Que a segunda metade da década de 80 foi um período extremamente produtivo para o Heavy Metal em geral, é algo indiscutível. A quantidade de estilos sendo formatados e de ótimos lançamentos, foi algo que beirou o absurdo, e isso acabou por gerar uma grande quantidade de bandas e álbuns ditos “cults”. O Dream Death e seu debut, Journey Into Mystery, se encaixam com perfeição nessa descrição. Caso você não os conheça, vamos a uma presentação básica e rápida.

O Dream Death teve sua gênese no ano de 1985, quando o vocalista e guitarrista Brian Lawrence, o baixista Ted Williams e o baterista Mike Smail, resolveram juntar forças. No ano seguinte, após o lançamento de duas Demos, a primeira autointitulada, e More Graveyard Delving, resolveram incluir um segundo guitarrista, sendo escolhido para o posto o ex-baixista do Doomwatch, Terry Weston. Foi com essa formação que lançaram seu debut, Journey Into Mystery, no ano de 1987, mas a mesma não durou muito, pois, após o lançamento, Ted Williams se retirou para se unir ao Eviction. Com sua saída, o posto de baixista passou a ser ocupado por Richard Freund, e até chegaram a soltar mais uma Demo, Ode to Sorrow (88), mas optaram por alterar o nome da banda para Penance, e assim seguir a carreira. Em 2011 resolveram retornar com o Dream Death – em paralelo ao Penance, que continua na ativa –, já tendo lançado 2 álbuns, Somnium Excessum (13) e Dissemination (16).

Definir a sonoridade do Dream Death é algo um tanto desafiador. É como se estivéssemos diante de um híbrido de Thrash Metal com Doom Metal, mas com elementos daquela cena nascente do Death Metal. Não existia uma cena específica onde pudessem se encaixar naquele momento, e isso certamente foi um problema. Nos vocais, a influência mais latente era de Tom G Warrior (Celtic Frost), enquanto as guitarras transitavam entre riffs que soavam como o Black Sabbath, e outros típicos do Speed/Thrash que marcou o período, mas com uma velocidade mais próxima do Doom. O baixo soa forte, e a bateria bem diversificada, sendo muitas vezes a responsável por fazer a transição entre os estilos. No fim, sua música era pesada demais para o cenário Doom daquele período, onde nomes como Trouble, Pentagram e Saint Vitus se destacavam, mas não tinha o nível de brutalidade das bandas de Death Metal que começavam a tomar a cena de assalto.

Em uma época onde não era simples você ter acesso ao que ocorria em outros centros, essa sonoridade diferenciada do Dream Death gerou uma situação curiosa. É difícil, por exemplo, não enxergar em suas guitarras, muito do que veio a ser feito futuramente por nomes como Autopsy – Severed Survival (89) é um álbum seminal para toda cena Death/Doom dos anos 90 –, ou Obituary, mas, ao mesmo tempo, é complicado afirmar que tenham sido uma influência direta para as mesmas, já que se tratam de nomes contemporâneos. Essa similaridade, no fundo, se dava muito mais pelo fato de existirem influências em comum para todos esses nomes, como os já citados Black Sabbath e Celtic Frost, assim como o Venom. No fim, cada uma desenvolvia sua sonoridade de uma forma própria, mas mantendo certos elementos em comum, que acabavam por unir as mesmas em uma cena.

Musicalmente, nos deparamos com um álbum diversificado, mas, ao mesmo tempo, muito coeso. As canções esbanjam peso, e em muitos momentos, como já dito, as guitarras soam como se estivéssemos diante de um Black Sabbath, só que mais perverso e raivoso. Isso acaba gerando algumas melodias bem sombrias. O melhor de tudo é que toda essa mistura, que coloca em um mesmo caldeirão, elementos do Speed/Thrash, do Doom e do Death Metal, acaba soando orgânica e nada forçada, tornando tudo ainda mais instigante e brilhante. A abertura, com “Back from the Dead”, consegue equilibrar bem as passagens mais lentas do Doom, com as mais velozes oriundas do Thrash, além de possuir um bom refrão. Na sequência, “The Elder Race” é mais pesada e arrastada, com destaque para o trabalho das guitarras, enquanto “Bitterness and Hatred” é uma mistura de tudo que a banda pode fazer, mas com uma pitada de Punk. “Black Edifice” é bruta, pesada e variada; “Divine in Agony” une Thrash, Hardcore e Death Metal, com destaque para as boas mudanças de tempo, e a pesada “Hear My Screams” tem ótimo trabalho de bateria. Na sequencia final, temos a brutal e lenta “Sealed in Blood” e a pancadaria Thrash de “Dream Death”.

Journey Into Mystery soa orgânico, verdadeiro, e ao final de sua audição, fica aquela sensação de que todo o cenário Death/Doom surgido posteriormente, teve como base esse álbum, mas claro, aparando as arestas existentes no mesmo. Nesse sentido, é até sintomático para mim, que o baterista Mike Smail tenha sido escolhido por Lee Dorian, para tocar em Forest of Equilibrium (91), o álbum de estreia do Cathedral. Isso mostra muito da dimensão alcançada pelo debut do Dream Death dentro dos porões do underground metálico. E por mais que tenham seguido carreira com o Penance, e retornado com a banda nesse década, fica a pergunta de até onde poderiam ter chegado, se tivesse dado sequência a sua caminhada após o lançamento de Journey Into Mystery. Essa é uma pergunta que nunca saberemos a resposta.