Logo após a boa receptividade que o Deep Purple conseguiu com o álbum Bananas, o grupo rapidamente voltou sua concentração para os trabalhos de seu próximo álbum de estúdio, que seria o segundo a contar com os serviços do prolífico tecladista Don Airey, que recebeu a missão mortal de substituir ninguém menos que o legendário tecladista Jon Lord.
Gravado em maio e junho do ano de 2005, sob produção de Michael Bradford (Ringo Starr, Madonna, Run D.M.C.) repetindo a parceria feita no álbum anterior, o full-length Rapture Of The Deep, o 18º da história da banda oriunda da cidade de Hertford, foi lançado em 24 de outubro do mesmo ano, e, assim como seu antecessor, obteve êxito no que se refere a retorno de fãs e de crítica. Em pouco mais de 50 minutos, o Deep Purple mostra o que sabe fazer de melhor com esta nova formação: música refinada e bem composta, com a técnica individual usada em prol da qualidade musical. Também pudera: décadas de experiência de cada integrante e todos os problemas possíveis pelos quais os membros remanescentes passaram levantaram um sentimento de união no grupo. Não a toa, Rapture Of The Deep exibe a assinatura de todos os cinco integrantes como compositores de todas as faixas, em ordem alfabética (Airey/Gillan/Glover/Morse/Paice).
Cabe também lembrar que a atual formação é a mais longeva da história do Deep Purple. Desde a entrada de Don Airey em 2002, já se passaram 15 anos de atual formação.
Músicas como a abertura Money Talks, bem como a primorosa faixa-título, exibem o entrosamento que marca a formação corrente do grupo. Prova disso é como o trabalho do Deep Purple se divide em duplas: Steve Morse e Don Airey, os “novatos” da banda, trabalham em viva conexão executando harmonias melódicas (vide o riff em escala árabe da faixa-título) e alternando solos técnicos, enquanto os veteranos Roger Glover e Ian Paice (o único membro original a permanecer no Deep Purple) dão um show a parte de peso e groove (como toca este senhor Ian Paice!). A cereja do bolo fica por conta de Ian “Silver Voice” Gillan, que mostra por que continua sendo um dos melhores cantores de Rock da atualidade. Se ele não possui mais alcance vocal para agudos, melhorou sobremaneira sua interpretação em regiões mais graves.
Girls Like That favorece o peso absurdo do contrabaixo de Roger Glover (o produtor Michael Bradford, renomado baixista de estúdio de grandes artistas, sempre disse que sua maior inspiração enquanto baixista foi justamente Glover), enquanto Wrong Man é dona de um groove contagiante que faz balançar até estátua. Em contraponto ao peso e ao groove, músicas como a linda balada Clearly Quite Absurd mostram a capacidade do Deep Purple de emocionar. Destaque para o feeling e os timbres limpos de Steve Morse. E o ex-Kansas é novamente enfático no Blues/Rock Don’t Let Go com seus reconhecidos solos em arpeggio.
Não tem baterista que permaneça impassível ante as “ghost-notes” que Ian Paice executa na música funky/oitentista Back To Back. A faixa Kiss Tomorrow Goodbye obedece a mesma levada rápida de Girls Like That. Don Airey mostra que não veio ser um Jon Lord II em Junkyard Blues. O álbum se encerra com a atmosfera Pinkfloydiana de Before Time Began, onde cada integrante tem seu devido destaque mesmo com o clima introspectivo que a música cria. Mas uma das melhores músicas ficou como faixa-bônus para o Japão e em edições limitadas: a frenética Things I Never Said é um show de técnica por parte de toda a banda e foi exaustivamente usada ao vivo. A versão japonesa (usada como base para este texto) não traz a pesada e groovada faixa MTV, que saiu em todas as outras versões.
Após o lançamento de Rapture Of The Deep, o Deep Purple embarcou em uma das mais longas e bem-sucedidas turnês de sua história. Tendo início em janeiro de 2006, a “Rapture Of The Deep Tour” durou até maio de 2011 passando por mais de 50 países e tocando mais de 500 shows, incluindo “headlining” nos maiores festivais de Rock/Metal do mundo, quebra de recordes de venda de ingressos na França (nunca um artista vendeu tantos ingressos em um mesmo ano) e em Israel (em quatro datas foi considerado o maior evento artístico da história do país) e um show no festival Rok Nad Volgoi, na Rússia, para 200 mil pessoas, o maior público da história do Deep Purple empatado com o California Jam de 1974. A banda ainda veio três vezes ao Brasil nesta turnê, passando por várias cidades.
E ainda dizem que Deep Purple é somente aquele dos anos 70. Quiçá, o MK VIII (a atual formação) seja a mais técnica e entrosada formação da história da banda, que a cada dia dá mais evidências cabais de que a banda dos setentões é uma das mais refinadas e musicalmente ricas do mundo. Se Ritchie Blackmore ainda estivesse na banda, com certeza a mesma não poderia oferecer um trabalho competente e honesto como Rapture Of The Deep. Decerto os egos não permitiriam. União é tudo.
Rapture Of The Deep – Deep Purple (Edel Records, Victor Records no Japão, 2005)
Tracklist (versão japonesa):
01. Money Talks
02. Wrong Man
03. Girls Like That
04. Rapture Of The Deep
05. Clearly Quite Absurd
06. Don’t Let Go
07. Back To Back
08. Kiss Tomorrow Goodbye
09. Junkyard Blues
10. Before Time Began
11. Things I Never Said
Line-up:
Ian Gillan – vocais
Steve Morse – guitarras
Don Airey – teclados
Roger Glover – contrabaixo
Ian Paice – bateria
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9/10