O ato de receber esse CD foi acompanhado por uma rápida e inusitada sensação. Havia calor ali, naquela pequena caixa de acrílico. Calor que parecia irradiar a partir daquele ponto luminoso na ilustração da capa e percorria o restante da embalagem.
Nada poderia trazer mais luzes para esclarecer essa impressão do que a ação de colocar o disco para tocar. Surgiriam, daí, duas razões bem claras: a primeira, a intensidade geradora de energia que emanava dos registros sonoros nele contidos; a segunda, o amor. Pura e simplesmente, o sentimento quase palpável de paixão por um estilo, que se revela em cada trecho do que você ouvirá. “Disciples of Metal” é um título absurdamente bem encaixado e, como tudo o mais aqui, transparece o extremo cuidado com cada detalhe, a começar por sua escolha.
Sim, porque ao longo das nove faixas, você não encontrará qualquer coisa fora de lugar. As canções, mesmo as mais extensas, soam absolutamente redondas e enxutas, não revelando possuirem quaisquer excessos desnecessários. São plenamente completas em si mesmas. Os mais de quatro anos que o trabalho levou para ser desenvolvido estão visíveis no cuidado dos arranjos e no desempenho de cada músico. Compor Metal Tradicional é, na minha visão, uma das práticas mais desafiadoras dentro da vasta gama de subestilos existentes, afinal é o estilo primordial e praticamente tudo já foi feito em seu nome. Navegar na sua sonoridade e, ainda assim, conseguir soar instigante, conseguir atrair a atenção de ouvidos mais calejados é, por si só, uma grande vitória, pois garanto que muito do que se pratica por aí, ultimamente, não passa de mais do mesmo. O Oráculo está entre as exceções!
A escolha dos timbres é a chave! As guitarras soam como guitarras devem soar. Ásperas, cortantes e pesadas. A banda, embora possua acentos melódicos evidentes, não se prende aos cacuetes do Metal Melódico. É Heavy Metal puro, sem desvios no caminho, e a atuação do vocalista Robson Alves também transparece essa inclinação. O cantor possui uma voz privilegiada, que o coloca em posição de destaque para além das fronteiras do Ceará ou da região Nordeste, utilizando seus recursos de interpretação das mais variadas formas, valorizando os drives ou os momentos mais suaves, conforme cada música pede.
Mantendo a tradição de grandes álbuns que abrem com viradas de bateria, Sula Cavalcante dá os golpes introdutórios de “Come Back In Time”. Empolgante e possuidora daquele tipo de linha melódica de guitarra que convida a plateia a repetir suas notas em coro, a canção passa por um breve interlúdio antes de retornar para o riff principal, de um modo que você mal percebe como foi que aconteceu, mas que de repente já se vê reinserido no clima da canção. Essas mudanças sagazes de andamento são trabalhadas com muita perícia, como transparece em “Sounds Of Life”, que a partir de um início com ritmo mais tenso, modifica-se sequencialmente, ficando cada vez melhor até retornar para seu ritmo inicial no momento da conclusão.
O Oráculo já possui um repertório forte e estabelecido, mas não creio que, doravante, poderão omitir a faixa título de suas apresentações. Velocíssima e precisa, “Disciples Of Metal” comunica-se diretamente com aquilo que o público retratado deseja. A banda sabe dosar bem cada uma de suas influências dentro de suas composições, mantendo-as identificáveis mas combinado-as com a parcela de musicalidade original que surge do somatório da contribuição de cada integrante. Assim, “Strange Redemption” é a música que revela mais elementos de Iron Maiden entre as demais, permitindo que Vicente Wilson possa extrapolar nos preenchimentos de baixo entre as estrofes.
“Escape To Reality” traz uma participação acústica do ex-integrante Franzé Mendes e a parte do solo que replica a melodia do verso “believe in your dreams” soa tão simples quanto bonita. Mas, para falar de beleza em sentido literal, teremos que avançar para a canção seguinte… “Secrets” é, certamente, um momento especial dentro deste disco. A faixa chegou, por um momento, a ser cogitada para emprestar seu nome ao título do álbum e, embora “Disciples Of Metal” tenha sido uma opção mais acertada, “Secrets” também era merecedora. Talvez tenha sido melhor assim, pois dessa forma ela pode se revelar, para cada ouvinte, como a grata surpresa que é. Uma balada épica emocionante, que não comete o erro comum de transfigurar o seu andamento para algo mais rápido ou pesado. Não! Ela cresce em vibração até o seu final, mantendo a ideia original, sem precisar virar “outra música” para alcançar o inegável clímax.
As três próximas e últimas faixas trarão, cada uma, um convidado nos solos, fazendo parceria com as criativas performances do guitarrista Paulo Henrique. A cadência de “House Of Doom” transmuta-se em Speed Metal para receber a colaboração de Jardel Reis. “So Many Weapons” inicia grandiosa e articula melodias que lembram trilhas sonoras de faroeste, evoluindo de forma fluída nas passagens entre estrofes, pontes e refrãos, culminando com a inserção do solo de Joe Wilson. Por fim, o teclado de Gilberto Junior reforça o clima de Rock Progressivo na parte introdutória de “The Thoughts Of The King”. Tendo os solos de Daniel Camelo, esta última música parece agregar em si o amálgama de todas as características percebidas e relatadas durante este texto: O apuro melódico e a velocidade desafiadora. O peso, o carisma, a emoção e as experimentações. Enfim, toda a meticulosa criação de uma banda que parece sempre escolher as palavras mais exatas e, agindo como Oráculo que é, sabe que nos entregou um trabalho repleto de mensagens a nos conduzir.
A nós e ao seu discipulado que não para de aumentar.
Formação
Robson Alves – vocal
Paulo Henrique – guitarra
Renan Ferreira – guitarra
Vicente Wilson – baixo
Sula Cavalcante – bateria
Músicas
01 Come back in time
02 Sounds of life
03 Disciples of metal
04 Strange redemption
05 Escape to reality
06 Secrets
07 House of doom
08 So many weapons
09 The thoughts of the king