Misturar estilos costuma ser sempre perigoso e arriscado. A tendência purista, de quem é aficcionado por música, tende a levantar barreiras contra quaisquer tentativas de subverter os dogmas de seus gêneros musicais preferidos. O que se poderia dizer, portanto, da iniciativa de unir Rock pesado com Rap? Living Colour, Rage Against the Machine e Beastie Boys transitaram por essas experimentações e o Anthrax brincou um pouco com a idéia em uma ou duas músicas lançadas em EPs, mas ninguém foi tão agressivo quanto Ice-T e o seu Body Count.
Ice-T já era um músico consagrado dentro do seu estilo que, por sinal, corresponde à uma das divisões mais extremas dentro do Hip-Hop, o Gangsta Rap. Desconheço as raízes que o músico eventualmente pudesse ter dentro do Rock, o que ele ouvia quando era mais jovem ou coisas assim, mas reconheço que ele foi muito bem sucedido em sua empreitada, porque não se meteu a querer reinventar a roda. O primeiro álbum do Body Count é um disco de Punk Rock bem cru. Não tem nenhum grande instrumentista entre os integrantes e, portanto eles vão direto ao ponto, direcionando ao som básico e acertando no alvo. Arrisco até a dizer que, fora o timbre da voz de Ice-T, rapidamente associado ao seu estilo de origem, pouco vai ser encontrado de Rap aqui.
Até a capa, se for bem observada, não se afasta do estilo de capa tradicional utilizada por bandas de Heavy Metal. Basta imaginar Conan nascendo em um gueto de Los Angeles, sendo membro de gangue e trocar a espada pelo revólver. Pronto. Está formatado mais um disco extremamente representativo de sua época, os anos noventa, onde misturas foram priorizadas, mas as tradições foram mantidas. Em 1992, ano em que esse álbum foi lançado, vieram também ao mundo obras importantes de bandas como Megadeth, Pantera, Iron Maiden, Dream Theater, Alice in Chains, Ministry, Black Sabbath, Manowar, Fear Factory, Kyuss, Napalm Death, WASP, Faith no More, Kiss e Tiamat. Ou seja, há algum exagero na forma como essa década é vista, porque opções eram abundantes e sortidas.
O trabalho é repleto de pequenas vinhetas, tratando, em geral, sobre temas ligados ao racismo. A primeira música, “Body Count in the House”, soa mais como introdução, pois, quando a faixa-título, “Body Count”, começa, o disco mostra ao que veio. Baseada na marcação da bateria, a música lhe puxa pra acompanhar o refrão! Mais uma vinheta e surge outra faixa mais rápida, “Bowels of the Devil”. Excelente!
Eu não posso me omitir de mencionar “Cop Killer”. Sem entrar no contexto polêmico de sua letra, a música – em sua essência – é boa, mas sem nada de mais. Por conta da censura sofrida, ela foi omitida da prensagem inicial do álbum e, sinceramente, talvez nem fizesse tanta falta. O disco está repleto de várias outras músicas bem melhores, tal qual, por exemplo, “KKK Bitch”, a pesadona “Voodoo”, a power ballad “The Winner Loose” e “There Goes the Neighborhood”, com sua ótima letra, como teria realmente que ser, para quem é egresso de um estilo tão fundamentado na construção destas.
Quando eu conheci o álbum, lá atrás no tempo, tive um estranhamento inicial. Natural, porque os ouvidos, calejados com outra sonoridade, levam um tempinho para assimilar. Hoje, já nem percebo mais. Escutei-o tanto, ao longo dos anos, que atualmente ele me soa apenas como o que tem que ser e é: um disco de Rock pra ouvir no máximo!
Formação
Ice-T – vocal
Ernie C. – guitarra
Mooseman – baixo
D-Roc “The Executioner” – guitarra
Beatmaster “V” – bateria
Músicas
01. Smoked Pork
02. Body Count’s in the House
03. Now Sports
04. Body Count
05. A Statistic
06. Bowels of the Devil
07. The Real Problem
08. KKK Bitch
09. C Note
10. Voodoo
11. The Winner Loses
12. There Goes the Neighborhood
13. Oprah
14. Evil Dick
15. Body Count Anthem
16. Momma’s Gotta Die Tonight
17. Out in the Parking Lot
18. Cop Killer