Opinião: política pode ser discutida no Rock/Metal? Sim, claro!

Caro leitor. Antes de iniciar a leitura deste artigo, esteja ciente de que este não representa necessariamente a opinião da ROADIE METAL, A VOZ DO ROCK e que o mesmo está sendo publicado após consulta a chefia editorial, que concordou com a ideia que este redator apresentou como pauta, sendo então este que vos escreve responsável por todo o conteúdo do texto.

Em tempos de polarização política, a música pesada também é atingida e muitos fãs questionam se os artistas precisam manifestar suas opiniões. Essa discussão ultrapassa os limites da música pesada e deve ser amplamente debatido em todo o meio musical, porque ainda que o artista não aborde temas políticos em sua obra, ele tem sua posição ideológica, Cabe a ele se pronunciar ou não,

Voltando ao mundo da música pesada, que é o nosso foco, antes de mais nada, precisamos voltar no tempo; o Rock veio das classes menos favorecidas da sociedade, do negro e sempre teve como objetivo a contestação, seja em prol de uma sociedade mais justa e livre de qualquer tipo de preconceito ou por governantes honestos.

Essa discussão ficou ainda mais em alta após declarações do guitarrista do RAGE AGAINST THE MACHINE, Tom Morello e de Serj Tankian do SYSTEM OF A DOWN: o primeiro respondeu a um fã que uma pessoa não precisa necessariamente ser graduado em ciências políticas para emitir a sua opinião sobre um governo desastroso e que sim, ele é graduado em ciências políticas. Já o segundo, disse que alguns fãs não entenderam as letras da banda, Sim, há os que curtem determinadas bandas apenas preocupados com o som, mas isso é uma alienação. É importante ter conhecimento das letras, até para saber se isso é edificante ou ofensivo para nossas vidas,

Ainda que Alice Cooper afirme que o assunto política não deve entrar no campo artístico ou que o saudoso Lemmy afirmasse que todos os políticos não valem nada, ou ainda o isentão guitarrista do LAMB OF GOD, Mark Morton, que prefere se esquivar, o assunto é e sempre foi tratado dentro do Rock. E porque só agora os fãs têm estranhado? Perderam a parte da história do Woodstock, em que o protesto contra a Guerra do Vietnã era o pano de fundo?

Tem fã que se diz apolítico, que política não tem que ser discutida,. Tem sim, caro amigo. Tudo é política. Aquele pão que você compra quentinho na padaria, o preço dele é o reflexo de como os governantes tratam os que cultivam e comercializam o trigo. Lembra da carne que estava com preços exorbitantes no final de 2019 por conta da exportação para a China? Isso também é política. Aquele show gringo que você precisa vender um rim para comprar o ingresso? Pois é, a política age, fazendo o dólar subir ou descer. Logo, as decisões que são tomadas em Brasília vão impactar na sua vida, você gostando ou não de política. Você pode fazer biquinho e dizer que não gosta de política, mas ela age na sua vida desde o momento em que você nasce, até depois que você é sepultado ou cremado.

Exemplos de posicionamentos políticos não faltam: “War Pigs”, do BLACK SABBATH é uma crítica aos governantes que declaram guerra, incitando aos soldados que vão a campo muitas vezes sem saber porque estão ali. Pobres morrem enquanto ricos enriquecem ainda mais com a indústria bélica. Outras bandas, como o LAMB OF GOD também se preocupam em debater o lado social. Pegue o disco “Ashes of the Wake”, em que Randy Blythe desce a lenha, principalmente na estupidez de George W. Bush, que incitou uma guerra vã, contra o Iraque, sabemos que tudo era interesse no petróleo, disfarçado de combate ao terrorismo.

Mille Petrozza, do Kreator, virou assunto recentemente após postar uma foto de 1989 e explicando que vai continuar a tratar de assuntos políticos e sociais e que quem não gostar, basta deixar de seguir a banda. Você pode ver o post abaixo, caso não tenha visto antes.

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Podemos citar ainda o RATOS DE PORÃO como exemplo de banda questionadora: o álbum “Brasil”, de 1989 parecia uma premonição dos caras. O que eles contam lá é o que acontece no Brasil de Jair Bolsonaro, a faixa Farsa Nacionalista é o maior exemplo.

Lá fora mais bandas também se preocupam com o bem estar social, como o GOJIRA. Os franceses são engajados com a causa ambiental; as bandas punks em sua maioria abordam a política, seja pelo espectro da esquerda ou do anarquismo e também é válido. O PEARL JAM é uma banda que sempre esteve ativa nas causas sociais, apoiando por exemplo a Rock For Choice, que foi uma série de shows beneficentes que defenderam a legalização do aborto nos Estadis Unidos e no Canadá. Em sua última turnê pelo Brasil, a banda doou todo seu cachê para ajudar as vítimas do desastre ambiental em Mariana e Brumadinho. E em seu mais recente álbum, “Gigaton”, a preocupação com o aquecimento global é o conceito por trás da obra.

O LIVING COLOUR é um exemplo de inclusão. E como é bonito ver uma banda formada por negros tocando Rock, resgatando os primórdios de Little Richard e Chuck Berry. E o engajamento dos caras também é super importante, com suas letras críticas.

Já do outro lado da mesma moeda… O baixista do SEPULTURA, Paulo Xisto fez uma postagem recente chamando os Antifascistas de Antichatistas. O caso dele é ainda mais estarrecedor do que aquele fã que diz escutar um determinado tipo de música sem prestar atenção na mensagem, pois ele fez parte de uma gama de composições do passado da banda que abordavam os problemas sociais do Brasil, ainda que não tenha participado do processo de composição e muitas vezes, sequer os de gravação. Músicas como “Refuse/Resist”, “Propaganda”, “Territory”, “Ambush”, “Manifest” (que trata do Massacre do Carandiru, em 1992) ou mesmo “Dictatorshit”, de 1996, mas que segue atual, um tapa na cara do sujeito que defende atos antidemocráticos como o retorno do AI-5, o fechamento do congresso e do STF e o retorno dos militares ao poder. Xisto cometeu um erro ao fazer essa postagem, ainda que seja o que ele realmente acredita. É direito dele, mas no mínimo, antagônico, para não dizer pouco inteligente.

Do lado contrário, se enquadram ainda bandas como o PANTERA e algumas de suas letras questionáveis, a guitarra de Dimebag e seu desenho da bandeira dos Estados Confederados, que representa o ódio racial, o braço estendido de Phil Anselmo representando a “supremacia branca”. E o que dizer do post recente de Sandra Araya, esposa do conservador Tom Araya, desdenhando dos protestos dos negros após a morte covarde e brutal de George Floyd? Os discursos antissemitas do desprezível Varg Vikernes? A estúpida declaração do guitarrista Digão, do RAIMUNDOS de que “a quarentena é uma amostra grátis do comunismo” ou a declaração recente de Sammy Hagar, que diz preferir morrer fazendo shows se expondo aos riscos da Covid-19 do que ficar enclausurado dentro de casa, ainda que esta última não seja necessariamente uma afirmação política, mas social, reforça que essa turma parece ter feito no Rock a escolha errada. Ou ainda mais grave, eles parecem que perderam uma das primeiras aulas de iniciação do estilo, a que fala sobre ter atitude.

O headbanger brasileiro ainda é em boa parte, extremamente preconceituoso, retrógrado e intolerante. Basta ver os exemplos dos fãs menosprezando as meninas da NERVOSA e fazendo piadinhas de cunho misógino e justificam de forma lastimável que não gostam das garotas porque “elas não sabem tocar”. Peguem seus instrumentos e vão lá fazer melhor do que elas. Ou o que dizer dos três patetas que recentemente foram à Avenida Paulista avacalhar a manifestação pró-democracia, usando camisetas do BURZUM, se achando os nórdicos legítimos em plena América Latina?

Outro exemplo de ignorância aconteceu em 2018, quando uma parte dos fãs de Roger Waters demonstrou uma completa falta de conhecimento da arte do cara, vaiando-o quando ele criticava políticos ditos por ele como neofascistas, enumerando Trump, Putin, Orban, Macron e… Bolsonaro! Parece que ninguém nunca parou para traduzir uma letra do PINK FLOYD.

Existem as bandas que preferem enveredar por outros caminhos, como o BLIND GUARDIAN por exemplo, que usa a literatura de Tolkien para ilustrar suas letras ou o CANNIBAL CORPSE que usa de contos de terror em suas canções, é válido. Mas porque não vale abordar a crítica social? Tem headbanger que acha que até vale, desde que não sejam temáticas socialistas. Aí é que está o erro.

A arte é a exposição do sentimento do artista e esse sentimento deve ser respeitado. Se não gosta ou não concorda com a mensagem, não ouça, respeite quem goste. Respeitar quem pensa diferente é o primeiro passo para que a sua opinião seja igualmente respeitada. Porque política deve sim, ser debatida. Sobretudo na música.

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