Até que demorou bastante! A gente passou muito tempo absorvendo e replicando – ou reinterpretando – tudo que vinha de fora. E de nossa perspectiva, observávamos as bandas, americanas ou europeias, falando de temas globais, que também eram, aprofundando-se caso por caso, temas inerentes as histórias e tradições culturais dos países de origem de cada uma. As Grandes Guerras, os deuses gregos, o antigo Egito, a Inquisição, as tradições Vikings, Napoleão, Kennedy, Alexandre… Tudo inquestionavelmente válido, mas que não supria a lacuna de olharmos para dentro de nosso território. Nós permanecemos prosseguindo nas temáticas de violência, horror e exaltação ao estilo, sem explorar devidamente a riqueza e fertilidade de nosso quintal. Afinal, essa é a terra que, em se plantando, tudo dá!
Nós temos folclore, nós temos literatura, temos história! Talvez tivéssemos incutido a ideia de que, pelo fato da matriz do gênero ser estrangeira, esse tipo de fusão não seria funcional. Esse, porém, é um conceito que está ultrapassado desde, pelo menos, Os Mutantes. No Metal, Angra e Sepultura fizeram alguns acenos e foram aos poucos sendo seguidos por bandas consagradas e iniciantes. Essas últimas, principalmente, foram aos poucos abraçando com mais empenho a causa de valorizar nossas tradições através da música pesada, chegando a juntar-se em forma de movimento, denominado Levante do Metal Nativo.
Uma dessas bandas é justamente o Tupi Nambha, natural de Brasília, o centro do país. Em pouco tempo de formação, definiram o seu conceito e gravaram esse primeiro disco, cujo grande diferencial é o fato de trazer todas as suas letras em Tupi. Esse é um tipo de iniciativa extremamente válida, pois são atitudes assim que vão mantendo a língua viva. A própria ONU possui registros de línguas e dialetos que já se extinguiram ou que sobrevivem através de grupos minúsculos de pessoas (por vezes, menos de dez falantes), então, uma banda de Metal fazer um resgate dessa natureza, é mais uma forma de lutar pela preservação desse aspecto cultural tão importante.
Essa forma de compor exige que as músicas estejam de acordo com a métrica, e o estilo que o Tupi Nambha segue aproxima-se mais do Groove Metal, com riffs de guitarra secos e minimalistas de Rogério Delevedove e um acompanhamento rítmico forte, de bateria e percussão, trazendo à tona a característica de música tribal. Achei estranho, a princípio, o fato da banda dar títulos em português para canções escritas em tupi, mas pelo menos facilita, para a maioria, a possibilidade de fazer uma ideia sobre o teor de cada faixa. A primeira tem o mesmo bem sacado título do álbum, “Invasão Alienígena”, a utilização de um conceito atual para retratar o sentimento que deve ter dominado nossos índios quando os caraíbas chegaram. Marcos Loiola imposta a sua voz seguindo a mesma rítmica da música, fazendo com que tudo soe como um ataque uníssono, prosseguindo nas pesadíssimas “Antropofagia” e “Tribo em Guerra”. Após “Tupi Nambha”, surge a única faixa cuja levada soa mais suave que as demais: em “Galdino Pataxó”, a distorção é apaziguada para homenagear o líder indígena que morreu queimado, em uma ação criminosa ocorrida em 1997.
“Feiticeiro” começa com um riff Doom, e mantém uma condução hipnótica e ameaçadora, abrindo sua mão de xamã e oferecendo-nos “Ayahuasca”, a música mais rápida, que termina o disco cumprindo sua promessa de apontar novas direções. O Tupi Nambha tem os méritos de pensar fora da caixa e mostrar que ainda temos muitos tijolos para inserir nesse monumento que se chama Metal Brasileiro, que sempre se destacou por suas inúmeras peculiaridades, mas agora ufana-se de soar mais brasileiro do que nunca.
Formação:
Marcos Loiola – vocal
Rogério Delevedove – guitarra
Músicas
01.Invasão alienígena
02.Antropofagia
03.Tribo em Guerra
04.Tupi Nambha
05.Galdino Pataxó
06.Feiticeiro
07.Ayahuasca