É compreensível que uma geração doutrinada pelos discursos radicais da imprensa especializada em Metal, do começo dos anos 80, tenha restrições contra o Motley Crue. Eu entendo e, de certa forma, compactuo em relação a muitas outras bandas, afinal eu também tive minha parcela de radicalismo, mas no caso do Motley Crue eu consigo me afastar do padrão. “Too Fast For Love” é o primeiro disco do grupo e ainda permanece até hoje como meu preferido, embora não consigo me lembrar como foi que chegou até minhas mãos. Lembro que foi um empréstimo, claro, mas não lembro de quem. Foi providencial, entretanto, pois ele sequer ocupou espaço nas prateleiras das lojas de minha cidade. A má vontade que circundava a banda, aqui no Brasil, aliada aos exageros visuais, travou parte de seu crescimento em nosso território e tem reflexos até hoje, visto que a banda nunca alcançou a mesma popularidade que obteve em outros países.
A musicalidade do Crue, em seus discos subsequentes, sempre me pareceu ter sido propositadamente conduzida para formas de arranjo mais tradicionais, e aqui estou incluindo o aclamado “Shout At The Devil” também. Isso não é uma crítica, pois tenho essa discografia em minha estante, mas a realidade é que “Too Fast For Love” soa muito diferente de qualquer outra coisa. Acho que o que me cativou foi a forma meio estranha que o disco transparece, mais parecido com uma demo tape do que com um álbum de carreira. Aliás, algum tempo atrás, eu li que era justamente isso: uma demo tape que foi prensada e lançada como disco! Está explicada, portanto, a razão da produção crua que, sem tirar o mérito de produções mais refinadas, consegue manter sem esforço a espontaneidade e urgência dos artistas, preemente em suas estreias.
A voz de Vince Neil causava o tipo de estranheza que lhe faz repetir a audição, para se certificar de que é aquilo mesmo que você está ouvindo. Esse sujeito de performance anasalada é mesmo o vocalista de uma banda de Hard Metal? A impressão só dura até o momento que você assimila que o grupo só poderia funcionar daquela maneira, com aquela formação. O baixista Nikki Sixx, apesar de não ser nenhum virtuose nas quatro cordas, tinha o talento que lhe permitia dominar o trabalho de composição, mas nos sulcos do disco o que prevalecia era o timbre da guitarra de Micky Mars. Era extremamente evidente o efeito de crunch na introdução de “Come On and Dance” ou na cadência da semi-balada “Merry Go Round” – se é que pode ser considerada assim – onde o instrumento permanecia bem à frente. “Public Enemy #1” e “Piece of Your Action” apresentam algumas variações interessantes em seus andamentos e é, infelizmente, justamente esse tipo de variação que eu acho que se perdeu parcialmente no trabalho posterior da banda. Talvez, por serem músicos com nível mediano de habilidade, a opção acabou por ser a de seguir o caminho mais fácil, ao invés de tentar enveredar por um que não poderiam percorrer e, assim agindo, serem os autores de grandes momentos do Hard Metal. As composições foram ficando, gradativamente, mais curtas, mais retas e, admita-se, mais pops. A inversão dessa diretriz é o que fez “Too Fast For Love” uma obra com brilho próprio, permanecendo como uma peça isolada dentro da discografia da banda.
Formação
Vince Neil – vocal
Mick Mars – guitarra
Nikki Sixx – baixo
Tommy Lee – bateria
Músicas
01 Live Wire
02 Public Enemy #1
03 Take Me To The Top
04 Merry-Go-Round
05 Piece of Your Action
06 Starry Eyes
07 Come on and Dance
08 Too Fast for Love
09 On with the Show
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8.5/10