Falar do álbum “Antes do Fim”, patrimônio do Metal Nacional que no mês de abril completou trinta anos de lançamento, não é apenas levantar considerações sobre um registro que teve uma produção mais “aventureira” do que profissional. É mergulhar na própria história do Heavy Metal brasileiro e entender como esse estilo se uniu ao Hardcore.
O disco de estreia da Dorsal Atlântica representa, entre outras coisas, o sentimento radical que muitos headbangers cultivavam numa era de transição da política brasileira. A banda formada por Carlos “Vândalo” Lopes (guitarra e vocal), seu irmão Cláudio “Cro-Magnon” Lopes (baixo) e Toninho “Hardcore” (bateria) alcançou status de respeito em um cenário underground que engatinhava para um objetivo, tendo influenciado nomes como Korzus (que no mesmo ano lançava o seu “Ao Vivo”) e Sepultura (que também soltava o seu “Morbid Visions”), só para citar alguns.
Em entrevista concedida para o nosso site, em outubro de 2015, o próprio Carlos Lopes definia o álbum: “Não tenho muitas memórias, nem mesmo emocionais desse período. E nem sou a mesma pessoa. Ainda bem. Compreendo que seja, até hoje, inominável a importância desse LP de 1986 (gestado em 1985) para a cena nacional, e a latina, pois foi um dos primeiros discos realmente radicais, conectados à cultura underground da época”.
“Antes do Fim” foi gravado em três dias (entre 23 e 25 de abril de 1986) no Rio de Janeiro e lançado em São Paulo pela extinta gravadora “Lunário Perpétuo” que, nove meses antes, lançava outro ícone do Heavy Metal brasileiro, o “Live!” do Vulcano.
Muito à frente do seu tempo, canções politizadas como “HTLV-3”, “Vorkuta” e “Joseph Mengele” se adequavam tanto à proposta Heavy Metal, pela estética que a banda apresentava e riffs selvagens, quanto agradava aos adeptos do Hardcore que, na época, eram muito voltados ao movimento Punk. Naqueles dias, o radicalismo que hoje sob um olhar mais analítico, podemos defini-lo como uma fase “romântica” e até “inocente”, era alimentado musicalmente por canções como “Morte Aos Falsos” e “Álcool”, com suas várias interpretações. “Guerrilha”, para muitos, é o destaque máximo de “Antes do Fim”. Com uma mensagem libertária, esta música se tornou um hino para o Heavy Metal brasileiro por todas as gerações.
A história da capa é um tanto curiosa. Nela, figuraria a foto de dois corpos em decomposição, os mesmos que estão no álbum “Antes do Fim, Depois do Fim” (2005), que nada mais é que uma releitura do álbum original. Inseguros das vendas, os produtores não concordaram com sua utilização, foi então que resolveram fotografar o desenho da camiseta de Carlos que ele próprio havia pintado e utilizá-lo como capa.
O sucesso no meio underground era inevitável, o disco chegou à marca de três mil cópias vendidas, porém há indícios de que foram prensados mais de dez mil LPs. A falta de recursos que imperava à época em nada atrapalhou o caminho que este álbum teria que pavimentar. Os primeiros frutos vieram ainda em 1986 com sua entrada em listas de melhores do ano e shows por RJ, SP e BH, inclusive abrindo para o Venom e Exciter no Maracanãzinho (RJ). Saudemos esse grande marco que acaba de fechar três décadas de existência!
*Texto adaptado da resenha original do autor publicada em seu Facebook.