Goste-se ou não de sua personalidade, seus posicionamentos ou até mesmo de sua voz, nada pode retirar de Dave Mustaine sua condição de um dos melhores compositores dessa forma de música chamada heavy metal. Sim, ele já fez inúmeras canções, ou mesmo discos completos, que não atingem os padrões sequer medianos que podemos esperar dele, mas não se trata de perfeição. Isso, nem ele, nem ninguém, possui. Trata-se de sempre rumar para a frente, para o próximo passo, a próxima música, o próximo disco, e deixar claro que a fonte ainda está bem longe de secar.
Sendo assim, a gente observa, dentro da discografia do Megadeth, que as fases de menor criatividade são, geralmente, seguidas de picos de inspiração, produzindo álbuns aclamados. A banda tem vários trabalhos que merecem ser classificados dessa forma, além das batidas menções ao “Peace Sells” ou ao “Rust In Peace”. “The System Has Failed” é um desses, e sua tulmutuada concepção poderia tê-lo encaminhado para ter sido uma obra de menor qualidade.
“The System Has Failed” é o décimo disco de estúdio do Megadeth. Por pouco não foi o primeiro álbum solo de Dave Mustaine. Ainda que possamos crer que Mustaine e o Megadeth são uma única e indissociável criatura, nesse período ele estava literalmente e absolutamente só.
O primeiro e principal dos problemas a serem superados foi a lesão sofrida no braço do líder, que o deixou de molho e, por pouco, não o aposentou mais cedo do mundo da música. Em segundo, o Megadeth, que efetivamente há algum tempo limitava-se a Mustaine e ao baixista Dave Ellefson, perdeu esse último, que brigou com o chefe e ainda entrou em um processo judicial contra ele.
Diante desse cenário, não havia mais expectativa de banda para Mustaine e, mesmo que houvesse, a prioridade seria cuidar de seu braço lesionado. Não foi exatamente uma tarefa fácil, mas a fisioterapia, à custa de muita dor, cumpriu o seu papel. Restava, agora, compor e gravar e, para tanto, a solução imediata foi montar uma formação de músicos de estúdio. O disco foi produzido em Nashville, cidade famosa pela sua ligação com a country music e, desse nicho musical, foi recrutado o baixista Jimmy Sloas, que tem vários trabalhos de bluegrass no currículo. Para dividir os solos de guitarra, Mustaine convidou o velho parceiro da primeira formação do Megadeth, Chris Poland, e na bateria, a maior surpresa: Vinnie Colaiuta, consagrado baterista, que tornou-se bastante conhecido por ter integrado, por muito tempo, a banda de ninguém menos que Frank Zappa, mas que também já gravou vários discos com Sting e Joni Mitchell, entre inúmeros outros artistas.
Organizar um grupo tão heterogêneo e sem entrosamento não seria das tarefas mais simples. Mas Mustaine assumiu a produção do disco, juntamente com o produtor Jeff Balding e, a essa altura da vida, depois de tantas mudanças de formação em sua banda, não deveria ser tão difícil, para Mustaine, nortear o trabalho de músicos que jamais tinham atuado em colaboração conjunta entre si.
Gravação concluída, o que deveria ser um álbum solo tornou-se um disco do Megadeth, graças a pressão da gravadora que insistiu para que ele fosse lançado dessa forma. E o disco não destoa do nome presente na capa. É o Megadeth, com seu estilo personalíssimo de fazer heavy/thrash metal. Não soa, em momento algum, como uma banda onde dois dos músicos presentes, Colaiuta e Sloas, não tem a menor tradição na execução desse estilo. Faixas como “Blackmail The Universe”, com sua introdução pesadíssima, “Die Dead Enough”, “Truth Be Told” e, a melhor de todas, “Back In The Day”, soam perfeitamente como aquilo que esperamos de Mustaine em seus melhores períodos.
“The System Has Failed” foi muito bem recebido e elogiado, colocando o Megadeth de volta no tabuleiro, pelo menos até a próxima crise, tendo Mustaine formado uma nova composição de músicos para sair em turnê. O sistema pode até ter falhado, mas o Megadeth nasceu da adversidade e dela se alimenta. E, a cada vez que se reinventa, esfrega a sua relevância na cara de seus detratores.