Moonspell tem sido uma banda que me manteve em constante estado de interesse ao longo dos anos. Desde que escutei, há tanto tempo, o clássico “Wolfheart”, e ele entrou de forma definitiva no meu rol dos “discos da vida”, até a recente narração épica do Apocalipse Português em “1755”. Cecil B. DeMille em forma de um álbum de Metal.
O elevado interesse que esse último disco me despertou fez com que eu desse algumas voltas pelas redes sociais da banda e, foi num desses passeios, que descobri a existência dessa biografia, vendida através do site. As biografias de artistas de Rock são um fenômeno ainda recente no mercado editorial brasileiro e que parece sofrer já uma prematura estagnação. Muitos medalhões, com várias obras dedicadas, e uma infinidade de nomes que não deverão jamais chegar até os balcões. Quem tiver fluência na língua inglesa ainda pode ter acesso a um amplo e variado catálogo. Poder, então, ler sobre a carreira de um grupo como o Moonspell e ainda fazê-lo em sua própria língua é uma chance que não pode deixar de ser aproveitada. Como diriam lá do outro lado do Atlântico, muito fixe!
A principal característica dessa biografia é que ela sabe que é uma biografia. O autor, Ricardo S. Amorim, que não deve ser confundido com o guitarrista quase homônimo, Ricardo Amorim, abandona a narrativa em terceira pessoa e se coloca próximo aos fatos, nos momentos cronológicos pertinentes, além de fazer algumas observações pessoais. O livro sempre procura contextualizar, inclusive a si mesmo, explanando os motivos para entrar em determinados assuntos no decorrer de determinadas partes do texto. As influências da banda no começo da carreira não são apenas mencionadas, mas dissecadas e tratadas em longos parágrafos específicos. A respeito desse assunto, mesmo considerando o peso que cada um dos artistas influentes tiveram no desenvolvimento da música do Moonspell, a veneração cedida ao Bathory é um tema para o qual sempre se retorna.
Apesar da maneira como o autor conduz o texto, não se deve crer que o tom seja mais romanceado. Ele é muito jornalístico, imparcial e sincero, não varrendo nada para debaixo do tapete. Cada tensão entre os membros, geradas por discordâncias ou outros motivos, são bem dissecadas e relatadas sob pontos de vistas diversos. A fase criativa de cada disco e a definição de seus conceitos também são bem explorados. Não há nenhuma queima de etapas e existe detalhamento nos comentários sobre o desenvolvimento de algumas canções, além do estado da banda em cada momento, considerados o maior ou menor envolvimento de cada integrante naquele período.
A apresentação não chega a ser luxuosa, mas é muito bem cuidada e encanta a primeira vista. Todo o material fotográfico é em preto-e-branco e o papel da edição é de um tipo mais amarelado, combinando com as cores da capa. Além disso, há ainda um marcador de página e um cartão postal de “1755”.
A tradição portuguesa dentro do Heavy Metal não tem a mesma expressividade de outras nações europeias como Alemanha, Inglaterra ou Suécia. Alcançar o status que o Moonspell obteve demandou muito esforço e talento. Sacrifícios tiveram que ser feitos em benefício da continuidade da banda, mas o que se nota, ao final, é que o grupo remanescente encontrou o exato ponto de equilíbrio entre o profissionalismo e a irmandade. Não há um final onde todos os problemas serão superados ou utopias do tipo, mas há a relação empática entre o todo e cada integrante, objetivando o benefício maior da banda… ou da alcateia.
E os lobos continuam a se mover para o alto da cadeia alimentar.