Nas mãos certas, a música ganha o tempero desejado, seja ele peso, balanço ou qualquer outro. Os acordes são basicamente os mesmos, a diferença está na forma como eles são tratados. O HipHop é um estilo gigantesco e, à semelhança de um outro estilo acolá, se subdividiu em uma ampla gama de variações, cada qual com sua própria denominação.
Desde sempre, uma das mais agressivas foi o Gangsta Rap e Ice-T um de seus principais porta-vozes. Em 1992, aquele disco incomum, denominado simplesmente de “Body Count” chegou em minhas mãos. Hoje, passadas mais de duas décadas e meia em que o Heavy Metal foi submetido a todo o tipo de experimentação ou fusão, ainda existem fãs que torcem o nariz para qualquer coisa que afete suas concepções de purismo. Eu, por outro lado, sempre abri espaço para satisfazer minhas curiosidades e recebi aquele disco com grande satisfação. Ainda hoje, é um de meus álbuns preferidos de música pesada.
E o que poderia parecer um capricho passageiro para os mais críticos, tornou-se uma carreira paralela com vida própria, já somando seis álbuns no currículo. “Bloodlust” é o mais recente e demonstra, desde a capa, que a estética não sofreu mudanças. Musicalmente, por outro lado, há indícios de que os elementos da cartilha roqueira estão ocupando espaço maior na proporção da mistura. No primeiro álbum, o HipHop soava muito evidente, em grande parte por conta da dicção característica de Ice-T, que ainda puxava muito para a sua zona de conforto. Atualmente, a mescla de Hardcore, Thrash, Punk e – naturalmente – Rap, tornou-se uma sopa de consistência mais homogênea, que não poderia ter evoluído da mesma forma em qualquer outro local que não fosse a multifacetada Los Angeles.
Coube ao trio formado por Ice-T, o guitarrista Ernie C e o homem dos samplers, Sean E Sean, manter a banda ativa apesar da alternância dos demais integrantes. Em um pequeno trecho narrado na metade do disco, Ice-T escancara as influências bodycountianas dentro do tripé Black Sabbath, Suicidal Tendencies – que recebeu uma homenagem no álbum anterior, com a releitura de “Institutionalized” – e Slayer, que é coverizado aqui com a dobradinha insana de “Raining Blood/Post Mortem”. Engana-se, porém, quem pensa que o peso do disco alcança seu ápice nesse trecho, pois há momentos absurdos, onde os convidados da festa ajudam a elevar o nível. É o caso de Max Cavalera tornando o refrão de “All Love Is Lost” ainda mais monstruoso, ou de Randy Blythe, do Lamb of God, emprestando os seus vocais para a velocidade de “Walk With Me…”.
Dave Mustaine acrescenta um de seus solos dentro do arranjo da faixa de abertura, “Civil War”, mas no final da rotação do álbum é que se encontra um de seus melhores momentos, “Black Hoodie”, detentora de riffs potentes, que a fizeram merecidamente ser indicada para o prêmio de Melhor Performance de Metal na cerimônia do Grammy de janeiro de 2018. Talvez seja esse tipo de reconhecimento que tem feito com que a discografia de Ice-T dentro do Rap tenha se tornado mais irregular em detrimento de sua atuação no Metal e de seu trabalho como ator. Nâo é à toa também que a faixa “Here I Go Again” seja uma sobra de estúdio de sua carreira solo, rearranjada para ser utilizada dentro deste álbum. No momento em que essa resenha for publicada, o próximo disco já está em fase final de preparação. Se for tão consistente quanto “Bloodlust”, é sinal de que, realmente, a soma de estilos sempre pode ser maior do que as partes isoladas.
Formação
Ice-T – vocal
Ernie C – guitarra
Juan of the Dead – guitarra
Vincent Price – baixo, vocal em “Postmortem”
Ill Will – bateria
Sean E Sean – sampler
Músicas
01 Civil War
02 The Ski Mask Way
03 This Is Why We Ride
04 All Love Is Lost
05 Raining In Blood/Postmortem 2017
06 God, Please Believe Me
07 Walk With Me…
08 Here I Go Again
09 No Lives Matter
10 Bloodlust
11 Black Hoodie