Tony Iommi e Ian Gillan viviam momentos embaraçosos em 1982. O guitarrista do Black Sabbath andava preocupado pelas saídas de Ronnie James Dio e Vinny Appice, já o cantor inglês estava com sua banda solo parada e se recuperava de um tratamento nas cordas vocais. Em um bar de Woodstock, Oxfordshire (ING), os dois se encontraram e tiveram uma longa noite de porre. “Um dia estava cansado de ficar em casa e fui tomar umas cervejas com Tony. Ficamos a noite inteira bebendo, rindo e jogando bilhar, quando alguém falou que eu poderia substituir Ronnie Dio no Sabbath. Todo mundo riu da ‘piada’, menos Tony que parou de falar por uns dez minutos. Aí, do nada ele diz, ‘Por que não Ian no Black Sabbath?’ Ninguém levou a sério. Só sei que pela manhã, com todos muito bêbados, eu já tinha aceitado”, recorda Ian Gillan.
“Born Again” não é um clássico por unanimidade e, para Gillan, chegava a ser dispensável. “Tudo estava meio confuso, bagunçado e sei que Tony não trabalhava daquela forma, mas as coisas estavam esquisitas. Algumas músicas são realmente boas, mas a produção é muito ruim, há sons que não faço ideia do que são. Não sei se é o pior de minha carreira, mas não gosto dele. O tempo que passei no Sabbath foi maravilhoso, amo Tony e Geezer, mas o resultado não ficou bom”, desabafa.
A crítica internacional também o desaprovou com duras notas, não só pelas músicas classificadas como “burocráticas”, mas também pela arte de Steve Joule que até figurou em listas de piores capas de discos. Ian Gillan certa vez disse que jogou pela janela, 25 cópias do LP com raiva do desenho.
Algumas vezes o álbum pode soar “estranho” e sua densidade é tremenda, mas revela uma musicalidade diferente do que a banda costumava aplicar. À primeira audição, “Disturbing The Priest” parece querer respirar entre as notáveis “Trashed” e “Zero The Hero”, mas ela reflete muito do que o Black Sabbath costuma fazer quando o assunto é obscuridade. “Trashed” é furiosa, nela Gillan ousou ir além de seu habitual estilo ‘bluesy’. “Zero The Hero” transporta o ouvinte por uma onda soturna, sem falar que existe um incrível desempenho de Iommi no solo. “Digital Bitch” aquece com sua levada solta, que antecede a faixa título, uma balada que tem mais a cara do Deep Purple que a do próprio Black Sabbath, graças às criações melódicas do frontman.
A produção sim é sofrível. Os vocais de Gillan ficaram bem destacados, mais até que os riffs de Tony Iommi, algumas vezes ofuscados pelos agudos do vocalista –, o baixo de Geezer Butler também teve suas sobreposições. Algumas sensações intricadas ou secas ocorrem em canções como “Hot Line” que, assim como “Digital Bitch”, completa a sessão Hard/Heavy da obra.
Talvez a expectativa de conferir um novo Black Sabbath com a volta de Bill Ward na bateria e Ian Gillan à frente, tenha disparado as vendas no Reino Unido, atingindo o 4º lugar, posição que a banda não alcançara desde “Sabbath Bloody Sabbath” (1973). Isso lhes rendeu disco de platina e uma bem-vinda 39ª posição nos EUA.
A turnê não saiu como esperado, Ian Gillan teve dificuldades para cantar as músicas antigas. “São clássicos, é lógico, mas não eram minhas músicas, não gostava dos temas, era algo totalmente fora da minha realidade. Mesmo as músicas da época de Dio me causavam desconforto”, justifica. Bill Ward teve que se afastar novamente para tratar da saúde –, em seu lugar, foi chamado Bev Bevan (Electric Light Orchestra), Gezzer Butler demonstrava profundo interesse em deixar o grupo. Enfim, a “superbanda” (com gente do Black Sabbath, Deep Purple e E.L.O.) Black Sabbath, ainda fez boas excursões até Ian Gillan receber o convite para a uma reunião da MKII do Deep Purple, que primeiramente resultou no lançamento do espetacular “Perfect Strangers” (1984).
No documentário “The Black Sabbath Story, Vol. 2”, Tony Iommi chega a dizer que a “banda foi formada no papel. Nunca tínhamos ensaiado”. O guitarrista deixa claro que a intenção era formar um supergrupo, mas por insistência do empresário Ton Arden (pai de Sharon Osbourne), acabaram usando o nome Black Sabbath. Mais adiante, Ian Gillan menos desaprovador, declara: “Torço para que seja feita uma remixagem desse disco, pois ele ficará muito melhor”.
Alguns comentam que “Born Again” foi o motivo da separação do Black Sabbath, pois Bev Bevan parte tão logo à saída de Gillan em 1984 e, posteriormente em 1985, Geezer Butler também sai. Para uma multidão considerável de fãs, inclusive brasileiros, o álbum é simplesmente um dos maiores clássicos, não só da banda, como do Rock em geral.
Em 2011, “Born Again” foi relançado pela Sanctuary Records como CD duplo, trazendo no disco dois, onze faixas gravadas ao vivo no dia 27 de agosto de 1983, para o Friday Rock Show da BBC Radio 1. Entre as músicas consta “Smoke On The Water” (Deep Purple), que integrava o set list da turnê. O mesmo digipack foi relançado também pela alemã BMG em 2014.
Track List
1.Trashed
2.Stonehenge
3.Disturbing The Priest
4.The Dark
5.Zero The Hero
6.Digital Bitch
7.Born Again
8.Hot Line
9.Keep It Warm