Com força e uma técnica musical fora do comum, a banda Dolores Dolores vem se preparando para o lançamento de seu terceiro álbum de estúdio. Sem revelar maiores detalhes sobre ele, conversamos com o baterista da banda, Alessandro Bagni, em um bate papo franco e direto ele contou sobre a origem da banda, os dois primeiros álbuns, “Songs of Experience” (2011) e “ID SuperPower” (2014), aclamados e reconhecidos como grandes obras do Hard Rock Nacional, suas influências e o que esperar do futuro e seu novo lançamento.
Confira abaixo o bate-papo com o baterista Alessandro Bagni.
RM: Como surgiu a banda Dolores Dolores?
Bagni: Olá, Gleison. Eu, Humberto (guitarrista) e Wille (vocal) nos conhecemos há muito tempo, desde o fim da década de 80. Tínhamos uma banda de composição própria, no início da década de 90, a Doxy, e gostávamos muito do resultado. Infelizmente a banda acabou, fizemos outras coisas, cada um na sua estrada, e pouco depois me mudei para São Paulo. Morei um tempo em São Caetano, frequentava muito o Blackmore e às vezes ia ao Manifesto, duas casas de Rock que eram bem conhecidas em São Paulo. Ficava pensando em como seria diferente e melhor se na época da Doxy estivéssemos inseridos naquele contexto. Pouco antes de voltar para Minas fui a um show do Dream Theater no Credicard Hall. Eles fizeram dois shows lá e no que fui estava totalmente lotado. Olhei aquele público e pensei: Esse é nosso público! Me pareceu que a cena do Rock lá era muito forte, bem mais que a de Belo Horizonte. Isso foi em 2007. A propagação do mercado fonográfico já era via mídias sociais e streaming, e seria totalmente possível atingirmos aquele público e até mesmo divulgarmos fora do Brasil, mesmo estando em BH. Na época não pensei que seria tão difícil quanto tem sido (risos), mas voltando à animação de 2007, quando voltei para BH marquei uma reunião na minha casa, propus a eles retomarmos as composições, e eles toparam na hora. Me lembro até hoje como propus. Disse que era condição sine qua non nós três juntos para que o resultado fosse bom. Procuraríamos um baixista a partir dali. O Humberto sempre compôs com extremo bom gosto e competência, além de ser um exímio guitarrista, e depois nos surpreendeu com seu talento para produção. Wille, além de compor muito bem e com extrema facilidade, tem uma voz maravilhosa que traz identidade e dá liga mesmo interpretando canções totalmente diferentes. Começamos compondo músicas novas e re-arranjamos outras duas da Doxy, que são “Miss Lie” e “Queen of Hearts”. Elas podem ser conferidas no nosso primeiro CD, o “Songs of Experience”.
RM: Quando decidiram retornar em 2007, foram quatro anos para lançarem o primeiro álbum, “Songs of Experience”. Como foi o processo de criação desse álbum e por que ele demorou tanto tempo para ser lançado desde o retorno da banda?
Quanto ao processo de criação, na época o Wille estava estudando a obra do poeta inglês William Blake, que além de poeta também era pintor. Ele estava fascinado pelas poesias e musicou algumas delas, montou um projeto e nos apresentou. Achamos as músicas fantásticas e o conceito também, tanto que usamos a pintura “The Ancient of Days” na capa do CD. A obra do Blake é de domínio público, e no CD que se chama “Songs of Experience” (esse nome é parte do título de uma coleção de poesias ilustradas dele), estão seis músicas cuja letra é do Blake. Das outras seis, três letras foram escritas pelo Wille, outras duas em parceria com um amigo nosso, o Jaguar, e uma foi escrita pelo Leco Strada. No “Songs of Experience” o Wille nos apresentava o esboço das músicas e nós trabalhávamos na harmonia e nos arranjos.
RM: Interessante saber sobre a inspiração na obra de William Blake. Acredito que as letras tenham saído do livro “Songs of Innocence and of Experience” no qual ele apontava a Igreja e a alta sociedade como exploradores dos fracos. O álbum segue a risca esse conceito? E como transformaram uma obra do século XVI em música e com a cara da Dolores Dolores?
Nós nos identificamos com a forma como o Blake questionava o que na época dele todos aceitavam e achavam natural. Ele com certeza foi uma pessoa fora da faixa. O álbum vai nessa linha, não segue receitas. Compusemos músicas em 3X4, 6X8, inserimos valsa nos arranjos, usamos um cravo, enfim, não nos colocamos limites ou padrões e mesmo assim conseguimos gravar um CD coeso, mesmo com músicas bem diferentes umas das outras. Logo depois de comprarmos a ideia do Wille, ele nos apresentou várias poesias musicadas. Escolhemos seis, trabalhamos nas harmonias e nos arranjos e partimos para o estúdio. A identidade vem naturalmente para nós, seja pelas melodias de voz e interpretações do Wille, seja pelo timbre característico e arranjos de guitarra particulares do Humberto, ou pelos meus grooves, frases e como eu tiro o som da bateria. Isto é muito legal, tanto que neste disco misturamos Blake, composições novas e duas outras que resgatamos do Doxy, e mesmo assim ao ouvir todas as faixas percebemos um disco coeso, que tem liga, e que não cansa após a segunda ou terceira música.
RM: Após três anos do lançamento de “Songs of Experience”, você liberaram o álbum “ID SuperPower”. Quais as principais características musicais que diferem uma obra da outra?
(Pensativo) difícil esta (risos). O “Songs” tem o DNA mais progressivo, mais conceitual, com muito teclado e até um Hammond fazendo uma dobradinha com a guitarra do Humberto. Já o “ID” é mais aberto e cru, com baixos em semi-coxeias, guitarras em tom maior, mais para o Hard Rock e Blues Rock. Essas diferenças, em minha opinião, se devem ao conceito. O “Songs” era uma parada bem inglesa e com influência da obra do Blake. Uma onda meio down. Já o “ID”, o conceito era outro, mais americano, mais rasgada e mais baixa, bateria e guitarra. O tema gira em torno de um cara sem noção, vivendo o momento, um porra louca, e para mim é muito legal como a obra se alinha ao contexto.
RM: Aproveitado sua deixa, explique o conceito por trás das composições líricas do álbum “ID SuperPower”.
O “ID”, no conceito deste CD, significa Idiot (Idiota), e não Identity, como normalmente é usado. “ID Superpower”, na nossa leitura, seria Idiota elevado à superpotência. As letras seguem essa linha. Pessoas que fazem coisas estúpidas. Uma ou outra letra foge do tema, como a “Mama Technology” e a “Behind the Hills”, por exemplo.
RM: O segundo álbum sempre envolve maior pressão para o artista. Como foi para vocês, principalmente após lançar um álbum tão bom quanto o de estreia?
Não pensamos nisto, fizemos o “ID” da mesma forma que fizemos o “Songs”, sem fronteiras ou rótulos. No caso do “ID”, também não nos preocupamos em manter a mesma linha do “Songs”, até por que o conceito é diferente.
RM: A banda vem liberando esporadicamente vídeos dos bastidores da gravação do terceiro álbum de estúdio. O que você pode adiantar sobre esse novo álbum?
Temos onze músicas prontas, e decidimos fazer diferente neste CD. Experimentamos gravar duas ao vivo (no estúdio Solo), todos tocando juntos, e gostamos da dinâmica e do resultado. Decidimos assim gravar, mixar e masterizar de duas em duas. Vamos lançar à medida que as músicas ficarem prontas, e desta forma nosso público não ficará tanto tempo sem novidade. Ao finalizar as onze, se forem onze mesmo porquê poderemos com o tempo eliminar ou acrescentar músicas, faremos o CD e lançaremos junto com a última música. Temos um conceito em mente e ele será revelado à medida que as músicas forem lançadas. Quanto aos vídeos, estamos registrando as gravações e soltaremos de três a quatro vídeos mostrando como foram as seções entre os lançamentos das novas canções.
RM: O que de fato altera ao se gravar ao vivo? Isso quer dizer que todo o álbum será gravado nesse formato?
Quando não se grava ao vivo você precisa ser matemático, executar os grooves e frases no tempo, em cima do metrônomo, e isso pode às vezes podar um pouco a interpretação. Um atraso em determinadas situações é muito bem-vindo. E isso é mais fácil quando se toca junto. Sem falar no feeling, você tocar junto e olhar um para o outro faz diferença. Porém, por exemplo, o Humberto está gravando algumas guitarras agora, para substituir na mix das duas músicas que já gravamos. Isso por questão de timbre, apenas para substituir algo que não deixou ele satisfeito nas gravações ao vivo que já fizemos. Portanto, a gravação inicial vai ser ao vivo, mas não significa que utilizaremos 100% destes registros no disco. O álbum não será todo neste formato.
RM: A banda está divulgando alguns vídeos dos bastidores da produção do novo álbum. Uma das músicas que se escuta ao fundo apresenta linhas mais pesadas e densas, remetendo até um pouco ao Doom Metal. Esse álbum será mais pesado que seus antecessores?
A música ao fundo é a “Not to Late”, talvez a mais pesada das músicas que estamos considerando para o álbum. Um ponto muito positivo que vejo é que as composições foram bem diversificadas. O Rodrigo contribuiu bastante com harmonias que ele mandou para o Wille compor a melodia e a letra, e para o Humberto produzir. Eu compus a melodia e a letra de uma das músicas que o Humberto compôs a harmonia e produziu, enfim, esta diversidade esta dando uma cara nova a este álbum. Acredito que vocês vão gostar do resultado.
RM: Para encerrar, gostaria de agradecer pela entrevista e deixo o espaço para que você envie uma mensagem aos leitores do site Roadie Metal.
Quero agradecer a você e à Roadie Metal pelo espaço e por todo o apoio à cena do Rock brasileiro. Agradecer também a todos que têm feito resenhas do nosso trabalho e a todos que nos apoiam curtindo nossos posts, nos seguindo, compartilhando, indo aos nossos shows, mostrando nossos CDs para os amigos, dando feedbacks e nos curtindo. Estamos gostando muito das músicas do novo CD e espero que todos gostem também. Encerro com uma frase que li, cujo autor desconheço que é a seguinte: “Seu artista favorito já foi um artista local. Não espere até que eles façam sucesso para apoia-los”.
Dolores Dolores é formada por:
Humberto Maldonado (guitarra);
Rodrigo Cordeiro (baixo);
Alessandro Bagni (bateria).
Mais informações nos links:
Facebook: https://www.facebook.com/doloresdoloresbanda/
Site Oficial: http://www.doloresdolores.com/