Girls On The Front: Lia Kapp relembra a carreira e fala sobre mulheres no rock

GIRLS ON THE FRONT é um quadro criado por redatoras da Roadie Metal para falar sobre mulheres e para encorajar outras a continuarem o seu objetivo na música e, para isso, contaremos a vida e carreira de mulheres no metal brasileiro e internacional.

E nesta edição vamos entrevistar a cantora e compositora Lia Kapp. Natural de Curitiba (PR), seu trabalho é caracterizada por apresentar uma atmosfera dark, densa e obscura em seus trabalhos.

Começou a escrever suas primeiras composições em 2014, com 17 anos, lançando-as posteriormente em 2015 em seu primeiro EP, Conflito, que abriu portas para todo o Brasil. Nesta entrevista ela relembra sua trajetória, fala sobre o cenário de mulheres no rock e muito mais. Confira!

Gostaria de saber mais de sua trajetória. Conte como você começou na música? E como despertou a paixão pelo rock e heavy metal?

Eu comecei a cantar com 14 anos, inspirada pelo seriado Glee, mas na época era só no chuveiro. Aos 15, iniciei aulas de piano/teclado e, assim, comecei a cantar e tocar em público e, a partir disso, vieram minhas primeiras composições aos 16 anos. Na época, eu fazia muita música instrumental somente com o piano, então as coisas eram bem diferentes.

Eu só fui levar mesmo a sério o sonho quando eu tinha 17 anos, ao fazer aulas de canto. Antes disso, eu estudava sozinha, sem o apoio de um profissional, mas aí percebi que era o que eu realmente queria fazer da vida. O que me levou a trabalhar com o rock foi a banda Evanescence. Na época, eu e meus dramas adolescentes se identificavam muito com os temas das músicas, e por acaso a minha voz encaixava muito com o tom da Amy Lee.

Eu ouvi intensamente as músicas durante a minha adolescência inteira, então acabou que ficou marcado no meu cerne artístico e não tem como fugir muito disso. Quanto ao heavy metal… Eu nunca fui de ouvir. Eu prefiro rock e metal alternativo.

2 – Quais suas influências? Alguma figura, masculina ou feminina, em especial que fez você pensar “É isso que eu quero, ser cantora”?

No início de tudo foi a Amy Lee com toda a certeza, mas eu também gostava de ouvir a Hayley Williams, do Paramore, e a Taylor Momsen, do The Pretty Reckless. Ainda gosto. Atualmente, minhas influências são totalmente mais voltadas para o pop, então a Lady Gaga tem um papel muito importante na minha vida. Outras cantoras que eu gosto muito são Britney Spears, Billie Eilish… Basicamente, minhas grandes influências sempre foram mulheres, apesar de eu gostar muito também de Radiohead, Tool, Nine Inch Nails… Eu sou bem eclética.

3 – Quais barreiras e desafios você destaca que enfrentou em sua carreira? Teve o apoio de familiares, amigos?

Acho que a principal barreira é não ter todos os equipamentos que eu preciso, tanto de gravação quanto pra fazer show ao vivo. Quando eu tinha 16 anos, meu pai foi comigo numa loja e compramos juntos um microfone e uma interface bem básica pra que eu conseguisse gravar minhas primeiras músicas. Nessa mesma época, minha mãe me deu de presente um piano eletrônico e, no ano seguinte, meu tio me deu um controlador MIDI, então minha família sempre apoiou que eu fizesse isso.

Atualmente, eu estudo bacharelado em música na UFPR, e pra ir fazer a faculdade já foi algo mais difícil de convencer o pessoal. O primeiro curso que tentei fazer foi Psicologia, então eu acho que na cabeça de todo mundo a música era só um hobby, mas se mostrou muito mais que isso. Como eu disse, a principal barreira foi e é não ter todos os equipamentos. Mesmo que minha família tenha me ajudado a ter tudo o que eu tenho, o que é muita coisa, ainda falta. E claro que isso não é culpa de ninguém, as coisas são muito caras e é complicado, não dá pra ter tudo mesmo. Eu e os meninos que tocavam comigo tivemos que emprestar muita coisa aí no meio do caminho e passamos alguns nervosos, mas tá tudo bem. Eu sou grata por tudo isso, de verdade.

 4 – Qual sua visão sobre a atual cena de heavy metal em no Brasil?

Minha cena é mais voltada pra música alternativa e dark. Mas tenho muitas amigas que têm estilos mais voltados pro heavy metal e pelo que eu presenciei, me parece que, nos últimos tempos, as iniciativas de fazer o movimento crescer ainda mais estão aumentando.

Eu participei de alguns festivais, e foi muito incrível. Como estamos numa pandemia, a alternativa do pessoal foi criar esses festivais online, e acredito que muita gente se beneficiou com isso, inclusive eu, que ganhei mais fãs! Então foi bem legal mesmo. Espero que possamos fazer esses eventos presencialmente no futuro.

5 – Como você vê em especial a participação feminina no rock/metal brasileiro?

Na minha opinião, as mulheres estão liderando, tanto no quesito qualidade quanto na presença e atitude. Mas uma coisa que ainda é muito perceptível é que nos reduzem a apenas vocalistas, sendo que participamos de todos os aspectos de uma banda ou projeto, como composição, criação de videoclipe, etc. Acho que tem ainda aquele pensamento de que a mulher é só a cantora que tá ali pra interpretar o que o resto da banda criou, mas acho que, ao mesmo tempo, as coisas estão mudando, devagarinho, mas estão. Outra coisa também é que tem poucas mulheres instrumentistas nas bandas, mas isso é porque sempre sempre vão buscar músicos homens em primeiro lugar, e não porque não existem essas mulheres… 

6 – Você já enfrentou algum preconceito por ser mulher estar no metal? Como é enfrentar isso? O que motiva você a continuar?

Acho que sim, um pouco. Mas pode ser um pouco coisa da minha cabeça também. Acho que o pessoal da música alternativa me acha muito metaleira, e o pessoal do metal me acha muito alternativa. Ao mesmo tempo, esse pessoal todo talvez me ache muito pop, porque eu tenho também um jeitinho de cantora pop, afinal passei minha infância inteira ouvindo Britney Spears e adoro ouvir até hoje. E aí o pessoal do pop deve me achar muito alternativa e metaleira… Uma bagunça. Bom, isso deve ser só a minha insegurança falando, na verdade… hahaha. Eu continuo porque eu tenho grandes ambições e quero muito crescer e ser uma artista muito grande e reconhecida pelo que eu faço. E também porque eu tenho muitas ideias e não tenho capacidade de desistir delas. 

Lia Kapp

7 –  Conte um pouco mais sobre o seu trabalho, por que escolheu abordar a atmosfera mais dark? 

Eu não escolhi, simplesmente aconteceu. Eu usei a música para trabalhar minhas questões psicológicas, para entender o que estava acontecendo comigo no período que tive depressão, para conseguir achar soluções, e achei, claro, junto com a terapia, que foi muito importante.

Antigamente eu só compunha, sem pensar muito no que eu estava fazendo, então tudo que eu já lancei surgiu de maneira muito natural. É só o meu jeitinho. Nos dias atuais, sou, na maior parte do tempo, muito feliz, então estou com dificuldade para escrever, porque eu simplesmente não tenho nada triste pra falar, e, mesmo que eu tenha, eu não quero mais só falar disso. Quero explorar meus outros lados.

8 – O que poderia ajudar o underground a ter mais destaque?

Essa é difícil. Mas acho que em primeiro lugar, os artistas do underground precisam ser cara de pau e se enfiar nas coisas e aprenderem a divulgar direito seu conteúdo. Não que eu seja expert nisso, afinal fazer tudo sozinha é bem cansativo e deixo várias coisas passarem, mas um bom marketing é tudo. Iniciativas como os festivais online dão muito resultado, mas acho que dão mais resultado ainda quando são bem planejados e vêm com coisas diferentes, como a performance da fotógrafa Melissa Giowanella no Lvna Fest III e o Horror Fest.

Quando tem algo a mais assim é muito mais divertido de assistir! Cada banda também pode fazer sua parte e tentar ter um diferencial na sua maneira de divulgar. Um exemplo é a Fenrir’s Scar, que sorteou pôsteres para quem fizesse pré-save dos singles e chamou o público para participar do videoclipe que está para sair. Ter contato direto com o público e criar um relacionamento é essencial. Fora isso, se alguém quiser me contar o que mais poderia ajudar, eu quero ouvir hehe.

9- O que você acha desse movimento de destaque das mulheres no metal?

Acho incrível! Nós merecemos muito destaque! Todas as mulheres do metal que eu conheço são extremamente talentosas e eu as admiro muito. Tenho muito orgulho das amizades que fiz e orgulho de enaltecer todas elas hahaha.

10 – E quais os seus planos a partir de agora?

Já tem novidades ou projetos com a banda ou solo, após a pandemia acabar? Fique a vontade para contar as novidades hehe.

Eu e os meninos da minha falecida banda estamos pra lançar um clipe de uma das faixas do nosso EP do ano passado, Jupiter, que era pra ter sido lançado no ano passado, junto com o lançamento do disco, mas… Acabou que decidimos gravar agora na pandemia mesmo, e eu já editei, só falta correção de cor e algumas outras coisas, e aí lançaremos! Infelizmente não tem data marcada ainda, mas já adianto que vai sair! Além disso, tenho 3 singles que estou pra lançar no meu projeto solo, que provavelmente sairão a partir de janeiro do ano que vem, e um EP de duas faixas do último capítulo da minha série de clipes “A Metamorphösis’ Tale”. Tô bem animada!

11 – Qual conselho você dá para as meninas que estão na batalha ou sonham em seguir carreira no metal, seja cantando ou tocando?

Continua fazendo o que você acredita e se enfia nas coisas, sem ter medo do que vão achar de você. Manda mensagem mesmo, vai atrás, fala com sites, porque as coisas não acontecem sozinhas. Se a gente não bater o pé e dizer “estou aqui, eu existo” e não acreditar na nossa capacidade ninguém vai.

12 – Pode deixar um recado para os nossos leitores e também para todos os que te apoiaram e seguem os seus trabalhos, Lia.

Primeiramente, queria agradecer à Jéssica por me entrevistar e ao Roadie Metal por abrir esse espaço pra todas essas mulheres incríveis e talentosas. Obrigada mesmo! É uma honra poder falar sobre o que eu penso e acredito e saber que eu posso ter esse ambiente para isso. Agora aos leitores: espero que vocês tenham gostado da entrevista e se vocês quiserem falar comigo, estou disponível em qualquer rede social. E assistam meus videoclipes, ouçam as músicas! Eu sou suspeita pra falar, mas tenho muito carinho pela minha arte.

Ao pessoal que já me segue e me apoia: muito obrigada, de verdade. Fiz muitas amizades nesse meio do caminho e tenho muito carinho por todos. São os comentários que me fazem não desistir de tudo isso… Quem me conhece sabe que várias vezes a frustração me venceu, mas muita gente me ajudou e eu continuo aqui e continuo tendo planos e ideias. Espero poder ajudar todo mundo da mesma maneira que me ajudaram. Obrigada.

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