O Opeth sempre foi uma banda diferenciada, e isso havia ficado muito claro em seus 2 primeiros trabalhos, Orchid (95) e Morningrise (96). Apesar disso, a resposta esperada não veio, e os suecos passaram por mudanças de formação profundas após esse segundo álbum, o que acabou de certa forma por refletir em sua música. Primeiramente, o vocalista e guitarrista Mikael Åkerfeldt e o baterista Anders Nordin decidiram que o baixista Johan De Farfalla não era o músico ideal para integrar a banda, convidando-o então a se retirar. Pouco após isso, de forma surpreendente, Anders informa a Mikael que estava de saída, já que pretendia se mudar para o Brasil (algo que em um primeiro momento parece não ter ocorrido). Para efeito de curiosidade, cabe informar que ele é brasileiro de nascença, tendo sido adotado por um casal sueco. Posteriormente, a mudança realmente ocorreu e ele residiu por um tempo entre nós.
Então, de uma hora para outra, o Opeth estava reduzido apenas a Mikael Åkerfeldt e ao guitarrista Peter Lindgren, e pior, preparando-se para entrar em estúdio e gravar seu 3º álbum, My Arms, Your Hearse. Recompor suas fileiras era algo essencial e não se podia perder muito tempo. O primeiro a ser recrutado foi o baterista Martin Lopez, vindo do Amon Amarth. Este, apesar de nascido na Suécia, era filho de imigrantes uruguaios, tendo inclusive morado no Uruguai por algum tempo, onde tocou em uma banda de Black Metal chamada Eternal. Nesta, tinha ao seu lado o baixista Martín Méndez, nome que indicou para ocupar o posto vago no Opeth, sugestão plenamente aceita. Ainda assim, como não havia tempo viável para que este aprendesse as músicas que entrariam no álbum, o baixo nas gravações acabou ficando sob responsabilidade de Åkerfeldt.
Sinceramente, considero My Arms, Your Hearse uma parte essencial da discografia do Opeth. O que temos aqui é a banda dando um passo à frente e lançando a base do que viria a ser seus trabalhos futuros, mas ainda mantendo algo dos álbuns anteriores. É o que podemos chamar de um trabalho de transição, e normalmente estes tendem a ser um pouco confusos, o que felizmente não ocorre aqui. Na verdade vou além, e digo que é certamente seu trabalho mais consistente e coerente até então. As canções soam mais bem estruturadas, e tudo flui com muita naturalidade. Apesar da complexidade e das diversas mudanças de tempo, existe uma forte coesão, a ponto de você em muitos momentos viajar durante a audição e se perder na contagem das faixas. Até os 3 interlúdios aqui presentes, “Prologue”, “Madrigal” e “Epilogue”, funcionam perfeitamente dentro do contexto.
Esse também é o primeiro álbum conceitual do Opeth. Aqui temos a história de um homem que após falecer se torna um fantasma, passando a seguir de perto a mulher que amava. À medida que o trabalho avança, podemos ver toda a sua agitação e inquietação com a forma como ela lida com a morte dele. Outra forma de se analisar o mesmo é através das progressões das estações do ano, já que ao acompanhar as letras, é possível identificarmos a primavera (“Prologue”), o verão (“The Amen Corner”), o outono (“Demon of the Fall”) e o inverno (“Epilogue”). Ao se fazer isso, nota-se que o final de cada uma das canções é o nome da que vem a seguir, sendo que a última palavra de “Epilogue” é justamente prologue, o título da canção de abertura. Um ciclo que se fecha e então recomeça.
O trabalho de guitarras de Åkerfeldt e Lindgren é fenomenal, e fica muito claro que adotaram uma abordagem mais jazzística, mas focando pesadamente nos riffs. Temos aqui uma infinidade deles, e indiscutivelmente são os melhores compostos pela banda até então. As passagens acústicas embelezam as canções e quebram um pouco a agressividade do material, mas de uma forma tão natural que você nem sente. Descontando os interlúdios, temos 6 músicas fortíssimas, que conseguem funcionar tanto como um todo, quanto separadas, algo que não é fácil de se conseguir. “April Ethereal” e “When” conseguem equilibrar com perfeição a fúria do Death Metal com aquele lado mais belo das passagens acústicas. “The Amen Corner” também possui tal característica, mas se destaca também pelos ótimos riffs. “Demon of the Fall” é a melhor música de todo o disco, com seu ótimo trabalho de guitarras, com aquelas dissonâncias típicas do Opeth, além de possuir melodias verdadeiramente grudentas. “Credence” é toda acústica e se caracteriza não só pelas melodias agradáveis, como também pela calma e serenidade que transmite. Já “Karma”, que vem logo em seguida, transborda peso, com riffs típicos do Death Metal Melódico, além de possuir linhas vocais brilhantes.
Subestimado por muitos, My Arms, Your Hearse é desses álbuns que mereciam um reconhecimento muito maior. Ele marca a virada da banda, e nele está a base de tudo que o Opeth se tornaria nos próximos anos. Aqui definiram sua sonoridade e qual seria o caminho a se seguir dali em diante. Além disso, possui uma beleza rara e uma aura sombria que o permeia, fazendo assim com que emoções transbordem por todos os lados. Como costumo brincar por aí, um dos melhores trabalhos de transição de toda história. Se quiser entender tudo que o Opeth se tornou, aqui está por onde começar sua caminhada. Ah, e caso não tenha notado (eu demorei anos para perceber), existe uma pessoa (ou seria o fantasma?) na capa de My Arms, Your Hearse.
Formação:
– Mikael Åkerfeldt (vocal/guitarra/baixo/piano);
– Peter Lindgren (guitarra);
– Martin Lopez (bateria).
Faixas:
01. Prologue
02. April Ethereal
03. When
04. Madrigal
05. The Amen Corner
06. Demon of the Fall
07. Credence
08. Karma
09. Epilogue
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8.9/10