Nessa sexta-feira maravilhosa, o quadro “Heavy Metal Pelo Mundo” da Roadie Metal segue com a missão de mostrar um pouco da cena do metal em países onde o estilo tem pouca, ou quase nenhuma tradição.
E na edição de hoje, o nosso destino será o continente asiático, que por si só já não tem muita tradição no metal, aliás, quando se fala de metal na Ásia o único país onde encontramos referências do estilo de forma fácil é o Japão, que é um grande consumidor principalmente do “Power Metal”.
Nos outros países, pouco se ouve falar da cena metal do local principalmente por questões religiosas, já que há muitas nações no continente asiático onde a influência do Islamismo é muito forte, fazendo com que inclusive o estilo seja proibido nesses países em questões.
Bom, o país que falaremos não tem o islamismo como religião oficial, mas é um local onde os grandes artistas, sejam eles do metal ou não, costumam ter muita dificuldade de entrar, principalmente por conta do regime imposto pelo Governo local.
Hoje, nosso avião aterrissará na China.
Para entendermos um pouco sobre a cena do metal na China, precisamos antes entender toda a questão geopolítica do país, que apesar de ser aberto na questão econômica (tanto que atualmente, a China é a segunda maior economia do mundo), sendo assim um grande exportador para vários outros países, na questão política e ideológica não podemos dizer o mesmo.
A China é comandada pelo chamado “Partido Comunista Chinês“, seguindo um ideal socialista, mesmo sendo mais liberal na questão econômica, o qual é maioria absoluta no país. E além disso, como muitos devem saber, o Governo Chinês é conhecido pelo seu forte autoritarismo, principalmente considerando a forma que o mesmo repreende seu povo quando há manifestações contra o Governo, um dos exemplos mais famosos disso é o conhecido Protesto na Praça da Paz Celestial em 1989.
Sendo assim, a liberdade expressão e a liberdade de imprensa é uma coisa bastante questionada no país, e por essa questão o Governo Chinês sofre bastante pressão da opinião internacional, principalmente no que diz respeito aos direitos humanos. E infelizmente, na questão cultural a coisa não é muito diferente.
Agora finalmente chegando na questão da música, uma das razões de que a China é um destino onde poucos artistas internacionais se apresentaram, certamente, é por conta da forte censura existente no país, e com isso, qualquer artista que for se apresentar por lá, precisa antes apresentar seu material do Ministério da Cultura Chinês, para que o mesmo possa avaliar quais músicas são permitidas no território do país e quais não são.
Algumas das grandes bandas que tiveram que passar por isso foram o Metallica, em 2017, o Megadeth, em 2015, e o Iron Maiden, em 2016.
No caso do Metallica, eles tiveram algumas músicas proibidas, como “Master of Puppets”, “One” e “Creeping Death”. O guitarrista Kirk Hammet chegou até a tocar o riff da primeira para dar um gostinho para os fãs, mas eles não podiam canta-la.
O Iron Maiden não chegou a ter nenhuma música proibida, mas as restrições sofridas por eles foram mais na questão da performance no palco. No caso, eles não puderam usar pirotecnias, Bruce não pôde empunhar a bandeira britânica em “The Trooper”, eles não puderam citar a palavra “Powerslave” na música de mesmo nome (tendo falado “Wicker Man” invés disso), não puderam falar palavrões durante o show e nem sequer jogar presentes para o público (palhetas, baquetas, e coisas do tipo).
O caso mais “cabuloso” foi ocorreu com o Megadeth, pois além de ter algumas músicas vetadas pelo Governo Chinês (como Holy Wars, Angry Again e Skin O’My Teeth), a banda teve seu show bruscamente encerrado após uma hora de apresentação, por razões que até hoje não foram detalhadas.
Só nesses três casos vocês perceberam que não deve ser fácil ser headbanger na China, né?
Mas agora, e as bandas locais da China? Existem? Como sobrevivem? Como são tratadas?
Bom, obviamente, existem bandas de Heavy Metal oriundas da China, e não são poucas, e a partir de agora listarei seis grupos, contando um pouco a história de cada um.
VOODOO KUNGFU
Liderada pelo vocalista Li Nan, o Voodoo Kungfu é uma das poucas bandas chinesas que conseguiram um certo destaque internacionalmente, mesmo que pequeno, principalmente indo pelo fato deles terem sido a primeira banda chinesa a tocar do Wacken Open Air, em 2008.
O grupo, formado em 1998 sob o nome de “Masturbation”, tendo em 2003 mudado para “Voodoo Kungfu”, traz em seu som uma junção do metal extremo com elementos da música tradicional chinesa, contando também com a grande potência vocal de Li Nan.
Além do som extremamente pesado, outra característica do grupo são suas temáticas fortes, onde eles criticam o sistema político chinês, além de outros temas fortes e chocantes, os quais os próprios vídeos da banda não deixam esconder.
Aliás, essas são as razões do porquê que a banda é perseguida no país, chegando até a ser excluída dos grandes festivais chineses por conta disso.
Apesar de ainda aparecer nos festivais da China, atualmente Li Nan mora em Los Angeles, onde foi aprimorar seus estudos vocais.
A banda possui três álbuns lançados, o “Voodoo Kungfu” (2008), o “Dark Age” (2011) e o “Celestial Burial” (2019), tendo músicas cantadas tanto em mandarim, quanto em inglês.
RITUAL DAY
Outra banda chinesa que adotou a sonoridade mais extrema e profana foi a Ritual Day, sendo a mesma a banda de Black Metal com mais notoriedade da China, sendo outra a chegar no Wacken Open Air em 2016.
Formada em 2000, mas assumindo o nome “Ritual Day” apenas em 2016, a banda apresenta a sonoridade e o visual típico e conhecido do Black Metal, adicionando também elementos da música tradicional chinesa junto ao peso da sua música.
A banda tem apenas dois álbuns lançados, o “Sky Lake”, de 2003, e o “Devila Grantha”, de 2017, onde todas as músicas são cantadas em mandarim.
TANG DYNASTY
Toda cena teve uma banda que deu o pontapé inicial para o estilo em seu país, da mesma forma que bandas como o Stress, Sepultura e Sarcófago fizeram isso no Brasil, na China, a Tang Dynasty foi a responsável por iniciar a história do metal na China em 1988 (tendo feito seu primeiro show apenas em 1990).
A sonoridade do grupo remete bastante as clássicas bandas de Heavy Metal Tradicional dos anos 80 e 90, contendo também, adivinhem só, elementos da música tradicional chinesa em seu som.
A banda tem quatro álbuns lançados, onde todas as músicas são cantadas em mandarim. E por isso, nesse caso vou dispensar de colocar os nomes dos trabalhos, pois pelos títulos serem todos no idioma local, vai ser osso tanto para eu escrever quando para vocês entenderem ha ha.
MYSTERAIN
Na China também tem opção para os fãs de Symphonic Metal, formada em 2005, o Mysterain apresenta aquele som bem típico de bandas como o Nightwish, mas com um toque chinês na sonoridade, mais uma vez, contando com um belo vocal feminino.
O grupo possui três álbuns lançados, sendo o último deles o “After The End of the Valley”, lançado em 2016.
THE SAMANS
Vocês devem ter percebido que até agora não mostrei nenhuma banda com o estilo igual a alguma já mencionada, né? Bom, saibam que isso foi proposital, e que o intuito é mostrar a variedade de bandas existentes na China.
Agora, falaremos daqueles que intitulei de “Rammstein chinês”, se tratando da banda de Industrial Metal “The Samans”.
O grupo foi formado em 2006, e ainda não possui nenhum álbum completo lançado, apenas quatro EPs, sendo eles o “Weltreich” (2009), o “Khan” (2011), o “Whalesong” (2012) e o “Lionheart” (2013).
O The Samans é mais uma banda da China que coloca elementos da música tradicional chinesa em seu som, assim como as quatro mencionadas anteriormente, mas o que diferencia eles do resto nesse ponto é que esses elementos não estão tão presentes como no caso dos grupos anteriores, e que os mesmos são colocados mais de forma eletrônica nas faixas (enquanto as outras se utilizaram dos próprios instrumentos tradicionais chineses). Aliás, como toda boa banda de Industrial, os elementos eletrônicos e de sintetizadores se mostram presentes de forma forte.
E uma boa notícia para aqueles que não gostam de ouvir metal em idiomas não muito usuais (antes de tudo, melhorem, por favor), é que todas as músicas do The Samans são cantadas em inglês.
E apesar de se influenciar bastante do Rammstein sonoramente, o vocal gutural é bastante utilizado, dando também umas linhas de Melodic Death Metal em algumas faixas.
DARK COSMOS
Encerrando nossa seleção de hoje, temos a Dark Cosmos, representando a vertente do Metalcore na China.
A banda foi formada em 2002, mas até hoje possui apenas um álbum lançado, sendo esse o intitulado “Metal Heart”, lançado em 2009 (já faz um tempo, como pode se perceber).
O grupo tem suas letras cantadas em chinês, mas das bandas citadas dessa matéria, é a única que não coloca elementos da música tradicional chinesa em seu som, fazendo assim o Metalcore o qual todos conhecem e estão acostumados.
Essas foram algumas das bandas existentes na China, claro que não abordei nem um terço das existentes por ali, mas essas são um bom ponto de partida para aqueles que se interessarem a conhecer a cena do país mais a fundo.
E uma curiosidade interessante é que as bandas de lá costumam ter um nome chinês, e um inglês, onde o intuito é obviamente torna suas músicas mais acessíveis ao resto do mundo, e o mesmo acontece com os nomes das músicas, mesmo aquelas que são cantadas apenas em mandarim.
Agora, antes de encerrar a matéria, vamos responder a seguinte pergunta: Existe festivais de Metal na China?
Bom, especificamente de Metal, não, mas há um grande festival de Rock realizado anualmente nas cidades de Pequim, Xangai e Shenzen chamado “MIDI Festival”. Tendo quatro palcos, o evento consegue arrastar mais de 80 mil pessoas por edição.
Claro, que algumas bandas de Metal configuram no cast do evento anualmente, algumas das citadas acima costumam ser rostos frequentes no evento, e além disso, grandes nomes do Metal mundial também já se apresentaram no palco do MIDI, entre eles, o Whitechapel.
Mas infelizmente, o festival também sofre vez ou outra com a forte censura do Governo Chinês, já tendo ocorrido do mesmo ter sido adiado por conta de questões do tipo, além de já ter tido banda/artista proibido de ir tocar no evento por proibição do Governo.
Bom, encerramos por aqui nosso passeio pela cena do metal da China, espero que tenham curtido a viagem e que tenham conhecido boas coisas novas hoje.
Próxima semana, o redator Vítor Sobreira nos levará para mais um país onde o metal não tem muita tradição. Muito obrigado, e até a próxima.