Entrevista – Biquíni Cavadão: vocalista fala como era fazer música nos anos 80, mosh e a era da tecnologia

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Bruno Gouveia, vocalista do Biquíni Cavadão, tinha acabado de descer do palco do Prime Rock Brasil, em Curitiba, quando topou dar essa entrevista à Roadie Metal. Ainda um pouco ofegante, ele falou sobre tocar na Pedreira Paulo Leminski, deu dicas aos novos músicos sobre material online e falou sobre mosh.

Todas as bandas dos anos 80 tinham uma característica muito forte de valorizar texto. E vocês carregam isso até hoje. Queria que você falasse um pouquinho disso.

Bruno Gouveia: Eu acho que naquele tempo a gente tinha uma conjunção estrelar. E de repente você tinha compondo naquela época maravilhosamente bem, Arnaldo Antunes, Herbert Viana, Cazuza, Humberto, Renato, assim só para falar de alguns nomes. E sem contar com casos mais isolados de grandes composições. Eu me lembro que quando ouvi o primeiro disco do Legião, eu falei pra mim mesmo, cara eu não posso fazer nada que esteja abaixo do que esses caras estão colocando. Então acho que criou ali. E eu vejo isso foi muita adolescência, já viu o disco do Legião? Já. A gente não tinha como saber através da internet. Pegava o disco, comprava, botava, começava a ouvir. Nossa, então o disco é assim, essa música aqui, você já ouviu aquela? E a gente comentava um com outro, quando encontrava um com outro porque não tinha como ficar passando mensagem. Então, assim, acho que criou-se uma rivalidade muito positiva porque cada um pensava ‘que música legal, eu tenho que fazer uma música tão boa quanto essa’. Isso foi muito bom porque a gente realmente tinha essa vontade de cada um fazer uma música que não ficasse aquém da produção e da produtividade de tantos compositores.

Fotografia: Angela Missawa.

Como você vê a questão da tecnologia na hora de produzir música. Existe diferença?

Bruno: Infelizmente acho que sim. Eu falo infelizmente porque na verdade as pessoas não entendem que a tecnologia foi feita para você simplesmente ter calma e não pressa. É pra você poder gravar vinte vezes a mesma música e ver qual a diferença que dá se você usar um pouquinho mais de um determinado plugin, entendeu. Vou gravar essa música mais seca, ou então vou mudar o tom. Lembrando, quando a gente gravava discos, na década de 80, 90, nós dependíamos de grandes estúdios, que eram caros. Para você entrar num estúdio para gravar um disco, era um momento. A gente ficava ensaiando, ensaiando, mas nada se comparava a você entrar no estúdio, tirar o som da batera, começar a gravar, tudo mais. Hoje a tecnologia permite que você consiga fazer sons muito bons dentro do quarto, de casa, com um computador. E aí o que acontece. Muitas vezes a pessoa parece que faz a primeira coisa e já tá querendo subir. Então eu sempre falo muito isso para as pessoas, a tecnologia não foi feita para a gente fazer com pressa. É justamente o contrário. A tecnologia foi feita para a gente fazer com calma, explorar tudo que aquela música pode fazer. Ah, uma música pode ser de repente, você pode tocar num tom maior, de repente você pode experimentar tocar num tom menor, você pode subir um tom e de repente ela ficar mais bonita, Você pode de repente falar, tá muito exagerado aqui, vou fazer ela mais suave, baixar meio tom. E tudo isso são experiências que você grava de novo, e grava de novo, até você chegar. Eu me lembro que Roberto Carlos por exemplo, sendo naturalmente Roberto Carlos, ele tinha uma coisa na hora de gravar, ele gravava música em três tons diferentes para depois escolher. Coisa que não daria nunca pra gente fazer num estúdio porque é tempo. tempo e taxímetro, a hora era cara. Mas aí naturalmente por ser Roberto tinha essa condição de fazer quantas vezes quisesse, quantos meses quisesse, e fazia. E hoje você está dentro de casa, vou cantar a música, deixa eu ver. sabe, o cara as vezes quer tocar no tom que ele acha melhor de tocar com instrumento e não no tom que é melhor dele cantar. Então a tecnologia é muito favorável, nós temos cosias muito boas, mas você precisa usar a tecnologia para justamente tirar o melhor de você e não simplesmente consertar o pior que você faz. As pessoas hoje em dia fazem de qualquer jeito e querem gastar o tempo consertando. Porque você não estuda um instrumento, porque você não mergulha no próprio software de gravação, para tirar o melhor, para que aquele som seja incrível. Sempre falo isso pro pessoal. Ah, você terminou de fazer sua música, você está contente com ela? Pega ela agora e quando terminar de tocar a música na rádio, põe a sua para tocar. E compara. Se você sentir que ela está muito aquém do que está tocando, pô, volta pra prancheta porque você tem que melhorar essa canção. Seja na estrutura dela, seja na letra que você está fazendo, no som que você tirou, você tem que melhorar. E não simplesmente lancei minha música. Aí cara vai ser exatamente aquilo, uma agulha num palheiro para que algumas pessoas, seus amigos, te elogiem e ninguém conheça exatamente.

Como foi depois de tanto tempo de carreira encarar a Pedreira Paulo Leminski pela primeira vez?

Bruno: Um sonho antigo, um sonho realizado, nós há muitos anos queríamos fazer isso. Sem dúvida hoje foi o show mais importante da nossa história aqui em Curitiba, fizemos shows antológicos aqui em várias casas como o Aeroanta, Coração Melão, fizemos no Teatro Positivo, shows muito legais. Mas a gente queria ter essa sensação, de tocar para um número tão grande de pessoas em que de repente aquela coisa de gostar do Biquíni Cavadão, que deixasse de ser uma coisa assim, ah eu gosto, pra ficha cair ao mesmo tempo em todo mundo. E foi isso que a gente conseguiu hoje. A gente conseguiu dar o recado para todo mundo, e todo mundo vai sair daqui hoje com uma impressão muito positiva de um show que as vezes um falou ah legal, mas quando todo mundo vê ao mesmo tempo, é uma outra história, e a gente ficou muito contente, foi um show histórico para o Biquíni aqui em Curitiba, e a gente começa a escrever a partir de hoje uma história melhor ainda, que venham os próximos shows aqui pra gente fazer mais festa ainda.

Fotografia: Angela Missawa.

E como que rolou esse mosh? Você falou ‘vou pra galera’ e foi?

Bruno: Eu já dei muito mosh, eu gosto de dar. Mas a diferença é a seguinte, ao contrário de várias pessoas, eu acredito. Eu vou lá e confio naquela galera, eles não vão me deixar cair. Normalmente eu subo em cima da grade e me seguro com alguma mão, para dar o mosh. Mas dessa vez eu estava indo e assim, cara, não vou conseguir subir, eu não to tendo apoio. Ah, então vai agora. Eu cai de frente, aí eu tinha que virar de costas, e o pessoal começou a me levar. Nunca me machuquei. E é rock. A sensação maravilhosa de estar nos braços da galera mesmo, literalmente. Se você estabelece uma relação com o público de confiança, ninguém vai te fazer mal e vai entrar na brincadeira e vai ser tudo legal. O que esse público fez hoje foi incrível.

Quer saber como foi o show do Biquíni Cavadão na Prime Rock Brasil? Veja aqui.

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