Ícones do Heavy Metal mundial, o Judas Priest é uma banda que dispensa grandes apresentações. O que talvez muitos não saibam é que a banda foi fundada com uma proposta musical completamente diferente do que o grupo viria a se tornar. Tudo começou com a banda Freight, formada pelos colegas de escola Kenneth “K. K.” Downing (guitarra) e Ian Hill (baixo), mais precisamente em 1969. Rapidamente, a dupla encontrou um baterista, John Ellis e passaram a buscar por um vocalista. Em 1970, uma banda chamada Judas Priest havia encerrado as suas atividades e o vocalista Al Atkins estava desempregado. Não demorou muito e o vocalista foi recrutado por Ian e K. K. Os músicos alteraram o nome da banda para Judas Priest e em julho de 1971 gravaram uma demo. Nesse período, o grupo abriu shows do Slade e do Budgie.
Tudo vai bem, até que o grupo sofre as suas primeiras trocas de integrantes. No ano de 1971, o baterista Alan “Skip” Moore entrou na banda por um curto prazo e foi substituído por Chris “Congo” Campbell. Além disso, o vocalista Al Atkins crê que a banda não tenha um futuro promissor e abandona o grupo. Então, a namorada do baixista Ian Hill sugere que seu irmão, o jovem Rob Halford, possa ser o substituto ideal para a banda. Naquela ocasião, Halford vinha de uma banda chamada Hiroshima. Esse fato fez com que os músicos decidissem seguir adiante e não desistissem definitivamente da banda.
Eis que, em 06 de setembro de 1974, através do extinto selo Gull Records, o Judas Priest lança o seu álbum de estreia, “Rocka Rolla”. Ainda que muitos dos primeiros discos de bandas sejam normalmente os mais queridos e influentes, especialmente se tratando de um trabalho realizado por uma banda importante da música pesada mundial e o álbum tenha a fama de ter sido produzido por Rodger Brain, que foi responsável pela produção dos três primeiros álbuns do Black Sabbath, “Rocka Rolla” não se enquadra como um “clássico”.
Primeiramente, devemos ressaltar que a banda não apresentava o som que tornou o Judas Priest uma das bandas mais importantes da história do Heavy Metal. A sonoridade era direcionada para um Hard Rock com fortes influências de Blues e Rock Progressivo. Além disso, os integrantes sofreram uma forte censura, o que os impediu de terem gravado nesse “debut” três grandes composições que acabaram figurando apenas no segundo álbum de estúdio da banda, “Sad Wings of Destiny” (1976), sendo elas “Tyrant”, “Epitaph” e “The Ripper”. Além dessas canções, o produtor Rodger Brain também rejeitou o conceito de “Whiskey Woman”, que mais tarde, com a contribuição do guitarrista Glenn Tipton, se tornou a épica “Victim of Changes”, também de “Sad Wings of Destiny”. Levando todos esses fatos em consideração, vamos destrinchar agora esse registro de estreia!
“One for the Road” é a faixa de abertura e nela, o ouvinte já nota que os músicos eram muito talentosos, ainda que a sonoridade apresentada se diferencie drasticamente do que a banda produziria anos depois. A faixa título, “Rocka Rolla”, por sua vez, é ligeiramente mais pesada e cativante. O trabalho de guitarras criado pela fantástica dupla K. K. Downing e Glenn Tipton é preciso e muito eficiente. A “cozinha”, encabeçada pelo baixista Ian Hill e pelo baterista John Hinch é entrosada e o jovem Rob Halford, creditado nesse trabalho como Bob Halford, é impecável.
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Após alguns segundos de silêncio, o disco prossegue com “Winter”, “Deep Freeze” e “Winter Retreat”. Ouvindo as três faixas, o ouvinte percebe que, na verdade, trata-se de uma única composição dividida em três partes. As duas primeiras possuem um andamento mais cadenciado e progressivo e se completam perfeitamente. Por sua vez, um estranho e deslocado trabalho de guitarra inicia “Winter Retreat”, uma faixa que aparentemente é apenas instrumental e de repente, próximo aos seus segundos finais, se transforma numa canção melódica e que conta com um desempenho vocal sutil por parte de Halford.
Um “riff” totalmente Rock’n’Roll marca a abertura de “Cheater”. Nessa composição, temos arranjos cativantes e até mesmo o uso de gaita no refrão. “Never Satisfied” também apresenta um peso moderado, além de um trabalho instrumental bem construído e com “feeling”, em especial as guitarras de Tipton e Downing. Destaque também para o desempenho vocal de Halford bem no finalzinho da música. Ali o ouvinte já percebe que o vocalista dava os primeiros indícios de que se tornaria um grande músico com o passar dos anos.
E falando em desempenho vocal, é importante destacarmos os vocais de Rob em “Run of the Mill”, em especial no final da composição. A canção possui uma história no mínimo interessante: foi concebida originalmente como uma demo em 1973, assim como outra canção dos primórdios da banda, a vetada “Whiskey Woman”. Essa é uma das faixas de duração mais longa que os ingleses gravaram. Sua letra fala a respeito de um homem pobre e velho, cujas perspectivas para uma boa vida desapareceram e agora se vê em apuros e confuso. A composição se inicia lenta e progressivamente e, próximo ao seu final, temos um desempenho vocal sobrenatural.
A seguir, ainda temos “Dying to Meet You“, uma faixa que começa com um andamento mais sutil e cadenciado, com Halford explorando o seu lado barítono. No final da música, temos uma inusitada variação de andamento e ritmo. Aliás, esse segundo trecho é uma faixa não creditada mais conhecida como “Hero, Hero”. O final do álbum fica reservado para a pequena instrumental “Caviar and Meths”, uma canção simples, porém agradável e sonoramente bela e com sentimento.
“Rocka Rolla” reserva muitas curiosidades para si. Outras informações que valem a pena serem mencionadas é o fato de que, em um relançamento do álbum no ano de 1987, a prensagem trouxe uma capa diferente da original. A capa produzida em 1974, que trazia uma tampa de garrafa foi concebida pelo designer John Pasche para um álbum não especificado do Rolling Stones. A banda apresentou uma ação judicial com a empresa da Coca-Cola. A ilustração utilizada no relançamento foi realizada por Melvyn Grant e originalmente produzida para o romance de Ficção Científica ”The Steel Tzar”. Também vale a pena citar que houve modificações nas faixas em algumas cópias do disco. Algumas versões trazem “Winter”, “Deep Freeze” e “Winter Retreat” unificadas como uma única faixa.
Diferente da maioria dos álbuns de estreia de diversas bandas da história da música pesada, “Rocka Rolla” não é um “debut” memorável e que faça todos enlouquecerem com suas composições. Comparando com outros trabalhos realizados pelos britânicos ao longo da vasta carreira do grupo, é um disco morno e sem sal. Não é um álbum ruim, porém também está muito longe de ser ótimo. Sucintamente, é um ótimo disco setentista, mas definitivamente não tem nada a ver com a proposta que temos em mente quando pensamos em Judas Priest.
As composições são executadas com sabedoria, entretanto não empolgam e a experiência para o ouvinte pode soar tediosa por conta disso. Ainda assim, o registro foi o pontapé inicial para que o Judas Priest se transformasse gradativamente numa instituição do Heavy Metal. O trabalho seguinte da banda, por sinal, foi fundamental para que isso ocorresse, mas isso já é outra história…
Integrantes:
Bob Halford (vocal);
Glenn Tipton (guitarra);
K. K. Downing (guitarra);
Ian Hill (baixo);
John Hinch (bateria).
Faixas:
01. One for the Road
02. Rocka Rolla
03. Winter
04. Deep Freeze
05. Winter Retreat
06. Cheater
07. Never Satisfied
08. Run of the Mill
09. Dying to Meet You
10. Caviar and Meths
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6.5/10