Burnkill: “interessante e até promissor”

Quem anda antenado no que a cena brasileira tem oferecido nos últimos anos, certamente percebeu que, além do aumento do número de bandas se lançando no mercado, também cresceu a quantidade daquelas que se propõem a cantar no idioma materno. Cada vez mais vem caindo por terra o argumento de que português não combina com o peso do Metal, já que é tudo uma questão de estética composicional. Não existe uma regra sobre como compôr. Cada compositor faz à sua maneira, variando entre primeiro letra e depois instrumental, ou o inverso, ou ambos ao mesmo tempo. No entanto, de fato, a arquitetura musical não deve levar em conta apenas a estética instrumental, mas também a linguística – daí o cuidado que se deve ter com os idiomas.

* Resenha originalmente publicada por Walker Marques no Warriors Of The Metal.

Nascida em Pouso Alegre, no interior de Minas Gerais, a banda Burnkill é mais uma do rol das que escrever músicas em português. Em atividade desde meados de 2014, o conjunto tem a ambição não apenas de ser mais um no cenário, mas de realmente ter algo a transmitir com suas mensagens musicais. Por isso, garante, através das letras em português, que o público “local” imediato – refiro-me a nível nacional, claro -, entenda suas letras, que versam criticamente sobre problemas sociais, atitudes humanas, incoerências, hipocrisias, e a fatalidade de determinadas escolhas – tudo ao mesmo tempo em que busca fazer um Thrash Metal enraizado, sem, apesar disso, soar genérico. Seu nome provém da inspiração na mistura entre o trecho “first you got to burn, burn, burn in fire” da faixa “Heaven and Hell”, do Black Sabbath, e o nome da canção “Overkill”, do agora extinto Motörhead.

Assaborando sua musicalidade, que ainda está nos primeiros anos de estrada, as influências de bandas como Claustrofobia, Sepultura, Dorsal Atlântica, Sarcófago, Sodom, entre outras podem ser de alguma forma sentidas. São referências pontuais dos mineiros, que procuram executar uma sonoridade que estabeleça maior coerência com sua própria personalidade.

Atualmente configurado como um quinteto composto por Antony Damien no vocal, Lucas Maia e Pablo Henrique nas guitarras, Jorge Luiz no baixo e Anderson de Lima nas baquetas, o Burnkill lançou em 2016 seu primeiro trabalho: o álbum “Guerra e Destruição”. O trabalho foi produzido no Rota 976 Studio e vem sendo distribuído pela assessoria de imprensa Roadie Metal.

Burnkill - Guerra e Destruição (2016)

Desde o primeiro momento, o que já imediatamente chama a atenção na obra é a questão da produção, que esbarra em claras limitações técnicas. Ela é suja e fraca, provocando aquela sensação incômoda de abafamento e embaralhamento das linhas instrumentais. É evidente que uma produção de ponta tem altos custos, o que acaba não se tornando alcançável para toda e qualquer banda. Ainda assim, uma de qualidade mais fraca não deixa de ser um ponto negativo, pois atrapalha a degustação. No entanto – como já deve ter acontecido com muitos -, no decorrer do trabalho, é possível se acostumar com o que a banda tema a oferecer nesses quesitos técnicos, e a atenção se finca melhor no que está sendo feito.

Apesar do criticável cartão de visitas da produção, o que os mineiros fazem ao longo de meia-hora de música é interessante e até promissor. Eles apresentam uma sonoridade calcada no Thrash Metal ao estilo Sepultura e Claustrofobia – coerente com suas influências -, com riffs muito bem arquitetados desde os efeitos sentimentais que as notas provocam até o ritmo em que são tocados. Uma das mais notáveis é a própria faixa-título, que tem alavancadas na base que aludem ao apocalipse que é a guerra e a destruição, como sugere o nome.

Embora apresente predominância do bem tocado Thrash Metal, a banda também não deixa de demonstrar, com bastante naturalidade, enviesamentos para outros estilos compatíveis, como o Heavy Metal tradicional e o Death Metal. Esse último pode ser melhor percebido já na primeira faixa, “Corredor da Morte”, que é mais pesada e o vocal de Antony Damien é mais puxado para o gutural fechado do que para o vocal raivoso e driveado, a caráter de Max Cavalera. Quanto ao Heavy Metal, ele não aparece como predominante, mas como anexo, deixando que suas nuances sejam percebidas ali e acolá ao longo do disco.

Se letras em português geralmente são um problema para alguns ouvintes, no caso do Burnkill, não há por que pegar no pé em relação a isso. Tal fato se deve por questões que se misturam entre o positivo e o negativo: no positivo, porque a maioria das músicas parecem ter sido compostas em torno da fonética do português, auxiliando na naturalidade delas; no negativo, porque, em outras, a produção e a própria pronúncia, combinados, não são tão compreensíveis, afastando o ouvinte, quando distraído, da percepção de que são de fato letras em português.

“Guerra e Destruição” é composto por oito faixas, mas a última, “Sinfonia da Guerra”, foi gravada ao vivo e incluída mesmo assim.

Ainda assim, em um olhar geral, “Guerra e Destruição” é um ótimo pontapé inicial para a banda, que provavelmente trará algo ainda mais maduro e desenvolvido no próximo trabalho. Enquanto esse debut não receber uma remasterização (se receber um dia), seu potencial continuará eclipsado para o público mais exigente com esse tipo de coisa.

Formação:
Antony Damien (vocal);
Lucas Maia (guitarra);
Pablo Henrique (guitarra);
Jorge Luiz (baixo);
Anderson de Lima (bateria).

Faixas:
01 – Corredor da Morte
02 – Vivendo Uma Ilusão
03 – Guerra e Destruição
04 – Repressão
05 – Cadáver do Brasil
06 – Tempestade de Horror
07 – Chega de Mentiras
08 – Sinfonia da Guerra (Ao Vivo)

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