Roadie Metal Cronologia: W.A.S.P. – The Neon God- Part 1: The Rise (2004)

No ano de 2004, o W.A.S.P tentou um feito um tanto quanto ambicioso: criar um álbum conceitual em duas partes e lançar ambas no mesmo ano.
O álbum “The Neon God – Part 1: The Rise” é o 11º álbum da banda e a primeira parte desta overdose de W.A.S.P. entregue aos fãs nesse ano. A história contada no álbum é relativamente simples, porém interessante: O álbum fala sobre Jesse um garoto órfão abusado que descobre ter o poder de ler e manipular mentes de outros.

A primeira faixa do álbum, “Overture” se inicia por uma entrada com tom épico de teclados, guitarras e uma bateria que gera antecipação ao ouvinte. Nos minutos seguintes, a música se mostra uma bela obra de rock progressivo, com alterações constantes de ritmos guiadas pela bateria e seguidas pelos outros instrumentos. Vale notar que nesta faixa nenhuma parte é muito “enfeitada”, são progressões simples porém muito bem guiadas pelos instrumentistas. O clima dado pela faixa é justamente o que se espera pelo título, visto que “overture” é uma parte de orquestra no ínicio de uma ópera ou, em significado mais geral, uma introdução para algo mais substancial.


Em seguida, a curtíssima “Why Am I Here“, que pode ser facilmente perdida pelo ouvinte mais desatento por durar apenas 35 segundos. A faixa é uma simples progressão de acordes no violão acompanhada do teclado que serve para somente criar ambiência enquanto o vocalista Blackie Lawless canta a curtíssima letra ” Oh Lord, why I am here? Lost in all our pain and sorrow. Are we to live in pain and fear? Oh Lord, why I am here” que pode remeter a dois momentos dessa história: Ao momento em que Jesse fica órfão, em que passa a viver com dor e tristeza, além do medo do que seria de seu futuro dali para frente; Ou a um desabafo sobre sua vida no orfanato, visto que algumas músicas como Sister Sadie ( And the Black Habits) contém trechos que indicam o abuso que Jesse sofria no orfanato.
A terceira faixa “Wishing Well” é um tanto surpreendente. Enquanto nas duas anteriores estava se criando uma atmosfera de antecipação, um “prólogo” para a história, essa começa rápida, “direto ao ponto”, com instrumental rápido e vocais extremamente emocionados de Lawless, ritmo que se segue pelos seus 3 minutos e 33 segundos sem parada. É uma faixa que realmente anima o ouvinte, porém só a velocidade do instrumental, pois a letra desta música é o total oposto. Essa música nada mais é do que Jesse, cansado dos abusos e de sua vida miserável no orfanato, pedindo que Deus acabe com seu sofrimento, que tire sua vida logo. *yikes*


Sister Sadie (And the Black Habits)” se inicia com o mesmo riff que aparece em uma das partes de “Overture“, o que gera uma sensação curiosa de “já estive aqui”. Admito que realmente voltei as faixas até “Overture” para ter certeza de que realmente tinha sido ali que havia escutado esse riff, e não em outro momento. A este ponto me parece um padrão do W.A.S.P. ( ou pelo menos deste álbum) que as músicas mais animadas sejam as com as letras mais pesadas. Em seus incríveis 7 minutos e 42 segundos, a música narra um momento de abuso sofrido por Jesse por Sister Sadie, que supõe-se ser quem dirige o orfanato. Jesse permanece pedindo para que a morte o leve, desta vez pelas mãos de Sadie, declarando ainda não ser crente a esse Deus de amor. Em contrapartida, Sadie demonstra uma postura totalmente autoritária e agressiva para com Jesse, referindo-se a si mesma como “rainha” de Jesse e até como sua única deusa.
A seguir, mais um momento de ” já não estivemos aqui antes?”, com a faixa “The Rise“, que pelo nome podemos supor que é o primeiro grande climax da história. A música se inicia da mesma forma que “Overture“, somente se diferenciando quando iniciam os vocais de Lawless. Na música, Jesse parece sucumbir à loucura, fantasiando com o poder como se tivesse ascendido ao status de deus. Jesse realmente se declara o novo messias para o Circo Invisível ( que não fica claro quem são, porém supõe-se que seja fantasia de Jesse).


Após esse breve momento de loucura, Jesse volta à sua persona depressiva com “Why Am I Nothing“, onde pergunta a si mesmo porque nunca fora nada, nunca fora objeto do amor de ninguém. Esta faixa associa-se muito à quase homônima “Why Am I Here“, sendo somente uma faixa acústica curta com teclado ao fundo e vocais, parecendo que estas músicas representam o início de um novo ato na história.


O início do segundo ato é dado por “Asylum #9“, mais uma música frenética e sem parada. Após sucumbir à loucura em “The Rise“, Jesse é encaminhado a um hospício, onde é recebido por Doctor D e suas enfermeiras. Doctor D cita que quase perderam Jesse, mas o capturaram a tempo, ou seja, provavelmente Jesse iria tentar se suicidar naquela noite, mas fora enviado para o hospício antes. Doctor D não tenta dar apoio a Jesse, ao invés disso tenta manipulá-lo para que seus medos desapareçam.
Na faixa seguinte, “The Red Room of the Rising Sun“, Jesse conversa com o personagem Billy. É uma faixa um tanto quanto sinestésica, falando bastante sobre a cor vermelha. Esta é a primeira faixa que sinto ser um pouco “trippy”. Apesar de “The Rise” ser uma clara manifestação de uma fantasia de Jesse, ela ainda tem um tom mais realista. Já essa faixa parece realmente uma viagem, com versos como ” We walk the new rays of the rising sun”, o que nos faz ter certeza de que Billy é um paciente deste hospício que está em um estado ainda pior que Jesse. O título no entanto remete a algo muito mais pesado: o termo “Red Room” na cultura popular remete a uma sala onde ocorrem assassinatos e torturas ( inicialmente visto no filme Videodrome de 1983 e popularizado pelo suposto site da Deep Web onde são transmitidos assassinatos e torturas ao vivo). Visto que hospícios tem histórias sobre torturas de pacientes ( e não temos uma noção de quando se passa esta história, logo pode ser na época em que isso era mais comum), a conversa toda pode remeter a um paciente (Billy) que está tão fora de suas faculdades mentais que realmente crê que a tortura pode ser a solução de seus problemas e tenta convencer Jesse disto. De fato é uma música complicada de entender sem fazer uma breve pesquisa.


Em seguida temos “What I’ll Never Find“, a primeira faixa com mais de 1 minuto que é bem mais lenta do que todas as outras faixas até então. A música é de fato bem triste, pois é o momento da morte de Billy. Ao que parece, Jesse e Billy criaram um laço forte de amizade e Billy pergunta se seu amigo segurará sua mão para facilitar no “outro lado”. Billy parece ter muito medo de morrer sozinho, parece querer ter certeza de que Jesse está ao seu lado e estará enquanto ele diz seu último adeus. Vale notar neste ponto que “Billy” é um apelido unissex, logo Billy pode ser um homem ou uma mulher, o que abre muitas possibilidades sobre o que realmente Billy era para Jesse, podendo ser até um interesse amoroso na história.
Com a faixa “Someone to Love Me” inicia-se o terceiro ato do disco. Jesse volta a lamentar que ninguém o ama, possivelmente muito abalado com a morte de Billy, a pessoa que chegou mais perto de amá-lo em toda sua vida.
X.T.C. Riders” retoma a velocidade das músicas do álbum. Apesar da música falar dos “riders” como se fossem motoqueiros, a sigla XTC é um nome popular para Ecstasy ( basta pronunciar a sigla rápido). Portanto esta música fala do desenvolvimento de um vício de Jesse nessa droga. O vício de Jesse parece se tornar um vício bem forte, pois a música indica que não haverá mais volta para Jesse, e que este está perdendo controle.
Em seguida temos “Me & the Devil“, a abertura do último ato desta primeira parte. A música, assim como outros começos de ato, é uma faixa acústica com menos de um minuto. Essa ganha um destaque, pois os vocais repetem somente a frase “me and the devil” várias vezes.


A faixa “The Running Man” é um climax icônico para esta parte da história. Jesse no ápice de sua loucura e seu vício consegue manipular alguns dos pacientes dos 9 hospícios ( Jesse pertence ao #9) a crerem que ele é o novo Deus, seu novo messias. Neste momento, ele está fugindo de seus “discípulos”, enquanto outro personagem, Judah, tenta o impedir de fugir, alegando que Jesse havia os feito uma promessa e que ele pagaria um preço grande por não cumprí-la, que Jesse era o único deus que aquelas pessoas conheciam. Aqui é bem curioso que Jesse, que o tempo todo buscou por amor, fala ” take your love away from me”, ou seja, dispensa o amor daqueles que o endeusaram. Parece que neste ponto Jesse está tendo um momento de lucidez e percebendo que ele não é um deus como os outros imaginam, mas ao mesmo tempo sua loucura interna questiona “am I messiah?”.


O álbum se encerra com “Raging Storm“, faixa em que Jesse começa sua decadência e pede, novamente, amor, dizendo que só este o salvará da tempestade que está ocorrendo dentro de si. Essa música tem uma estrutura interessante, com versos calmos e melancólicos e refrões épicos, mostrando a tristeza e ao mesmo tempo desespero de Jesse por sua situação. Apesar da negação de Jesse à sua fé em “Sister Sadie ( And the Black Habits)“, aqui ele volta a clamar a Deus por uma ajuda. Jesse encerra este pedaço de sua história da mesma forma que começou: triste e carente, porém nesta faixa implora por redenção.

O álbum The Neon God – Part 1: The Rise é extremamente bem construído e, ao contrário de muitos álbuns conceituais, não se perde em histórias longas e maçantes. Aqui, ao ler o resumo da história e a letra das músicas, é muito fácil imaginar tudo como um grande filme, ainda mais com os atos bem divididos e definidos e a boa progressão empregada ao escrever as músicas. Na parte estritamente musical, não há o que reclamar: vocais maravilhosos em todas as músicas somado a um instrumental lindo e sem muita “firula”. Admito que não sou nem um pouco fã de prog, nem de álbuns conceituais, mas este álbum me conquistou e me fez ter vontade de conhecer ainda mais esta banda, além de checar a segunda parte para saber como termina a história de Jesse.


Este álbum agradou alguém que conhecia absolutamente 0 da obra da W.A.S.P., então creio que os fãs de longa data, seja da banda ou do gênero, podem amar este álbum facilmente.

Tracklist

  1. “Overture”
  2. “Why Am I Here”
  3. “Wishing Well”
  4. “Sister Sadie (And The Black Habits)”
  5. “The Rise”
  6. “Why Am I Nothing”
  7. “Asylum #9”
  8. “The Red Room Of The Rising Sun”
  9. “What I’ll Never Find”
  10. “Someone To Love Me”
  11. “X.T.C. Riders”
  12. “Me & The Devil”
  13. “The Running Man”
  14. “Raging Storm”

Formação

  • Blackie Lawless – vocal e teclado
  • Darrell Roberts – Guitarra e vocal
  • Mike Duda – Baixo e vocal
  • Frankie Banali – Bateria e percussão
  • Stet Howland – Bateria (faixa 3)
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