Aria: bravura e resistência da Fênix do Metal russo (parte II)

Vladimir Holstinin entrou em contato com seu amigo dos tempos de faculdade e de Volshebnie Sumerki, Vitaly Dubinin, para ocupar o posto de baixista. Maxim Udalov chegou para sentar no banco da bateria. Para formar a dupla de ataque com Holstinin, chegou o virtuoso guitarrista Sergey Mavrin.

Com esta formação renovada, o Aria entra em estúdio para registrar aquele que é considerado seu maior clássico, “Geroy Asfalta” (Herói do Asfalto), lançado em 1987. O álbum, o primeiro via gravadora estatal Melodiya, conta com seis músicas, sendo quatro assinadas por Vitaly Dubinin, mostrando que o baixista chegou ao Aria para ser o novo compositor principal. O disco abre com “Na Sluzhbe Sily Zla” (Servindo às Forças do Mal), um arrasa-quarteirão que remete o ouvinte à “Aces High”, do Iron Maiden. Alternam-se na execução do álbum ritmos cavalgados, momentos cadenciados, emotivos e épicos. A última faixa, “Ballada o Drevnerusskom Voine” (Balada Sobre Um Antigo Guerreiro Russo), é um épico que todo fã de Heavy Metal tem a obrigação de ouvir.

Vitaly Dubinin: a salvação após o desastre
Vitaly Dubinin: a salvação após o desastre

Note-se aqui a importância dos novos integrantes. Dubinin se trata de um baixista deveras técnico e de mão-direita pesada, lembrando demasiadamente o estilo de Steve Harris, além de ser um exímio compositor e cantor. Sergey Mavrin, atualmente considerado o melhor guitarrista do país dos czares, fez expandir as possibilidades de composição do Aria por ser um músico, digamos, ousado. Mavrin possui um estilo bastante peculiar em se tratando de solos: costuma fazer arpejos velocíssimos usando os quatro dedos da mão direita enquanto segura o braço da guitarra com a esquerda. Simplesmente assombroso. Destaque também para Valery Kipelov, que aqui já atingiu seu ápice em interpretação e técnica vocal. Um clipe foi gravado para a faixa 5 do álbum, “Ulitsa Roz” (Rua de Rosas).

O Aria estava de volta com força total. Seguiu-se uma turnê “sold-out” de 1987 até 1988 pela claudicante União Soviética. Fizeram também seu primeiro show em terras estrangeiras, em Berlim, Alemanha, logo após a derrubada do mítico muro que levava o nome desta cidade. Foi neste período que a imprensa especializada começou a chamar o Aria pelo famoso vulgo de “Iron Maiden russo”, tamanha a semelhança entre as estruturas musicais da banda russa e da britânica.

Todavia, como muito dinheiro sempre traz problema, houve uma conturbada troca de empresários. O clima pesado não estava agradando o baterista Maxim Udalov, que resolve deixar o Aria. Para o seu lugar foi efetivado Alexsander Maniyakin. O antigo empresário, Viktor Vekshteyn, ainda tentou, em vão, garantir para si o nome “Aria”. De gerente novo, a banda prepara um novo material para o seu quarto álbum. Apesar do momento inquieto nos bastidores, o Aria grava e lança mais um clássico de sua discografia. Em 1988, sai “Igra s Ognom” (Brincando com Fogo). Com a entrada do baterista Maniyakin, estava fechada a chamada “Formação de Ouro” do Aria, que durou de 1989 a 1995 e que gravou os maiores clássicos do Heavy Metal russo.

https://www.youtube.com/watch?v=fJ3KEsWQ4Bk

A produção, que deixou a sonoridade de “Igra s Ognom” um pouco mais suja que a de “Geroy Asfalta”, fez as músicas soarem ainda mais pesadas. Repetindo a fórmula consagrada de mesclar músicas rápidas, cadenciadas, cavalgadas e uma balada, o quarto álbum do Aria conquistou lugar de destaque na discografia da banda russa. A faixa-título, um épico de 9 minutos, conta uma história sobre um violinista que faz um pacto com o Demônio, semelhantemente às lendas que cercam a trajetória do violinista italiano Nicollo Paganini. O riff inicial, inclusive, é um trecho do “Capriccio nº 24”, de autoria de Paganini. Mas uma música deste álbum, em particular, não pode passar batida de um comentário: a faixa nº 2, “Raskachayem Etot Mir” (Vamos Sacudir Este Mundo), é de fazer cair o queixo, tamanha a semelhança com “Revelations”, daquele sexteto inglês.

Mas, para variar, a banda atravessou mais um momento ruim. Começo dos anos 90. Quem tem um pouco de estudo em História sabe que neste período a União Soviética entrou em bancarrota. Uma grave crise financeira cometeu aquele gigante país, e o Aria foi afetado. Devido aos prejuízos acumulados e a queda no número de concertos, a banda acha por bem dar uma pausa temporária. Vladimir Holstinin começa a se virar dirigindo táxi, e Valery Kipelov trabalhou até como vigilante. Sergey Mavrin e Vitaly Dubinin se mudam para Munique, Alemanha, para trabalhar em uma banda local chamada Lion Heart. Quando os dois viram que a coisa não ia dar lucro, voltaram para a Rússia na primeira oportunidade que tiveram.

manyakin
Alexsander Manyakin: não, não é Nicko McBrain

Quando a tsunami passou e as marés financeiras acalmaram, o grupo se reuniu novamente para registrar o quinto álbum de estúdio, “Krov Za Krov”, que foi lançado em 1991 via Sintez Records. Seguindo o mesmo caminho adotado nos dois últimos álbuns, o Aria lança mais um excelente trabalho, onde o talento técnico dos músicos e o de composição de Dubinin (que assina sete das oito faixas), superaram as dificuldades burocráticas.

1989
Sergey Mavrin, Valery Kipelov, Vladimir Holstinin, Alexsander Manyakin e Vitaly Dubinin

Apesar de ser similar ao álbum anterior, em “Krov Za Krov” o Aria começa a apostar em novos experimentos sonoros, como músicas atmosféricas e ritmos quebrados. Vide a faixa 3, “Antikhrist” (Anticristo). Destaques também para a faixa-título, a música nº 6, “Besy” (Possesso) e a semi-balada “Vso, chto bylo” (Tudo o que Foi).

Detalhe: há o registro de pelo menos uma balada em cada full-length lançado pelo Aria. Este departamento era de responsabilidade de Valery Kipelov, ora sozinho, ora assinando com Dubinin. Apesar de carregarem o estigma de “Iron Maiden russo”, tais peculiaridades atestam a identidade sonora da banda oriunda de Moscou.

Mas toda desgraça é pouca na história do Aria. Com o retorno da rotina normal de shows, o grupo entrou em nova turnê, incluindo sete datas na Alemanha. Devido a falha dos organizadores da perna germânica da tour, o Aria novamente se viu em prejuízo. O vocalista Valery Kipelov foi quem se mostrou mais insatisfeito com o novo revés financeiro, o que fez nascer um novo clima de tensão dentro da banda, que culminou com a saída do cantor, que, a reboque, também causou a saída do guitarrista Sergey Mavrin. Este justificou sua saída dizendo que o Aria não faria mais nenhum sucesso sem os timbres únicos de Kipelov. Rapidamente, o Master, a banda do ex-baixista do Aria, Alik Granovsky, catou o vocalista para suas apresentações ao vivo.

Valery, nesta época, já era um cantor renomado na Rússia, e o Aria tinha em sua voz uma de suas principais características. Com sua saída e a do notável guitarrista, o Aria embarcou novamente em grandes embaraços.

Um contrato com uma nova gravadora fez as coisas voltarem aos eixos. Aparentemente.

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