Aí o João Marinho, quem trouxe ele na ocasião, entrou em contato com a gente nos convidado, porque já tínhamos tocado com o Robertinho de Recife, ele veio para cá, e a gente foi a banda dele. E funciona assim, eles mandam o repertório e não tem nem ensaio. E por a gente ter tocado com o Robertinho, foi que João viu que a gente segurar o rojão.
Bruno: E a partir daí que começamos a tocar com o Edu, e a trocar Whatsapp. A gente tem uma amizade até hoje. Toda vez que ele vem no Nordeste ele sempre tenta engatilhar alguma coisa para fazermos juntos. Já foram três vezes que nos encontramos (Abril Pro Rock 2016, Metal Classic Tribute 2016 e Rock Will Never Die 2017). É importante estar interagindo com esses caras que têm experiência e trocar figurinhas.
Roadie Metal: Quais suas principais influências?
Artur: Nós sempre falamos que embora sejamos irmãos, rola influências variadas. Eu sou o cara mais do Hard Rock, mais dos anos 70, Black Sabbath, Deep Purple, mas ultimamente ando ouvindo bastante Kansas, e bandas do tipo. Acho que todo mundo tem aquela coisa de toda semana ter uma banda favorita.
Bruno: Já eu, como sou o mais velho, nos anos 90 comecei a ouvir muito Nirvana. O Grunge realmente mexeu comigo, aquele Rock mais rasgado, aquele vocal do Kurt me fez ter uma tremida na base, comecei com outros olhos o Rock’n’Roll. Comecei a gostar do som mais agressivo, não o Rock clássico, mais algo mais agressivo. Comecei a conhecer o Tourniquet, muita gente não conhece, o Delivarence, o Metallica, outra banda muito importante na minha carreira pessoal, então, esses caras me levaram para o Rock mais pesado, mais gritado, mas também com muita qualidade. Sem contar que eu curto também AC/DC, Kiss, Iron Maiden, bandas que estão dentro desses clássicos do Metal.
Vítor: É difícil definir influências, comecei a ouvir Rock na mesma época do Bruno, ouvia muita banda brasileira através da MTV, na época que o sinal pegava muito mal. Lembro que quando passava uma música de uma banda que a gente gostava, nós gravávamos na fita VHS. Charlie Brown Jr. foi uma banda muito importante para mim e para o Bruno, não curtia muito da parte do Rap, mas a parte do Rock era muito foda. Hoje que escuto muita coisa, por isso, é muito difícil definir minhas influências porque eu ouço muita coisa diferente. Mas quando paro para ouvir um Rock, prefiro uma coisa bem 70 e “true”, como Nazareth e AC/DC, acho que essas bandas são bandas de Rock de verdade.
Artur: Todo mundo ouve muita coisa diferente, a gente procura nunca ficar bitolado, porque senão o cara perde de ganhar experiência e conhecer coisas novas, o cara não pode se fechar.
Roadie Metal: Vocês têm feito bastantes shows fora de Recife?
Vítor: Da última vez que contei a gente já tocou em mais de 20 cidades em todo o Brasil, como eu disse, nós vivemos de música. Já fomos para Paraíba, Alagoas, Rio Grande do Norte, Ceará, e também para o Sul do Brasil, como o Rio Grande do Sul.
Roadie Metal: Ultimamente vocês tem usado o canal no youtube de vocês para se aproximar do público, principalmente o Artur, que tem bancado mais o “youtuber”, me falem um pouco sobre isso.
Artur: Essa ideia surgiu de uma forma bem natural, porque pensei “temos um canal, e eu sendo fã de uma banda gostaria muito ver vídeos com assuntos sobre eles que não sejam referentes apenas as músicas, mas também sobre a experiência deles fora do palco” acho isso muito legal. Então pensei em aproveitar isso, pois hoje em dia com a internet temos milhares de possibilidades, então é uma ferramenta que você tenta trabalhar da melhor forma possível. Eu fiz alguns vídeos contando algumas histórias engraçadas com a gente na estrada, porque é uma coisa que muitos perguntam para gente. Comparado com outras bandas, não temos muito tempo de estrada, mas mesmo assim é muita história para contar, ainda mais se tratando de uma banda de rock, e o rock n roll é um negócio bizarro, você nunca sabe o que vai encontrar. Por isso, o Youtube é um grande espaço para usarmos e compartilhar essas histórias e outras coisas também.
Bruno: Acho interessante também estreitar a relação com o público, mostrar o nosso outro lado que não apenas o profissional. Mostrar que a gente é acessível, que somos pessoas como qualquer outra, a gente mostrar todas as adversidades da estrada e desafios.
Roadie Metal: Há alguma previsão para um novo álbum?
Artur: Estamos compondo, temos coisas já montadas, o esqueleto todo montado, na verdade não só o esqueleto, tem várias coisas que estão praticamente prontas, mas que a maior decisão é a parte mais burocrática, como onde a gente vai gravar, porque de material, já temos bastante coisa na agulha, e tem coisa boa vindo aí.
Bruno: E estamos pensando em gravar coisa lá fora, principalmente para trocar experiência com pessoas de outros países, outros profissionais da área. É interessante ter uma experiência desse tipo, porque lá fora as coisas andam muito melhor para os músicos.
Artur: E é uma bagagem enorme para uma banda que dá um pulo lá fora, faz show, grava, e volta com mais respeito e mais moral.
Roadie Metal: Como vocês veem a cena underground pernambucana atualmente?
Artur: É uma pergunta bem complicada, percebo quem em Pernambuco a cena em si resiste por conta das bandas em atividade, mas as mesmas acabam tendo que conquistar o próprio espaço, tipo pegando um facão e abrindo uma floresta. Por isso não existe exatamente uma cena consolidada, o que existem são as bandas que arranjam lugar para tocar.
Vítor: São as bandas e uns três ou quatro produtores que matam no peito e são louco de fazerem os eventos, mas a cena em si mesmo não existe, na minha opinião.
Bruno: Na minha opinião também, a cena underground está muita fraca, não existe um trabalho em conjunto com as bandas, tem muita competição, muita fofoca, então isso acaba estragando o que poderia ser tão maravilhoso, todo mundo junto, trabalhando em um só objetivo. Porque para mim, o sucesso de uma cena é a continuidade, todo mês ter aqueles eventos legais, um público sempre presente, as bandas se unindo, fazendo os festivais, mesmo que seus estilos sejam diferentes, e eu não tenho observado isso com muita força. A cena não morre, mas a cena está muita fraca e tem muito para ser feito.