Assim como a grande maioria das bandas que se destacaram nos anos 70 se utilizando de uma musicalidade elaborada e complexa, o Kansas passou toda a década de 80 tentando se reposicionar e se adaptar às novas marés musicais que passaram a tomar de conta do “show-bizz” oitentista. As pessoas não queriam mais ouvir músicas rebuscadas, cheias de contratempos e de arranjos por deveras eruditos, mas sim algo mais simples, direto e fácil de se compreender, desde que o bom gosto não fosse deixado de lado. O Hard Rock, o New Wave, o Synthpop e o AOR se aproveitaram desta mudança de marés e passaram a surfar na crista do sucesso.

Um Elefante passou por dentro do Kansas nos primeiros anos daquela década e ele, juntamente com as ideias dos novos-convertidos Kerry Livgren e Dave Hope, por pouco não transformou a banda na mais nova sensação da música Gospel. Este intento só não foi concretizado porque realmente o Kansas já não estava mais com aquele sucesso comercial e nem com a inspiração musical que marcaram a era setentista da banda. Após a saída dos três, os integrantes remanescentes precisaram ajuntar os cacos e buscar a já mencionada reinvenção e recolocação. O primeiro passo foi trazer de volta a clássica voz Steve Walsh, que trouxe a tiracolo não somente os seus teclados como também um baixista, Billy Greer. Para a outra guitarra, o maravilhoso guitarrista Steve Morse, egresso do Dixie Dregs, foi recrutado. A reformulada formação do Kansas lançou Power, um álbum que se não se destacou pela consistência e inspiração, o fez pela honestidade.

Não poderia demorar tanto até que uma banda do porte do Kansas e com um reforço monumental na pessoa de Steve Morse em suas fileiras lançasse um álbum muito bom, e este veio já no lançamento seguinte. In The Spirit Of Things, lançado em 1988 através da MCA Records, foi o ponto alto da musicalidade do Kansas nos anos 80. Muito embora a pegada Southern Rock e os saudosos violinos tão bem tocados por Robby Steinhardt não estivessem mais presentes nos arranjos, o Kansas conseguiu criar um ótimo trabalho que atendia aos pré-requisitos que os anos 80 exigiam com muita competência e perspicácia.

Apesar de não ser oficialmente um álbum conceitual, boa parte das letras In The Spirit Of Things são inspiradas pela localidade de Neosho Falls, no estado do Kansas (ah, vá!), e por uma inundação acontecida em 1951 que praticamente a transformou em uma cidade-fantasma. Para produzir In The Spirit Of Things, a banda arrendou os serviços de ninguém menos que Bob Ezrin, afamado por seus trabalhos junto a Pink Floyd, Kiss, Lou Reed e uma centelha mais de outros artistas/grupos.

Em um álbum 12 músicas muito bom e consistente, não é tarefa fácil destacar algumas faixas. No entanto, a ótima levada de One Big Sky, o encontro do Velho Kansas com o Novo Kansas em Inside Of Me, o ritmo sincopado de One Man, One Heart, a radiofônica Stand Beside Me (cujo clipe foi bastante veiculado na MTV), a guitarrada soberba de The Witcher e o excelente trabalho harmônico do teclado de Walsh e da guitarra de Morse em Rainmaker são alguns dos elementos presentes  em In The Spirit Of Things que o fazem ser um álbum imperdível. Digno de nota também é a participação do coral Southerrn California Community, regido pelo Reverendo James Cleveland, que concedeu às músicas One Big Sky, The Preacher e Rainmaker uma imponência especial. James Cleveland é um importante artista da música Gospel, então imagine o que Elefante, Livgren e Hope teriam achado de trabalhar junto com ele!

Apesar da grande qualidade musical, In The Spirit Of Things não foi lá tão bem nas paradas. Alguns fatores que justificam este insucesso são a falta de uma música “hit” e também certa falta de interesse demonstrada pela MCA Records em fazer uma promoção mais forte de seus artistas, digamos, veteranos. Ainda assim, a veiculação do videoclipe de Stand Beside Me ajudou esta música a alcançar a décima-terceira posição nas paradas Rock norte-americanas.

Este foi o último álbum do Kansas a contar com Steve Morse. O guitarrista deixou a banda em 1990 e trabalhou em alguns outros projetos (incluindo uma rápida volta ao próprio Kansas) antes de assumir o posto de guitarrista do Deep Purple em 1994, o qual ele ocupa até hoje. Após uma conversa ali e uma costura acolá, a formação original do Kansas, a menos do violinista Robby Steinhardt e juntamente com Billy Greer e o tecladista de estúdio Greg Robert, se reuniu para uma série de shows. Kerry Livgren e Dave Hope não permaneceram no Kansas após estes shows. Steve Morse chegou a retornar após a saída de Livgren mas também nem chegou a esquentar os dedos, saindo pouco tempo depois. Nesse vai-e-vem, o baterista Phil Ehart lembrou-se de uma fita que ele havia recebido há vários anos de um jovem músico. Ele se chamava David Ragsdale e na época ele estava interessado no posto de violinista do Kansas. Ehart entrou em contato e o trouxe para a banda, resgatando assim uma antiga característica musical do Kansas que havia sido esquecida nos anos 80, que era a presença de um violino. O que esta nova formação do Kansas aprontou você saberá amanhã através da intrépida redatora Daniela Farah, aqui no Roadie Metal Cronologia.

IN THE SPIRIT OF THINGS – KANSAS
Data de lançamento: 25 de outubro de 1988
Gravadora: MCA Records

Tracklist:
01. Ghosts
02. One Big Heart
03. Inside Of Me
04. One Man, One Heart
05. House On Fire
06. Once In A Lifetime
07. Stand Beside Me
08. I Counted On Love
09. The Preacher
10. Rainmaker
11. T.O. Witcher
12. Bells Of Saint James

Line-up:
Steve Walsh – vocais, teclados
Steve Morse – guitarras, vocais de apoio
Rich Williams – guitarras
Billy Greer – contrabaixo, vocais de apoio
Phil Ehart – bateria