O nome pode soar tão estranho quanto a música, mas acredito que hoje, quem vive na normalidade, entra numa única trilha de A a B, com um único resultado. Tiros no escuro são bem legais de vez em quando para acertar criaturas desprevenidas e olhar flashes de luzes que apontam oportunidades que você antes pode não ter visto. feed the Freak! é uma banda que veio se tornando super relevante no cenário freak/horror music catarinense, ao lado de nomes como Zombie Cookbook e Viletale. E quando eu digo que você ainda não viu de tudo, tente as vezes cortar expectativas ao escutar essa frase.
O grupo é um power-trio que se formou a alguns anos atrás de maneira oficial, dando as caras “pintadas” aos palcos e encantando alguns bocados de pessoas. Mas o que há de tão bom na banda, produção? Simples:
- O grupo vê a música como uma salada podre de várias vertentes cruas e bem recicláveis, que podem muito bem ser aproveitadas em diversas linhas. O vocal fúnebre e mórbido muitas vezes intercalado com um gutural grave ou rasgado, cria essa mistura e sintonia perturbante. Afinações graves mas sem metal da nova geração. Tudo visto com a mistura do Old-School com diversas pitadas de outros estilos mesclado com a verdadeira face da banda.
- Eles encontraram sua verdadeira identidade em poucos anos de banda. Postura, comunicação visual e musical. A banda se interpreta como os antigos seriais killers de máfia dos tempos 40, 50, usando camisas sociais abarrotadas. suspensórios, calças, sapatos, chapéu de coco e boina, além de uma pintura facial bizarra que vai dificilmente fazer você descobrir quem eles são na (trágica) vida real.
- A banda é uma das muitas que está no ciclo DIY, então aprecie ela de modo diferente. Ela está literalmente rasgando rótulos e trazendo consigo uma nova proposta fixa, definida e aterrorizante. Sem contatos com gravadora (infelizmente). Você, equipamentos de gravação e a banda. E o resultado final é super interessante.
- E a banda tem tudo para dar e não dar certo. Apesar do conjunto ser uma mala pronta, vem de uma cena infeliz e instável no mercado catarinense do Metal/Rock, onde ainda existe o velho consumidor do rock farofa (que traz dinheiro) e do velho metal tradicional que vive encalhado nos 80’s (que traz vergonha).
Então coloque seus fones e aprecie a música da maneira mais conveniente que você encontrar. feed the Freak! vai te trazer uma experiência de arrepiar a barriga. Você pode encontrar o álbum abaixo.
Chega de papo e vamos analisar esse material.
1. B.U.T.C.H.E.R.
Em poucos segundos é possível uma qualidade excepcional de gravação, que sem o histórico dado agora a pouco, de longe seria uma alternativa de gravação D.I.Y. A música é muito bem construído com riffs em palhetada alternada, a melodia mórbida dos vocais e a separação coesa de verso, ponte e refrão. É impressionante a boa execução dos harmônicos, o belo encaixe dos backing vocals para dar ênfase nas partes corretas, o uso de wah-wah que surpreende a primeira vista e pega de surpresa os ouvintes que não esperariam algo assim. A música não tem segredos, mostra sua mensagem e deixa um gostinho do que está por vir em outras faixas. Ela é rápida e de cara merece um “selo Replay” por ser facilmente consumível.
2. Libertine
A música começa crua e num crescendo, levantando sua harmonia. Em seu auge para um verso, é como se misturassem levadas clássicas de rock progressivo com aquela melodia repulsiva. Seus versos são construídas da mesma forma, levando uma ambiência caótica aos ouvidos sempre em seu momento de mais impacto. Não foge da fórmula básica durante dois refrões, apesar de ter mais tardar ter riffs com andamento mais rápido e uma acidez mais forte e coesa num breakdown adiante. Porém é interessante como os versos foram feitos de maneira bem trabalhada com o simples palm muting de notas graves. E devido sua levada cadenciada, ela nunca perde sua essência e termina de forma concreta.
3. Mentorship
Apesar de aparentar trazer uma levada também devagar, seu início é só fachada pra uma música mais rápida e reta, onde a banda aproveita o espaço para trazer sonoridades estranhas. Holofotes para a boa brincada com os sussurros e vocais aterrorizantes. A banda leva a marcha de forma forma igual pela música inteira, mas a princípio, os vocais chamam a atenção a música inteira por ela ser construída para valoriza-los de forma única. Assim como o restante das faixas, ela termina de uma forma seca como uma facada na garganta, um golpe final.
4. Articulating The Vice
Parece que nessa faixa se percebe com mais facilidade o peso e o trabalho de polimento das guitarras. Essa música foi uma das primeiras faixas de divulgação do álbum e mostra uma receita simples que funcionou mais do que bem. De longe, possui o melhor refrão do álbum, por conseguir trabalhar de forma coesa no seu peso. Ela vai e vem, começa e termina de forma única, Vem primeiro o vento, a trovoada e termina deixando seu rastro.
5. No Sin, No Pleasure
É uma progressão numa sonoridade mais ousada, misturando o rock com o industrial alemão. Os vocais como numa ligação telefônica, a bateria sempre excêntrica e dando diversas levadas para a música. A música se comporta como se fosse uma balada gótica misturada como metal. E sua melodia que é sem segredo porta em diversas formas e andamentos, sendo outra canção fácil de memorizar.
6. Euthanasia
Pense que o sepultura tivesse invadido o seu player por um certo momento. Existe um ar muito semelhante a ambiência de um Roots nessa canção. O refrão é repetido diversas vezes, se intercalando com alguns outros momentos de força. É legal como brincaram com a cenarização musical num certo momento, dando a aparência de um lugar neblinoso de um filme de suspense criminal. Mas a música caminha para o fim de uma forma decente e profissional, mantendo sua verdadeira essência de início a fim.
7. Honey & Milk
Uma música bem ousada, com diversos andamentos, sonoridades dissonantes, destaques pras linhas de baixo, a vibe famosa do “gothic rock” alemão, mas sua verdadeira explosão e alma se encontra no seu refrão. Uma sensação de querer arrancar seus olhos foras e matar todos a frente. Os berros, que colidem entre guturais graves e agudos. Existe um êxtase na música que ela vai criando uma marcha aterrorizante com a mesma dissonância que abriu a canção. O álbum vai terminando de maneira em fade out, uma sonoridade nojenta e repulsiva, ao mesmo tempo que agonizante pelos sussurros no seu ouvido, e deixando ouvintes de música estranha e desconhecida de boca aberta.
E é isso aí. Mais um álbum que deixa uma marca bestial no registro da música extrema. Existem na streaming digital duas faixas adicionais que são demos. Deixo elas para vocês ouvirem e tirarem suas próprias conclusões. Ambas não foram gravadas pela banda mas sim em outro estúdio local e que, apesar de ambas serem ricas numa composição forte, perdem em quesito de qualidade. Além disso, o álbum estaria excelente se houvesse um detalhe adicional: as letras. Apesar de deixar claro a sombria proposta lírica da banda, muitos interessados que gostariam de conhecer a riqueza mais aprofundada da banda acabam sendo cortados ao meio por não terem essas informações ( ou, caso as letras existam, estarem mal divulgadas). Todavia, não é um fator crucial que impeça o bom proveito de uma banda que se destaca por talento e profissionalismo e que tem tudo para deixar muito zé fritaceira no chinelo.
feed the FREAK! é
Skull Smugler: baixo e backing vocals
Hauntingr Joey: guitarras e vocal.
John Ripper: bateria