Resenha: Napalm Death – From Enslavement To Obliteration (1988)

Após terem concebido a grotesca obra-prima do Grindcore “Scum”, os britânicos do Napalm Death lançam o seu segundo trabalho de estúdio, “From Enslavement To Obliteration”, um trabalho tão perverso e agressivo quanto o registro antecessor. Lançado em 16 de setembro de 1988 via Earache Records, o disco conta com uma produção relativamente superior e ainda que possua um som primitivo e anti-musical, demonstra uma notável evolução com relação ao álbum de estreia. O disco traz novamente uma capa emblemática e marcante, concebida por Mark Sikora, que foi o responsável por capas de nomes como Macabre, Unseen Terror e Defecation. A arte capta exatamente o conceito e abordagem do trabalho, sintetizando todo o clima anárquico contido na bolacha. Já as composições, por sua vez, continuam tão brutais quanto no trabalho anterior e abordam temáticas como misoginia/sexismo, direitos dos animais, anti-capitalismo, racismo e materialismo. A seguir, vamos adentrar no conteúdo insano dessa obra obrigatória da música extrema.

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O disco se inicia com uma pegada “Doom” e industrial. “Evolved As One” é uma das diversas introduções que a banda proporcionou ao longo dos anos em seus trabalhos. É uma faixa muito interessante, simples, bem construída e eficiente. Pode-se dizer que sua missão nada mais é que aquecer o ouvinte e prepará-lo para o massacre que está por vir. Seu instrumental niilista e sombrio transmite uma atmosfera surreal, ainda mais acompanhado pelos vocais moderadamente agressivos do vocalista Lee Dorian. Assim que a primeira faixa cessa, a verdadeira aniquilação anti-musical se inicia…

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Contando com pouco menos de um minuto de duração, “It’s A M.A.N.S. World” entra em cena metralhando os alto-falantes e os tímpanos dos ouvintes com seus “blast beats” impiedosos, sua guitarra visceral e cortante, além de urros monstruosos e gritos histéricos. A música é um tributo a canção da banda de Anarco-Punk Crass “Big Man, Big M.A.N”. O Napalm Death havia participado na compilação da Crass Records “Bullshit Detector” e o grupo foi uma de suas primeiras influências. Na sequência, temos um dos grandes destaques da bolacha, “Lucid Fairytale”, um dos muitos clássicos que a banda coleciona. Seu riff inicia arremessa o ouvinte em um redemoinho indescritivelmente caótico. Ainda que bem curta, é um dos melhores sons dessa obra pútrida.

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Se as coisas já estão bem agressivas e vis, saiba que a desgraceira está bem longe de terminar! A dobradinha seguinte, “Private Death” e “Impressions”, é a sujeira em forma de musica, ou melhor, anti-música! Imagine sons incrivelmente curtos, esquizofrênicos, barulhentos e fétidos. Pois é! Essas duas pequenas “canções de ninar” são ainda piores! Os riffs devastadores e viciantes de “Unchallenged Hate” entram em cena, dando início a sexta faixa do álbum. Seu andamento inicial traz uma mescla de arranjos cadenciados e grudentos de guitarra, cortesia de Bill Steer (Carcass), um baixo pesadíssimo de Shane Emburry, além de um desempenho brutal e perfeito de bateria, cortesia de um jovem e amalucado Mick Harris. Contudo, quando a introdução instrumental se encerra, temos uma pequena e absolutamente mortal “paradinha” e então, um Lee Dorian completamente alucinado, esgoelando mais do que nunca, surge em cena trucidando tudo e todos. Sem sombra de dúvida a melhor faixa do álbum e um dos maiores clássicos da banda! Obrigatória!

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Pequenina e mortal, “Uncertainty Blurs The Vision” dilacera o ouvinte com sua infâmia sem tamanho. Próximo ao fim da faixa, o guitarrista Bill Steer executa um “mini solo” grotesco e histérico de guitarra. Não há pausa para descanso, em hipótese alguma! Apresentando um início mais cadenciado, porém não mesmo putrefato, “Cock-Rock Alienation” conta com sutis e devastadoras variações rítmicas. “Retreat To Nowhere”, por sua vez, faz parte da família das canções curtíssimas e agressivíssimas. Riffs sanguinários e selvagens como navalhas destroem os alto-falantes mais uma vez. Os vocais beiram a mais pura demência e insanidade e a “cozinha” toca o terror impiedosamente. Também não faltam “paradinhas” assassinas. Tudo isso em míseros 30 segundos!

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A infâmia prossegue com “Think For A Minute”, uma faixa que faz jus a frase “não pense por um minuto que você estará a salvo do caos”. Creio que isso seja o suficiente para resumir a desenfreada baderna visceral que temos aqui. Igualmente suja, “Display tTo Me…” mescla trechos extremamente truculentos com partes mais cadenciadas. Contendo pouco menos de três de duração, é a segunda música mais longa do álbum após a faixa de abertura! Outro grande destaque do disco surge a seguir, a esmagadora faixa título, “From Enslavement To Obliteration”. Seu instrumental inicial, cadenciado, cru e empolgante incentiva o ouvinte a “banguear” incessantemente e pouco antes de completar um minuto de duração, somos bombardeados mais uma vez com “blast beats” e guturais perversos.

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Falando em bombardeio, é exatamente isso que a faixa seguinte é! “Blind To The Truth” tem míseros vinte e dois segundos de pura insanidade. Outra faixa bem lembrada por muitos fãs surge na sequência, “Social Sterility”. Nela temos linhas agressivas e rápidas de bateria, mas nada de “blast beats” ensandecidos, proporcionando uma experiência igualmente violenta, eficiente e que se contrapõe ligeiramente com muitas das faixas contidas no registro. O quarteto pisa no acelerador novamente com “Emotional Suffocation”, que realmente sufoca o ouvinte com sua levada desgovernada. No meio da faixa temos uma pequena fratura no andamento caótico, no entanto a loucura é retomada nos segundos finais.

A bateria seca e precisa de Mick Harris dá o tom inicial de “Practice What You Preach”. Não demora para que a guitarra de Bill Steer e o baixo de Shane Emburry entrem em cena. Mais uma vez temos um trecho recheado de truculência, que é precedido por um verso cadenciado e perfeito para “banguear” no ritmo do “riff”, seguido de uma passagem moderadamente agressiva, que conduz novamente a demência próxima ao fim da faixa. Quer mais esquizofrenia? Então ouça “Inconceivable?” e se prepare pare mais um pandemônio. Os “blast beats” jamais cessam em um disco como esse e composições como “Worlds Apart” são uma prova cabal disso. A banda trucida tudo e todos novamente, sem qualquer misericórdia.

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“Obstinate Direction” resgata os mesmos ingredientes das faixas anteriores, que são utilizados como se a banda estivesse tocando as primeiras faixas, tamanha a disposição desses senhores ingleses em destruir o que estiver pela frente. A clássica “Mentally Murdered” entra em cena e é indubitavelmente outro ponto alto do disco. A música se inicia incrivelmente veloz e barulhenta, sofre uma sutil variação rítmica em sua metade e próximo ao fim resgata toda a sua insanidade com força total. É importante mencionar que a faixa foi regravada para o EP homônimo realizado em 1988.

Encerrando o álbum, temos a dobradinha encabeçada por “Sometimes” e “Make Way!” e senhoras e senhores, que dobradinha infernal! Uma palavra que define esses dois sons é CAOS. Em letras maiúsculas mesmo. Um fato que é muito importante de ser mencionado é que o álbum foi lançado com um EP de sete polegadas intitulado “The Curse”. O registro, que possui míseros cinco minutos de duração, apresenta cinco faixas, sendo elas “The Curse”, que pode ser resumida como uma espécie de sequência instrumental da faixa “Evolved As One”, “Musclehead”, uma hecatombe nuclear de míseros cinquenta segundos, a dobradinha infame “Your Achievements” e “Dead”, que são quase legítimas sequências da icônica “You Suffer”, do “debut” “Scum”, além de “Morbid Deceiver”, que é uma regravação da faixa “Deceiver”, também presente no álbum de estreia da banda. Em relançamentos do segundo álbum, o EP foi incluído.

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O impacto causado por “From Enslavement To Obliteration” foi tão importante e estrondoso quanto o do registro de estreia da banda. Essa segunda entrega de estúdio foi responsável por colocar a gravadora Earache Records no horizonte “mainstream” quando o álbum estreou em primeiro lugar nas paradas independentes do Reino Unido. Isso levou o selo a ser destaque na capa da revista NME, além de ter proporcionado sessões de rádio na BBC Radio 1, do finado DJ John Peel (1939 – 2004). Em 2009, o disco alcançou a primeira posição da lista da revista Terrorizer dos álbuns essenciais do Grindcore europeu. Outro fato que necessita ser mencionado é que esse foi o último álbum de estúdio a contar com o vocalista Lee Dorian e com o guitarrista Bill Steer, que deixariam a banda em 1989, após gravarem o EP “Mentally Murdered”, lançado no mesmo ano. Mais maduro e sólido que o álbum de estreia e ao mesmo tempo tão devastador quanto, “From Enslavement To Obliteration” continua sendo uma obra prima mortal e um disco que não pode deixar de ser conferido por qualquer apreciador do estilo. Obrigatório!

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♫ “Where does the white man stand?
Where does the black man stand?
Where do we all fucking stand?

KNEE DEEP IN THE SHIT!

Look into yourself
And you’ll find the real oppressor
To a life of unchallenged hate
It’s you who’s the nigger!” ♫

https://www.youtube.com/watch?v=ljhlmi1flVE

Formação:
Lee Dorrian (vocal);
Bill Steer (guitarra);
Shane Embury (baixo);
Mick Harris (bateria).

Faixas:
01 – Evolved As One
02 – It’s A M.A.N.S. World
03 – Lucid Fairytale
04 – Private Death
05 – Impressions
06 – Unchallenged Hate
07 – Uncertainty Blurs The Vision
08 – Cock-Rock Alienation
09 – Retreat To Nowhere
10 – Think For A Minute
11 – Display To Me…
12 – From Enslavement To Obliteration
13 – Blind To The Truth
14 – Social Sterility
15 – Emotional Suffocation
16 – Practice What You Preach
17 – Inconceivable?
18 – Worlds Apart
19 – Obstinate Direction
20 – Mentally Murdered
21 – Sometimes
22 – Make Way!

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