Uma ascensão meteórica no mundo da música, uma carreira curta ao lado de uma das bandas mais importantes do rock mundial, e uma morte fatídica, mas um legado perpetuado, assim foi a jornada de vida de Ronald Belford Scott, filho de Charles e Isabelle, ou para nós, o eterno Bon Scott, o cantor, compositor e instrumentista escocês de Forfar nascido em 9 de julho de 1946 e que hoje completa 40 anos desde seu falecimento em 19 de fevereiro de 1980.

Scott no colo de sua mãe Isabelle em Kirriemuir, julho de 1947.

A morte de Scott se tornou como outros ícones da música uma lenda diante dos 33 anos e acumulou rumores e histórias contraditórias ao longo dos anos mas o que está além dos entusiastas é algo que precisa ser analisado mais profundamente e hoje nós voltamos ao passado para relembrar vida e morte deste que teve a imagem imortalizada ao lado da banda AC/DC.

High Street, Kirriemuir, no final da década de 1940.

Apesar de Scott ter nascido na Escócia e ter passado os primeiros anos de sua vida em Kirriemuir, aos seis anos de idade e ele e sua família se mudaram para Melbourne na Austrália, se estabelecendo posteriormente em Fremantle, na Austrália Ocidental, quatro anos depois. Foi lá que Scott formou sua primeira banda, The Spektors, uma mescla forte de beat pop e rock ‘n’ roll onde ele ocupou a bateria e ocasionalmente o vocal, o que o levou a apresentações com a banda pop The Valentines e em seguida com a banda de rock de Sydney, Fraternity, antes que ele pudesse enfim substituir Dave Evans no AC/DC depois de uma carreira de pouco mais de um ano.

Na frente de sua primeira banda, The Spektors, em 1965.

Na época Evans foi considerado pelos irmãos Young como um vocalista muito glam rocker, algo que o assemelhava a Gary Glitter e para a banda não era o objetivo esperado. Naquela altura o AC/DC já tinha assinado contrato com a Albert Productions e vários baixistas e bateristas já haviam passado pela banda durante 1974, além disso o fato de Evans não possuir um bom relacionamento com Dennis Laughlin contribuiu negativamente para a sua saída.

Scott já era um vocalista experiente e estava muito interessado em assumir os vocais do AC/DC, fato que ocorreu em setembro daquele ano, algo que foi facilitado por sua amizade com George Young, e assim em janeiro de 1975 o álbum High Voltage foi lançado na Austrália.

Onde a água brilha no porto, na ponte e na Ópera, Sydney é uma das cidades mais bonitas dos cartões postais do mundo, mas a realidade diária para a maioria dos moradores era uma enorme expansão suburbana insana e rastejando pela Parramatta Road em uma neblina de monóxido de carbono você se depara com a vista sombria de tijolos que é o temido subúrbio ocidental de Sydney, antigamente comumente criticado como um terreno baldio cultural, mas onde é preciso considerar o oeste da cidade como a primeira linguagem artística dos subúrbios, e os subúrbios ocidentais de Sydney têm uma longa e impressionante tradição no rock’n’roll, foi lá que o AC/DC se desenvolveu e expandiu e com a formação estabelecida com Bon Scott nos vocais, Mark Evans no baixo e Phil Rudd na bateria a banda dos irmãos Young decolou naquele ano após o lançamento do single “It’s a Long Way to the Top (If You Wanna Rock ‘n’ Roll)” que se tornou rapidamente um hino e os fez chegar em 1976 ao contrato com a Atlantic Records e a turnê na Europa abrindo shows do Black Sabbath, Aerosmith, Kiss, Styx e Blue Öyster Cult, além de tocando ao lado do Cheap Trick.

https://youtu.be/-sUXMzkh-jI

Bon Scott lançou sete álbuns ao lado do AC/DC, falecendo logo após o lançamento de Highway to Hell que explodiu sua fama a nível mundial.

O que muitas pessoas não perceberam era Scott era um cantor de R&B altamente influenciado por Sam Moore do Sam & Dave e foi exatamente assim que seu humor explícito e debochado anexou veias vibrantes ao AC/DC e sua química perfeita com os irmãos Young era tão boa quanto Keith Richards e Mick Jagger, você sabia disso? Eles eram ameaçadores e engraçados, tanto quanto qualquer outra coisa que você pudesse ver na época, e você provavelmente nunca saberia se eles estavam rindo com você ou de você.
Angry Anderson, o agressivo vocalista de cabeça raspada da lendária banda australiana Rose Tattoo comentou certa vez:
“Scott era um cigano, um vagabundo, um bucaneiro, um garoto mau e um bandido do rock’n’roll. Ele era verdadeiramente um poeta de rua, documentando em letras e performances tudo o que pensava, sentia e se importava sobre a vida. Ele foi o único outro cantor que eu já convidei para cantar com a minha banda sempre que quisesse.” relato de Anderson na época da morte de Scott.

A partir daqui todos os relatos e fatos sobre sua morte são controversos e sempre levantaram muitas dúvidas. Scott teria decidido permanecer em Londres por alguns dias para rever amigos após a turnê de divulgação do álbum Highway to Hell, e com uma típica noite de bebedeira na noite de 18 de fevereiro de 1980 e alguns drinques a mais no clube noturno Music Machine com o amigo Alistair Kinnear a dupla decidiu seguir para Ashby Court, onde Scott vivia na época, mas com as tentativas de acordar o amigo embriagado e levá-lo para a cama tendo fracassado Kinnear decidiu seguir em frente, dirigindo para o próprio apartamento onde uma nova tentativa foi feita sem sucesso e não houve mais opções além de deixá-lo dormir no banco de trás daquele pequeno Renault na Overhill Road, uma estrada localizada em East Dulwich.
Infelizmente ao voltar no dia seguinte Kinnear encontrou Scott morto, praticamente congelado naquele pequeno espaço. O amigo ainda o levou as pressas para o Kings College Hospital, em Camberwell, mas o músico foi declarado oficialmente sem vida e posteriormente recebendo o laudo do atestado de óbito como morte por intoxicação alcoólica aguda, causada por desventura ou desgraça mas não atribuída a drogas, sendo que os jornais da época noticiaram a morte como sendo atribuída a um sufocamento pelo próprio vômito e a baixa temperatura da madrugada que teriam afetado as constantes crises de asma de Scott e colaborado para a tragédia daquela noite.
Kinnear supostamente um possível músico, aparentemente um baixista, desapareceu alguns dias depois, e seu apartamento em East Dulwich foi saqueado por pessoas desconhecidas. Kinnear nunca mais foi ouvido.
Muito se falou sobre o papel da banda britânica UFO nos eventos que antecederam a morte de Scott. De fato, alguns relatos sugerem que na noite em que ele morreu Scott pretendia se encontrar com o vocalista da banda Phil Mogg e o baixista Pete Way no Music Machine. Alguns jornalistas até mencionaram sobre o empresário do AC/DC na época, Peter Mensch, chegando ao ponto de criticar o estilo de vida festeiro do UFO e lamentando a influência negativa que tiveram sobre Scott.

Pete Way e Paul Chapman com UFO em 1980.

A revista Classic Rock chegou a falar extensivamente com Pete Way e o ex-guitarrista do UFO Paul Chapman para entender a morte de Scott. Chapman, por exemplo, tem uma história intrigante para contar, que se choca com a versão dos acontecimentos trágicos biógrafados sobre o músico. De fato, as memórias da dupla de músicos do UFO se diferem substancialmente de muitos relatórios publicados anteriormente. E, embora deva-se lembrar que Way e Chapman eram usuários de heroína no início dos anos 80 e que seus testemunhos podem não ser confiáveis, suas lembranças para a Classic Rock soaram pelo menos tão credíveis quanto qualquer outra.
Devemos mencionar aqui que é improvável que Way e Chapman tenham falado recentemente para correlacionar ou colaborar com suas histórias de uma forma negativa, muitos queriam ouvi -los e a Classic Rock estava em um “projeto” falando sobre Scott e o ponto era a famosa foto tirada por Ross Halfin, de Way posando com Bon Scott nos bastidores de um show do UFO no Hammersmith Odeon (hoje Apollo) em fevereiro de 1980. Esta foi a última foto tirada de Bon antes de sua morte.

Pete Way e Bon Scott, foto de Ross Halfin

A dupla relembrou carinhosamente sobre como conheceram Scott e o primeiro encontro com o AC/DC que os levou mais tarde a vários meses de turnê juntos pelos Estados Unidos.
Way ficou impressionado com Bon Scott como vocalista: “Ele foi fantástico”, ele engasga. “Você sabe de quem Bon me lembra? Alex Harvey. Eu sou um grande fã de Alex Harvey – Faith Healer é isso. É a mesma coisa, Bon teve a mesma atitude. Sensacional. Talvez em um filme você possa criar um Bon, mas não pode criar um Bon na vida real. Bon se criou sozinho.” declarou a Classic Rock.
Sem ser solicitado, Way aborda o assunto da morte de Bon Scott: “Ainda estou vivo, Bon não está. Não estou dizendo que o estilo de vida dele deve ser endossado ou recomendado, mas você deve dizer que certas pessoas viviam em um mundo diferente ou criaram um mundo diferente. Você escreve filmes sobre pessoas como Bon Scott.”
Voltamos às lembranças daquela fotografia de Way e Bon nos bastidores do Hammersmith Odeon em fevereiro de 1980. Way continua: “Agora nós, como UFO, estávamos usando substâncias, certo?  Estávamos usando heroína depois do show. Eu tenho que ter muito cuidado aqui. Um dos caras que estava trazendo para nós era o australiano, e ele veio com o Bon. E, você sabe, se você usa cocaína e beber, pode ter uma reação violenta. Mas se você nunca usou heroína antes e nós estávamos usando heroína depois do show, como sempre fizemos, e você bebe, as chances são de que em algum momento você adormecerá, engasgará e morrerá.”
Rania Habal da Society for Academic Emergency Medicine, coloca os comentários de Way em contexto:
“O álcool é um co-ingestor muito comum em overdoses de heroína”, comenta. “Além disso, uma overdose fatal de heroína é quase sempre causada por parada respiratória.”
Então Way se lembra de Scott saindo com um traficante de heroína na época. Você chegaria ao ponto de dizer que Scott estava dando uns “tapas”(referência ao uso de heroína) nos bastidores do UFO? Perguntou o jornalista da Classic Rock:
“Eu realmente não sei”, Way encolhe os ombros, “mas você geralmente conhece os sintomas, porque estávamos dando uns tapas e Bon estava lá… e ele bebeu muito. Mas…você sabe, muitas pessoas bebem muito, mas elas bebem, vomitam e vivem para contar a história.”

Quem foi o australiano que chegou com Bon? “Joe Silver ou quem quer que fosse, bem, ele tinha nomes diferentes. Muitos nomes diferentes. Olha, algumas pessoas vendem drogas, você não pode fazer julgamentos contra eles…ele era um cara legal. Por exemplo, se alguém morre em um acidente de carro porque ficou bêbado em um bar você não pode culpar o barman. Só porque alguém tem cocaína ou heroína ou algo assim e o leva a seus amigos…você não pode apontar o dedo para alguém que esteja vivendo uma vida em excesso, e infelizmente acho que é o que provavelmente aconteceu…se você não é habilidoso na arte da heroína, então dança com o diabo…”
“Recebi um telefonema”, relata Way. Paul Chapman (então guitarrista do UFO) ligou e disse:
“Pete, Bon acabou de morrer. As pessoas, a polícia ou quem quer que seja, precisam contar à banda”. “Eu tinha os números da casa de Angus e Malcolm. Ele então pensou em não deixar Angus saber, Malcolm era a pessoa a contar primeiro. Então eu dei o número de Paul Chapman a Malcolm. Eu me dei muito bem com eles então tinha o número de onde eles estavam em Londres, e eu realmente não queria passar o número para Chapman, porque era bem cedo pela manhã quando recebi o telefonema”.

Foto de divulgação

Aqui é onde a versão popularmente aceita da história de Bon Scott faz um grande desvio. Para recapitular: Alistair Kinnear disse que descobriu o corpo de Bon em seu carro às 19h45 da noite de terça-feira, 19 de fevereiro. Pete Way diz que foi informado sobre a morte de Scott na manhã de terça-feira. Então o que aconteceu? Como Paul Chapman soube tão cedo que Scott havia morrido?
Way: “Bem… (tosse) você sabe…(voz baixa). Mas você sabe, algumas pessoas dormem e se engasgam no carro. Paul provavelmente…eu tenho que ter muito cuidado aqui novamente. O Paul é uma daquelas pessoas que pode tomar quantas bebidas você quiser e usar quantas drogas quiser. Lembre-se, costumávamos chamá-lo de Tonka. Mas sim, foi ele quem me ligou de manhã cedo para dizer ‘Você pode me dar um dos números da banda, porque Bon está morto’, então eu provavelmente sabia antes de todos. Mas não conheço a situação real.”
Way acrescenta: “Com Scott não havia limites, então realmente e verdadeiramente, você não sabe, não é? Isso pode acontecer com qualquer um de nós. Hoje em dia sou mais velho e talvez mais sábio, porque vou tomar alguns drinques ou o que quer que seja, e uma noite eu devo tomar um pouco de coca. Mas pelo menos eu sou mais velho e mais sábio, às vezes você é jovem e não é tão sábio.”
Chapman está convencido de que ele foi uma das últimas pessoas a ver Scott vivo. O biógrafo de Scott, Clinton Walker, admitiu que nunca entrevistou Chapman para seu livro, explicando por que o relato completo nunca havia surgido até agora: “Eu nunca falei com Chapman”, disse Walker a Classic Rock, “mas nas entrevistas com ele eu li, ele não lança uma luz sobre a história e eu até duvido de suas reivindicações de proximidade. Por isso, fiquei contente em falar com as pessoas que viram Bon naquele último dia, sua então namorada Anna Baba, sua ex namorada Silver Smith e ‘Alistair Kinnear’”. (As citações de “Alistair Kinnear” são de Walker.)
Seja como for a Classic Rock perguntou a Chapman diretamente sobre seu telefonema matutino para Pete Way e seu pedido pelos números de telefone de Angus e Malcolm Young para que eles pudessem ser informados da morte de Scott.
“Vou lhe dizer exatamente o que aconteceu”, responde Chapman ansiosamente. “Nós(UFO) estávamos tocando no Hammersmith, e Bon chegou, foi na segunda ou terceira de nossas noites lá. O cara que estava com Bon naquela noite era alguém chamado Joe Bloe, um cara australiano. Ele mudou seu nome para Joe King, mas seu nome verdadeiro era Joe Bloe.”
Chapman continua: “Joe costumava trabalhar para mim, ele era meu técnico de guitarra por cerca de seis meses. Lembro-me de como conheci Joe. Havia um apartamento em Hammersmith, era o lugar de Joe, e entre os caras havia um traficante de drogas e eu costumava ir lá. Joe estava saindo com alguém chamada Silver Smith (ex-namorada de Bon Scott). Silver Smith e Joe King, nomes engraçados, você sabe.” (No livro de Bon Scott, de Clinton Walker, também há um personagem chamado ‘Joe Furey’ com conexões com a banda UFO.)
Chapman volta ao assunto em questão: “De qualquer forma, Joe acabou trabalhando para mim por um bom tempo, embora não estivesse quando a coisa com Scott aconteceu. Então, alguns dias após nossos shows no Hammersmith, pouco antes de Scott morrer, eu me encontrei novamente com Joe e Scott e disse ‘Por que você não volta para minha casa?’, eu morava em Fulham, perto da Wandsworth Bridge Road. Eu podia olhar pela janela e ver a cervejaria de Young de um lado e a fábrica de gim Gordon do outro. Um lugar perfeito para morar. Eu disse a Joe e Scott ‘Por que você não me visita?’ Joe disse: “Ainda não tivemos o suficiente”. E nesse ponto Bon saiu.”
Os eventos acima provavelmente ocorreram durante a tarde ou o início da noite de segunda-feira, 18 de fevereiro.
Chapman acrescenta: “Na verdade, ele (Scott) ia ter um pouco mais de atenção de nós mas Scott nunca apareceu. Ele nunca voltou ao meu apartamento. Depois de um longo tempo de espera, lembro-me de Joe dizendo: ‘preciso voltar para casa’. Joe e Scott haviam alugado um lugar para morar em Bayswater ou em algum lugar assim, não me lembro bem onde.” (Chapman provavelmente se refere ao apartamento de Scott em Victoria.)
Então, Joe King e Bon Scott estavam morando juntos nesse momento? Insistiu a Classic Rock.
“Sim”, afirma Chapman, “Joe era tipo o cuidador de Scott.”
Aqui é onde o fator de diferença de horário entra em ação. Kinnear alegou que as 19h45 da noite ele descobriu o cadáver de Bon Scott, na terça-feira, 19 de fevereiro, mas a dupla de músicos do UFO contrasta fortemente com a lembrança de Chapman sobre a morte do cantor na manhã daquele dia.
Após a saída de Joe King da casa Chapman voltou para o andar de cima: “Eu não tinha muitos móveis, havia almofadas no chão e adormeci nelas. Às 10 ou 11 horas da manhã, o telefone toca, era o Joe. Ele diz ‘Você está sentado?’, ‘Estou deitado, onde você me deixou’. Ele diz ‘Eu tenho más notícias. Bon está morto.'”
A linha telefônica ficou em silêncio: “Então ouvi Joe chorando. Ele estava perdido. Eu sabia que Pete tinha os números do AC/DC, Joe não tinha o número de mais ninguém na banda.  Joe estava de volta a esse lugar que dividia com Bon no centro de Londres. Era de onde ele estava ligando. Ele estava esperando Scott voltar para casa, porque obviamente Scott não voltou para minha casa em Fulham.”

De qualquer forma existem muitas versões contraditórias diante da morte de Bon Scott, algumas inclusive incluíram sua namorada e ex namorada no ocorrido, além disso outras fontes e personagens foram citados mas nunca com veracidade suficiente para ser confirmada. Uma coisa é fato, os rapazes do AC/DC foram os mais afetados pela morte de Scott, muitos relataram a angústia e tristeza que seguiu a banda mas os anos seguintes cobriram os fatos e sepultaram com o músico sua história pessoal mais caótica mantendo apenas seus gloriosos anos a frente do AC/DC.
E você, qual a sua opinião? Conte para nós.

Fonte de pesquisa: Louder|Classic Rock Magazine

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