Prosseguimos com nossa coluna, dando continuidade aos produtores de maior relevância durante os anos 80, cuja intervenção no trabalho dos artistas desenvolveu tendências que perduram até hoje.

RICK RUBIN

Versatilidade.

Essa é a palavra que ocorre ao lembrarmos de Rick Rubin. Não poderia mesmo ser de outra forma, afinal, o que podemos identificar de comum entre LL Cool J e Trouble? Adele e Slayer? Johnny Cash e Slipknot? O nome do produtor é o ponto de interseção entre esses artistas e uma diversidade de outros que buscam uma oportunidade de trabalhar com ele.

Rubin iniciou sua carreira produzindo músicas do rapper LL Cool J e foi no Hip-Hop que começou a estabelecer o seu nome, alcançando reconhecimento com a bem sucedida estreia do grupo novaiorquino Beastie Boys, através de seu álbum “Licensed to Ill”, de 1986. O disco consagrou-se como um dos mais importantes do gênero e, no mesmo ano, teve a companhia de outra pedra fundamental de um gênero distinto: o Thrash Metal, que tornou-se mais brutal do que já era originalmente, através de “Reign in Blood”, do Slayer.

Na sequência, veio uma série de trabalhos relevantes de artistas como The Cult, Trouble, Danzig e Black Crowes. A essa altura, o selo criado por Rubin, Def Jam Records, já tinha se consolidado no mercado fonográfico e os métodos de seu fundador começam a se tornar lendários. Rubin não se tornou notório por fazer grandes inovações nas mesas de gravação. Ao contrário, ele sempre buscou mais a postura de treinador, de tirar do artista aquilo que o configurou, que o fez se tornar o que é. Foi assim com nomes como Metallica e Black Sabbath, onde ele trabalhou em proximidade com as bandas para que resgatassem seus mais básicos métodos de composição. Consta que, ao produzir o álbum “Death Magnetic”, cada vez que Lars Ulrich se dirigia para compor nos computadores, Rubin incentivava-o para fazê-lo na bateria.

Grande parte desse padrão de conduta foi desenvolvido quando ele hospedava as bandas no seu estúdio The Mansion, montado em uma mansão antiga que, segundo as lendas, foi onde os Beatles experimentaram LSD pela primeira vez, além de ter sido residência do ilusionista Harry Houdini. A mítica do ambiente favorecia a fluência de ideias pelos artistas e pode ser melhor observada no documentário “Funky Monks”, que cobre o período de gravação do disco “Blood Sugar Sex Magic”, do Red Hot Chili Peppers, um dos grandes trunfos de Rubin junto a uma banda e que estabeleceu uma parceria que geraria vários outros discos.

Se não fosse por Rubin, seria provável que a canção “Under The Bridge”, dos Chili Peppers, não tivesse visto a luz do dia, pois foi o produtor que encontrou sua letra em um dos cadernos do vocalista Anthony Kiedis e, ao questioná-lo, recebeu de seu autor a resposta de que não acreditava que aquela canção tivesse qualquer coisa a ver com o tipo de repertório de sua banda. Rubin pensou o contrário e o resto é história.

Dono de uma inconfundível barba e praticante de meditação, Rubin disse que aproximou-se dessa técnica de relaxamento por conta de sua paixão pelos Beatles, por querer se vincular a qualquer coisa com que o quarteto de Liverpool tenha se envolvido. Essa paixão é a mesma que faz com que ele eleja Paul McCartney como o músico com o qual ele ainda tem vontade de trabalhar. Mesmo que não o faça, o catálogo de discos que carregam o seu nome é um completo quem-é-quem da música atual pois, além dos nomes já citados, constam também artistas do naipe de System of a Down, Eminem, Mick Jagger, The Mars Volta, Weezer, Linkin Park, Kanye West, Ed Sheeran, Lady Gaga e, como não poderia deixar de ser, seus gêmeos do ZZ Top. Entre tanta relevância, ainda há espaço para aqueles que habitam o panteão superior da música popular e foi, justamente, Johnny Cash, quem encabeçou outra das mais venturosas sucessões de discos realizados pelo produtor, conhecidos como “American Recordings”, onde a voz profunda do Homem de Preto resgatou canções clássicas e misturou-as com composições modernas de bandas como U2, Nine Inch Nails, Depeche Mode e Soundgarden.

Nem tudo, porém, é isento de críticas em sua carreira. Bandas como Slipknot e AC/DC tornaram públicos os seus descontentamentos com o produtor, acusando-o de fazer muito pouco pelos discos ou sequer estar presente nas gravações. Outras reclamações referem-se a alguns de seus métodos, onde a compressão exagerada do som e o alto volume foram apontados como técnicas de gravação que causavam cansaço ou incômodo nos ouvintes, não permitindo que a música respirasse, que fornecesse pausas ou vales sonoros que fizessem contrabalanço aos picos. Tal efeito ficou conhecido com o nome de “Loudness War”. De qualquer forma, esses revezes não foram suficientes para que seus trabalhos não fossem sucessos de vendagem e vencedores de Grammys. Hoje, a marca de seu nome é tão forte quanto a dos artistas com quem colabora e pode-se dizer que, para a produção de uma notícia, dizer algo como “Próximo disco do Metallica será produzido por Rick Rubin” tem tanto impacto quanto dizer “Rick Rubin produzirá o próximo disco do Metallica”.

MIKE HEDGES

O inglês Mike Hedges tem seu nome vinculado ao Pós Punk britânico, tendo trabalhado com alguns dos nomes mais relevantes desse cenário que se desenrolou entre o finalzinho dos anos setenta e a primeira metade dos oitenta. Embora tenha feito alguns esparsos trabalhos, sua carreira passou a ter mais visibilidade após colaborar com o The Cure em suas primeiras experiências em estúdio, por ocasião da gravação do álbum “Three Imaginary Boys”, de 1978.

A banda liderada por Robert Smith estava tendo alguns problemas com a equipe técnica durante as gravações de seu primeiro álbum, até o momento em que Hedges chegou e conseguiu estabelecer um controle mais preciso sobre a engenharia sonora. Lol Tolhurst, o baterista à época, enfatizou, na biografia da banda, sua admiração pelo que Hedges fazia, ressaltando que seus pontos fortes não estavam ainda na criatividade, mas sim no domínio técnico.

Além do The Cure, o Siouxsie and the Banshees foi outro assíduo frequentador de seu estúdio nomeado Playground, localizado em Camden, mas por lá também transitaram alguns outros nomes que iriam invadir as paradas como o duo Everything But The Girl, o Southern Death Cult – alguns anos antes de abreviar seu nome para simplesmente The Cult – e o cantor Marc Almond, conhecido por seu trabalho no Soft Cell. Após os promissores trabalhos que ajudou a criar, ele ampliou seu acervo de parcerias e atuou junto às bandas Travis, Manic Street Preachers e a cantora Dido.

Os artistas que tiveram oportunidade de gravar com ele, após a inauguração do estúdio Chateau de la Rouge Motte, na França, em 1990, desfrutaram da mágica oportunidade de utilizar a mesa EMI TG12345 Mark IV, de 16 canais, que tinha sido originalmente instalada no Abbey Road Studios e foi usada na gravação de “The Dark Side of the Moon” do Pink Floyd, e de álbuns de George Harrison, Kate Bush e Wings. Hoje a mesa não pertence mais a Hedges, que se desfez dela em um leilão.

O começo dos anos 2000 coincidiram com o momento em que o produtor optou por restringir seus trabalhos e passar mais tempo com a família. Tendo sido nomeado para o Grammy por quatro anos consecutivos, um feito inédito para os produtores ingleses, Hedges pôde atuar junto ao meio cinematográfico, com a equipe musical do filme “Harry Potter e o Cálice de Fogo”, antes de retornar ao mercado fonográfico para fazer o disco “All That You Can’t Leave Behind” do U2. Foi junto aos irlandeses que Hedges sofreu críticas severas ao seu trabalho, pois a banda de Bono Vox lhe entregou algumas faixas do disco “Pop” para que fossem retrabalhadas para uma coletânea. As críticas sobre o resultado obtido disseram que as músicas estavam mais adequadas em suas formas originais e que as alterações promovidas por Hedges e pela banda eram não apenas desnecessárias, mas prejudiciais.

Considerando o bom resultado de “All That You Can´t Leave Behind”, esses contratempos não chegaram a se tornar uma mácula. Trabalhando sobre material original, Mike Hedges tem sempre justificado o peso de seu nome na indústria.

FLEMMING RASMUSSEN

Seu trabalho sempre será o seu melhor cartão de visitas. Para consagrar-se como o produtor que fez o disco “Master of Puppets”, do Metallica, o dinamarquês Flemming Rasmussen não precisou fazer contatos prévios ou sequer ser conhecido do também dinamarquês Lars Ulrich. Bastou ter trabalhado com um dos ídolos do baterista e o resto desenrolou-se naturalmente.

Flemming, nascido no primeiro dia do ano de 1958, é natural de Copenhague e ingressou no célebre estúdio Sweet Silence em 1976, ano de sua inauguração, a convite do produtor Freddy Hansson, tornando-se co-proprietário do mesmo após quatro anos de casa. Lá, ele teve oportunidade de ser o engenheiro de som do álbum “Difficult to Cure”, do Rainbow, fazendo a captação do som da guitarra de Ritchie Blackmore e, principalmente, acompanhando e pegando macetes com o baixista e produtor Roger Glover, de quem se tornou amigo.

Enquanto isso, no outro lado do oceano, a banda americana Metallica iniciaria sua trajetória, estreando com o disco “Kill’Em’All”, cuja receptividade foi o passaporte para que pudessem fazer o seu segundo álbum. Como qualquer banda iniciante com orçamento limitado, começaram a avaliar suas opções e viram que o dólar estava em alta na Europa e, portanto, com o mesmo valor poderiam ter tempo em dobro de estúdio que não poderiam pagar na América. Daí, passaram a ouvir alguns discos e, como fã ardoroso de Blackmore, Ulrich não deixaria de checar os últimos lançamentos do Rainbow. Foi aí que o nome de Flemming e de seu estúdio surgiram.

Os discos que Flemming realizou junto ao Metallica são parte de um período mitológico da banda e do Thrash Metal: “Ride the Lightning”, “Master of Puppets” e “…And Justice For All”. Embora pareça ser estigmatizado como um produtor de Metal, Flemming tem trabalhos em vários estilos, mas não há como negar que seu currículo na música pesada é de proeminência gritante, pois realizou também os discos “Iron”, do Ensiferum, “Enter the Grave”, do Evile, “By Inheritance”, dos também dinamarqueses Artillery, e o Death Metal “Covenant”, do Morbid Angel. Em grau de comparação semelhante ao nível de qualidade pelo qual o Metallica tornou-se conhecido, surgiu também para o produtor outra banda de extrema exigência, vinda da Alemanha e que entregaria em suas mãos alguns de seus principais lançamentos: “Imaginations From The Other Side”, “The Forgotten Tales” e “Nightfall in Middle-Earth” são discos do Blind Guardian responsáveis pelo alcance de status que a banda possui atualmente e, de certa foram, tornaram-se o padrão de comparação para o que fariam depois, tal qual acontece com o Metallica.

Rasmussen é entusiasta dos métodos analógicos, preferindo gravar guitarras, baixo e bateria dessa forma, antes de fazer a transposição para o Pro Tools, e entende que uma de suas marcas como produtor é trabalhar muito próximo aos artistas, fornecendo-lhes toda a segurança necessária. Ele ressalta que, para fazer a produção do tipo de som do Metallica, as gravações de bateria e guitarra rítmica teriam que vir antes do baixo, dado o caráter de música baseada em riffs que se mostrava. Infelizmente, o local onde discos históricos foram concebidos, não existe mais, pois o Sweet Silence foi demolido em 2009, para a realização de obras, mas Rasmussen, depois de ocupar temporariamente um local terceirizado, pôde reabrir seu próprio espaço, agora chamado de Sweet Silence North, em 2014.

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