Do país da diversidade cultural e natural é de onde vem mais este lançamento de 2019, contrariando as linhas mais conhecidas do país esta banda chega ao cenário para provar que a Austrália carrega mais do que AC/DC em seus registros. E se em 2018 nós tivemos uma colossal quantidade de lançamentos não seria este ano diferente para o setor do Metal que mais trabalha, sim estamos falando de Black Metal.
Para longe dos fiordes gelados da Noruega onde eu me encontro chegou a hora de dirigir meus ouvidos para o debut álbum da banda australiana Tanin’iver e seu profuso “Anno Domini Nostri Satanas“, lançado de forma independente no último dia 30 de Maio.
A dupla de músicos em Tanin’iver, Skorpa, vocais e teclados, e Asmodeus, guitarras e baixo, apresentam nove faixas tão poderosas quanto eu menos poderia imaginar, eu devo admitir que embora a minha cabeça tenha estado muito em Death e Black metal nos últimos anos são poucas coisas que realmente me impressionam, ainda mais aqui onde a vertente reina absoluta.
Alguns fatores distinguem álbuns que contenham mais do que apenas linhas costumeiras, ainda mais se tratando de Black Metal. Atualmente vemos muitas bandas transformando seus álbuns em rituais tão longos e confusos que acabam perdendo a essência e a criatividade, mas esqueça isso sobre Tanin’iver, o que você encontrará aqui é uma criatividade única com referências totalmente diferentes, atmosferas intercaladas e cintilantes, riffs vertiginosos e toda uma linha instrumental e lírica contundente.
Bem vindos de volta a uma época onde bandas como Mayhem e Dimmu Borgir tinham mais profundidade sonora do que apenas uma fome de mostrar o “lado negro da força”.
Abrimos esta audição em “Do Unto Others…”, entre chuva, trovões e uma viagem sonoplástica que vai te arrebatar de um clima árido de dunas de areia ao inferno de fogo de potentes guitarras e linhas gutturais explosivas em segundos.
O trabalho da bateria é outro ponto que precisa ser notado de imediato sendo que finalmente posso ouvir mais do que apenas tambores soando como máquinas de prensar papel, ao contrário disso, este não é apenas mais um álbum de Black Metal, foi criado nitidamente para ser agressivo e ajustadamente bem projetado. Cada instrumento está em níveis sonoros justos o que possibilita o ouvinte de distinguir sem dificuldade a presença de cada um.
Passamos a “Thrice Cursed Are The Weak” e outra carga de energia sombria é lançada sem piedade, os vocais de Skorpa se difundem aos solos dilacerantes de Asmodeus e o ouvinte pode apreciar uma faixa tão intensa quanto o próprio inferno. Isso é realmente compensador, enfim algo que soa tão revigorante a este estilo que já foi massivamente trabalhado.
O álbum mal começou e o ouvinte estará sedento pelo que virá a seguir, então pode aumentar o volume para “Golgotha“. Acho que é neste ponto onde a Austrália se confunde com a Noruega e eu me sinto em casa, a sonoridade ganha picos atmosféricos gelados e enigmáticos enquanto Asmodeus abre as portas do inferno para uma faixa que se alguém dissesse “Isto é da Noruega” ninguém iria duvidar.
Um fator muito interessante sobre este trabalho e que estes músicos trazem para dentro das músicas características e gostos pessoais muito distintos e inclusive referências de blues, trilhas sonoras de filmes e tantos outros aspectos que trazem a Tanin’iver uma identidade única e generosamente criativa.
“Bloodlines” reafirma este meu pensamento apresentando linhas mais melancólicas e envolventes e pela primeira vez neste álbum reduzindo a enérgia a passagens mais reflexivas que interagem a uma branda presença de Death metal.
Esta também é a faixa mais longa neste álbum, contando com seus 10 minutos e 32 segundos onde uma profunda presença orquestral se mescla a bateria em profusão e solos que viajam de Heavy a Black metal em fração de segundos.
Aqui mais um ponto positivo neste álbum, por se tratar de Black metal muitas bandas se confundem com a dimensão de tempo das faixas, o que torna por vezes o álbum cansativo ao ouvinte, mas neste caso o faixa-a-faixa corre por tempos curtos e como cada música contém uma qualidade e estrutura diversificada a audição se torna prazerosa o que facilmente pode conduzir esta banda a excelentes apresentações ao vivo.
A imersão em novos elementos é outro ponto de destaque e você receberá a presença de piano clássico e violinos em “Steed Of Lilith” antes da violência da voz Skorpa reposicionar o ambiente.
Eu fico tentando entender porque tão poucas bandas ousam usar mais criatividade do que apenas transformar a sonoridade em um bloco maciço, o que torna tudo muito delimitado mas que Tanin’iver sabe contrariar explorando sem limites e que certamente trará surpresas aos ouvintes. Eu gosto de pensar neste aspecto quando “The Burning Of The Second Temple” se inicia e obtemos uma presença de Thrash metal escondida a linhas melodiosas e solos mais detalhistas enquanto Skorpa parece cuspir fúria e toda a estrutura da faixa faz um passeio pelo Metal sem cometer erros.
“Ahura Mazda” segue o álbum em melodias suaves contrastantes ao universo negro do setor, um truque bem dosado na minha opinião, que confunde a mente do ouvinte e ao mesmo tempo trás a inspiração natural que poucas pessoas sabem que é tomada como influência ao Black Metal. Mas não se afaste, este é apenas o ponto de equilíbrio antes que “Angra Mainyu” te faça cair no abismo novamente.
Fechamos o álbum em “…as They Do to You” e eu mal poderia esperar tantos contrastes dentro de um álbum que por definição está em Black Metal mas que por qualidade abrange muito mais do que estes músicos possívelmente pensaram em criar.
Falamos de clareza de detalhes, faixas dotadas de qualidade de produção, sonoridade limpa e genial, orquestração, e uma identidade única que Tanin’iver pode ser definida para marcar o cenário como uma renovação.
Se as bandas norueguesas reinaram soberanas nesta vertente até este momento talvez tenha chegado a hora de todos olharmos para a Austrália, Tanin’iver marca o país como um sucessor ao trono realmente digno.
Track listing
1 – Do Unto Others…
2 – Thrice Cursed Are The Weak
3 – Golgotha
4 – Bloodlines
5 – Steed Of Lilith
6 – The Burning Of The Second Temple
7 – Ahura Mazda
8 – Angra Mainyu
9 – …as They Do to You
Membros da banda
Skorpa – Vocal e Teclados
Asmodeus – Guitarra e Baixo