GIRLS ON THE FRONT é um quadro criado por 4 redatoras para falar sobre mulheres e para encorajar outras a continuarem o seu objetivo na música e, para isso, contaremos a vida e carreira de mulheres no metal brasileiro e internacional. Nessa edição, conheceremos mais sobre a vocalista Larissa Moura.
Larissa Moura começou cedo e aos 16 anos montou sua primeira banda como guitarrista e backing vocal. Atualmente é a frontwoman da Vassali, fundada em 2010, e que até recentemente se chamava Bettercup. Ela concedeu uma entrevista exclusiva para a Roadie Metal em que fala sobre seu início na música, suas influências, o machismo no meio do rock e metal, a marginalização do underground, planos para o futuro e muito mais.
Conta pra gente um pouco da sua história. Quando você se interessou pela música?
Larissa Moura: Eu sempre me interessei por música, tenho lembranças da minha infância com os meus primos ouvindo os discos do nosso avô, Etta James, Chuck Berry, Little Richard, Brenda Lee, e outros clássicos.
Aos 14 anos participei de um coral onde eu aprendi qual era o meu tipo de voz e técnicas de respiração mas não durou muito tempo porque nessa época eu estava começando a tocar violão e me interessar mais pelo punk rock, bandas como Bikini kill e The Gits me influenciaram bastante nesse período, principalmente porque eram bandas com front womans, que traziam discussões em suas letras, levantando questionamentos pertinentes à realidade da mulher em posição de resistência frente ao machismo e representatividade importa demais, quando sabemos que no cenário do rock ainda existe a predominância masculina.
Após isso, aos 16 anos, eu montei minha primeira banda com alguns amigos, onde eu tocava guitarra e era backing vocal. Posteriormente aos 18 anos, iniciou-se a minha trajetória no Hard rock como vocalista com a banda na qual faço parte, 11 anos depois, a Bettercup, que recentemente mudou de nome, agora chama-se Vassali. Minhas maiores influências são as vozes de Janis Joplin, Lzzy Hale, Beth Ditto, Steven Tyler, Brian Jhonson e Robert Plant. Esses nomes marcaram esse momento da minha vida e me inspiram até hoje.

Quais as características mais marcantes sobre o seu trabalho?
Larissa Moura: Esteticamente falando, acredito que a técnica vocal que mais utilizo nas minhas músicas é uma característica marcante no cenário no qual faço parte, seria o Drive. Através dessa técnica que eu venho aperfeiçoando, conseguimos destaques importantes pra nossa banda, como, por exemplo um prêmio no Underground da nossa Cidade como melhor vocalista, e também uma matéria recente de um veículo de comunicação importante que citou meu nome entre as 9 melhores vocalistas brasileiras de rock. Foi uma surpresa muito boa estar entre artistas que tanto admiro e também pelo fato de ver que todo o esforço, carinho e dedicação que eu encaro meu trabalho tem valido a pena.
Além da técnica vocal, eu tenho uma preocupação enorme com as letras das músicas, encaro-as com seriedade e reconheço a importância de utilizar a arte como canal entre nós e os ouvintes, então mais do que entretenimento, me preocupo com a mensagem que quero passar, o tema que vai ser abordado, qual discussão pode ser gerada e qual ideia pode ser desconstruída ou construída a partir do meu posicionamento não só como compositora, mas como mulher, mãe, como profissional, como cidadã, e qualquer outro fator que interfira diretamente na minha vida e no meu processo criativo a ponto de externalizar.
Qual artista feminina te inspirou e/ou inspira?
Larissa Moura: São várias, Janis Joplin, Lzzy Hale (Halestorm), Mia Zapata (The Gits), Beth Ditto (The Gossip), Beth Hart, Joan Jett,. Como eu tive muitas influências do rock internacional, carrego mais nomes que não são brasileiros, mas algumas artistas nacionais também exerceram influências pontuais como, por exemplo, Meg Stock, Pitty e Cassia Eler.

Na sua opinião, o que é necessário para ser uma boa cantora?
Larissa Moura: É super importante ter a consciência de que você sempre pode melhorar, buscar aperfeiçoar-se nas técnicas que você já se sente mais confortável, buscar aprender aquelas que te desafiam como cantora/cantor, respeitar seu timbre, sua respiração e se reconhecer como um artista em eterno processo de construção, sabe? Ninguém nasce pronto pra nada, tudo se aprende.
Isso vale também para o processo de composição das letras, eu aprendi a compor, lendo, quanto mais conhecimento você adquire, mais você abrange seu vocabulário, mais subjetividade você consegue encaixar, e as letras ficam mais ricas com vários elementos e referências, que a longo prazo e aperfeiçoamento vão ganhar cada vez mais características pessoais de quem escreveu, isso é bem interessante!
O que você falaria para a Larissa do início da carreira?
Larissa Moura: Eu falaria pra ela acreditar mais nela, investir mais nela, ter coragem e não perder nenhuma oportunidade.
O que acha que deveria melhorar no underground?
Larissa Moura: A organização, todo movimento precisa de uma articulação forte para acontecer, e nós vemos isso em grupos isolados. Sabemos que o carro chefe da indústria musical no Brasil não é o rock, então nós, independente do segmento que fazemos parte, seja o hard rock, punk rock, heavy metal, hardcore, ou qualquer outro, somos marginalizados, o que nos faz trabalhar de forma autônoma, sem apoio ou recurso que também é nosso por direito.
Por isso seria interessante se houvesse união entre os vários segmentos que o rock abrange, se cada grupo se articulasse, nomeasse um representante, se todos os representantes trabalhassem de forma democrática dando espaço, oportunidades e visibilidade para os artistas, com certeza nós teríamos em pouco tempo um movimento sólido, que sem dúvida iria apresentar ao País e ao mundo, grandes nomes da música, além de refletir positivamente em diversas áreas sociais, considerando a falta de incentivo à arte que enfrentamos no momento e a capacidade de transformação que ela pode causar no indivíduo.

As mulheres estão conquistando um espaço maior no Heavy Metal, qual sua visão sobre isso?
Larissa Moura: Primeiramente eu fico super feliz quando recebo uma notícia dessas, não só no heavy metal. Eu vejo o número de artistas mulheres no rock em geral crescendo consideravelmente em relação aos anos anteriores e, ao mesmo tempo, eu penso como tem demorado esse processo.
Sabemos que fatores culturais influenciam o pensamento de toda uma época, e o que vai determinar os valores dela, são aqueles da classe dominante, então considerando que a sociedade em que vivemos é machista e patriarcal, fica claro o motivo dessa lentidão. Há muitos anos nós mulheres passamos a ter mais autonomia e possibilidades de escolha, mas ainda assim, nos deparamos com situações tão retrógradas que parecem estar fora do contexto.
Por exemplo, na maioria das entrevistas que participei sempre sou abordada com as mesmas perguntas praticamente, sobre como é ser mulher no cenário do rock, sobre os machismos que já enfrentei e enfrento e sobre como é ser mãe e ter uma banda. É impressionante como o gênero ainda é segregado nesse meio, e como o fato de ser mãe e artista nos coloca numa posição como um animal exótico em um cenário urbano. Nunca vi nenhum entrevistador questionar um homem sobre como é ser pai e ter uma banda, são situações como essa que nos fazem refletir sobre a necessidade de levar esses temas para discussões maiores.
Portanto, eu sempre ressalto a questão da representatividade, como ela é importante nesse processo de desconstrução que nós enfrentamos todos os dias. Devemos sim ocupar mais espaços, trocar experiências, apoiar umas às outras, independente do seguimento que cada uma faz parte, porque o processo é lento, sabemos que a sociedade repete padrões comportamentais absorvidos de anos e anos atrás muito antes de a gente nascer, então leva tempo, por isso, quando uma mulher ganha espaço, a vitória é de todas.
E quais os planos para o futuro?
Larissa Moura: Bem, após o lançamento do nosso álbum “Pimenta Dinamite” ocorreu a saída de alguns integrantes e a entrada de novos, isso ocasionou também a mudança do nome da banda que deixou de ser “Bettercup” e hoje chama-se “Vassali”.
Com a entrada de novos músicos, estamos trabalhando no momento em um novo álbum, posso adiantar que ele será intitulado “Máquina do fim dos tempos” e tem sido muito bom criar com novas pessoas, conhecer suas referências musicais e encaixá-las, além disso, haverá o lançamento de um videoclipe.
Também haverá uma participação nossa no projeto Autoral vs Autoral 2, que tivemos a honra de estar no line up da primeira edição e fomos convidados a retornar para que através da criação coletiva, lançarmos um single com alguns participantes desse projeto. Para quem não conhece inclusive, fica a dica. O Autoral vs Autoral é um projeto sério, iniciou-se em São Paulo com os idealizadores, mas atingiu o país inteiro, com muito respeito às produções de rock autoral independente, e apoio ao trabalho que realizamos em nossos estados, fazendo uma conexão entre os artistas e o público. Vida longa ao projeto e por mais inciativas como essa!

Você pode deixar uma mensagem, para os seus fãs e leitores da Roadie Metal?
Larissa Moura: Eu queria agradecer a todos vocês imensamente pelo carinho, por me acompanharem, por acreditarem no meu trabalho, isso é muito importante para qualquer artista, seja ele independente ou não, nós nos dedicamos muito porque esperamos um dia alcançar nossos objetivos, e tenham certeza que sem vocês nada disso é possível, então mais uma vez muito obrigada por dividir esse sonho com a gente! E gostaria de incentivá-los a fazer o mesmo, corram atrás do que vocês acreditam, dediquem-se, invistam o que for necessário e não se percam nas distrações do caminho, ou nas adversidades, tudo é construção!