Em minha cabeça, eu enxergo os primeiros anos da música pesada americana através de três fases: a primeira, com as bandas/artistas pioneiros, como Cactus, Kiss, Blue Oyster Cult e Ted Nugent, por exemplo; a terceira, com o advento das bandas de Thrash Metal. Entre essas duas, uma leva de bandas que já se assumiam com a nomenclatura Heavy Metal, tais quais The Rods, Liege Lord, Riot, Armored Saint, Manowar, Cirith Ungol, Omen, Virgin Steele… Na grande maioria, curiosamente, a tendência em abarcar temas épicos. Entre todas, tão importante quanto as demais, há o Manilla Road.
Sempre achei interessante o fascínio que os americanos têm por essa temática de bárbaros e espadas, sendo que isso está mais ligado ao passado do continente europeu. A literatura estadunidense, porém, foi pródiga nessa linha editorial, tendo Robert E. Howard, criador de Conan, um de seus expoentes. Na música, bandas como as mencionadas acima traduziam em canções não apenas o universo cimério, como também temas da Távola Redonda, ou da obra de Tolkien.
A música do Manilla Road é um Heavy Metal classudo e bombástico. Naturalmente forte e naturalmente pesado. É fascinante a forma como as canções executadas pela banda conseguem repassar o clima medieval sem precisar recorrer aos artifícios excessivamente utilizados por grande parte dos artistas atuais. Ninguém vai encontrar, aqui, um coro com cinquenta alemães berrando para transmitir a sensação de batalha. Os arranjos, as melodias e os timbres já fazem, a contento, esse serviço.
Ao começar o disco, com a faixa “Metalstrom”, já dá pra perceber que é uma banda coesa que está ali, e o título da mesma já é uma carta de intenções bem clara. Mark Shelton, o líder do grupo, tem uma voz perfeita para o estilo, ríspida e aguda, misturando drama com agressividade, além de ser um guitarrista de mão cheia. A levada das estrofes de “Hour of the Dragon” tem aquele tipo de tensão que lhe segura na expectativa da chegada do refrão explosivo. No geral, as músicas do Manilla Road passam uma inusitada sensação de êxtase. Não dá pra ouvir “Astronomica” sem se sentir uno com o sentimento da música, ou, principalmente, ouvir “The Ninth Wave” sem ter vontade de erguer um brinde com os amigos que estiverem próximos, sem nenhum motivo especial afora o fato de estar apreciando uma grande canção! Em “Open the Gates”, faixa-título, há uma certa semelhança com o Cirith Ungol, excetuando talvez o vocal, e “Heavy Metal to the World”, não obstante o título, me soou como algo que o Manowar poderia ter feito. Essas similaridades transparecem, em primeiro plano, o completo domínio das características inerentes à musicalidade do ambiente que tencionavam representar.
Mark Shelton prosseguiu liderando o conjunto, até a sua partida em 2018, deixando apenas a função dos vocais principais para Bryan Patrick, desde 2005. Na época desse disco eles eram um trio e esse formato é sempre o mais desafiador. Desafios, porém, não eram problemas para Shelton. Ele prosseguiu, tantos anos depois, sem vontade de parar, batalhando no underground, com a mesma perseverança de tantas bandas íntegras, tais quais são também o Anvil, Exciter, Angel Witch, Tank, Artillery, Demon, Picture e milhares de outras que, maiores ou menores, não veem problemas em estar nos palcos dos pequenos clubes. Os holofotes são mais reduzidos, mas a paixão emanada pelo público é imensa. Quando eu chego ao final da audição de um trabalho assim, não deixo de me sentir um pouco privilegiado por ter tido a oportunidade de ter acesso a uma música tão boa.
O privilégio, afinal, foi de todos nós, por termos tido acesso à música de Mark Shelton.
Formação
Mark Shelton – vocal, guitarra
Randy Foxe – bateria
Scott Park – baixo
Músicas
01 Metalstrom
02 Open the Gates
03 Astronomica
04 Weavers of the Web
05 The Ninth Wave
06 Heavy Metal to the World
07 The Fires of Mars
08 Road of Kings
09 Hour of the Dragon
10 Witches Brew