Nos anos 80, o Hard Rock e o Metal viveram seu auge em matéria de popularidade. Milhões de álbuns vendidos, mega-turnês, bandas disputando o topo das paradas com artistas da música Pop. Novos estilos como Thrash e Death Metal estavam surgindo e fazendo um bom barulho (literalmente). O mundo havia se rendido à música pesada. Mas 1992 chegou, e o que parecia um belo sonho se tornou o maior dos pesadelos. De uma hora para outra, o Hard e o Heavy foram varridos das paradas de sucesso. Aquela geração que cultuava os excessos envelheceu e foi substituída por uma mais casual, introspectiva, que se identificou com o visual e temática lírica que lhe era apresentada pelo Grunge e pelo Rock Alternativo, que agora pareciam mandar em tudo.
Para falar de Skunkworks, 3º trabalho da carreira solo de Bruce Dickinson, se faz necessário contextualizar o período em que o mesmo foi lançado. O ano era 1996 e a coisa parecia ir de mal a pior para quem apostava suas fichas em vertentes mais tradicionais da música pesada. Grandes nomes do estilo passavam por períodos conturbados em sua carreira. O Iron Maiden sofria fortes contestações por parte de seus fãs após o lançamento de X-Factor, com Blaze nos vocais. O Judas Priest parecia sem rumo desde a saída de Rob Halford, e havia anunciado um jovem então desconhecido, Tim “Ripper” Owens, como novo vocalista. Quem queria sobreviver, buscava se adaptar à nova realidade musical ou então criar algum fato novo. O Kiss anunciava o retorno não só de sua formação original, como também do uso das máscaras e um álbum acústico. O Van Halen, que naquele momento lançava uma coletânea, havia acabado de perder Sammy Hagar, irritado com o fato de a banda flertar com uma possível volta de David Lee Roth (o que não ocorreu naquele momento). Já o Metallica abandonava não só o visual típico do Metal, como lançava nada menos que Load.
No topo das paradas de sucesso, o Grunge dava seus últimos suspiros, com novos trabalhos de Soundgarden, Stone Temple Pilots, Alice In Chains, Pearl Jam e Bush. O Pop/Rock Alternativo também estava mais forte do que nunca, e nomes como The Smashing Pumpkins, No Doubt, Weezer, Collective Soul, Alanis Morissette, Garbage e Cake eram mais do que conhecidos. O Britpop não ficava atrás, com Oasis, Suede, Blur e Radiohead sendo efusivamente festejados por muitos. Em outro flanco, o Prodigy, com sua mistura de Techno e música pesada, era conclamado por muitos como o futuro da música. No meio da música pesada, o Sepultura fazia grande barulho com Roots e sua sonoridade moderna, o Tool conseguia reconhecimento com Aenima, o Korn começava a se destacar pra valer com Life Is Peachy, Marilyn Manson causava polêmica com seu Antichrist Superstar e o Rage Against The Machine chegava ao topo da Billboard 200 com Evil Empire e sua música altamente politizada. Se você fazia um som mais tradicional dentro do Metal, era quase que visto como um pária.
Levando tudo isso em conta, como condenar Bruce Dickinson por Skunkworks, que é nada menos do que um retrato fiel de uma fase onde todos buscavam sobreviver a um momento conturbado, tentando manter alguma relevância? Como atenuante, vale dizer que esse nem deveria ser um trabalho solo seu. Após a turnê de divulgação de Balls to Picasso, empolgado com seus músicos de apoio, o guitarrista Alex Dickson, o baixista Chris Dale e o baterista Alessandro Elena, Bruce decidiu formar uma nova banda e dar um novo rumo à sua carreira. O nome da mesma? Skunkworks, um nome que era uma referência direta ao departamento de projetos avançados da Lockheed Martin responsável por projetos de aviões militares (e todos sabem de sua paixão por aviação). O problema é que após o álbum gravado, sua gravadora, Castle Records, se recusou a lançar o trabalho com esse nome, só aceitando fazê-lo se na capa estivesse estampado o nome do vocalista. E assim surgiu seu álbum “Grunge”.
Muito dessa alcunha de Grunge que o trabalho recebe tem seus motivos. Na produção, tivemos ninguém menos que Jack Endino, nome fortemente ligado ao estilo e responsável por trabalhos de bandas como Nirvana e Soundgarden. Musicalmente, é difícil não perceber as muitas referências ao Alice In Chains que se fazem presentes por aqui. Preste atenção no instrumental de faixas como “Space Race”, “Faith”, “Dreamstate” (com algumas reminiscências de Nirvana), “I Will Not Accept the Truth”, “Meltdown” ou “Strange Death in Paradise” e elas estarão lá. No restante do álbum, basicamente temos Bruce e sua banda flertando com o Pop/Rock Alternativo que estava muito em voga na época.
A verdade é que não dá para discutir a capacidade individual aqui. Bruce canta de forma enérgica e competente, por mais que em alguns momentos seu estilo não case muito bem com o que escutamos no instrumental (tente imaginá-lo cantando no Alice In Chains ou em alguma banda de Pop/Rock Alternativo da época). Na guitarra, Alex faz um bom trabalho, com alguns riffs até interessantes, enquanto Chris e Alessandro formam uma parte rítmica bem sólida e que não inventa, fazendo o básico com muita competência. Existem boas canções dentro da proposta musical adotada, como as já citadas “Space Race”, “Faith” e “Strange Death in Paradise”, além de “Inertia”, “Solar Confinement”, “Inside the Machine” e “Headswitch”, mas a verdade dura, nua e crua é que, musicalmente, nada do que escutamos aqui se difere do que ouvimos em qualquer outro álbum da época, dos estilos citados. Em alguns casos, até com mais competência.
É engraçado como passados mais de 20 anos, vemos pessoas tentando redimir Skunkworks, tratando-o como um trabalho incompreendido em sua época. Em alguns casos, se dá puramente por serem “torcedores” do Iron Maiden e não aceitarem a ideia de que Bruce ou qualquer outro músico da banda possa ter feito ou vir a fazer um trabalho que seja contestado. Em outros, é puramente por aquele saudosismo tolo que acompanha o ser humano, essa mania de achar que tudo que foi feito em outra época é superior, por mais que eu não consiga entender como um fã de Metal possa ser saudoso dos anos 90.
E me desculpem, não vou ficar aqui com aquela ladainha de que se você abstrair que esse é um trabalho solo de Bruce, irá se deparar com um álbum muito legal. Porque a torcida goste ou não, mesmo se entendermos esse como sendo um álbum de uma banda Grunge/Alternativa chamada Skunkworks, se o colocarmos frente a frente com outros trabalhos lançados no estilo nesse mesmo ano, por bandas como Soundgarden (Down On the Upside), Stone Temple Pilots (Tiny Music…Songs from the Vatican Gift Shop), Pearl Jam (No Code), Weezer (Pinkerton), The Cranberries (To The Faithful Departed) ou REM (New Adventures in Hi-Fi), ele perde feio em matéria de qualidade musical. Aqui temos apenas um trabalho mediano, de um músico talentosíssimo, que tentou se aventurar por outras áreas sem muito sucesso. Aceitem, colegas, até mesmo Bruce Dickinson erra a mão às vezes. Felizmente, após isso ele optou por voltar a fazer o que sabe de melhor, mas ai já é outra história.
Formação:
– Bruce Dickinson (vocal);
– Allex Dickson (guitarra);
– Chris Dale (baixo);
– Alessandro Elena (bateria).
Faixas
01 – Space Race
02 – Back from the Edge
03 – Inertia
04 – Faith
05 – Solar Confinement
06 – Dreamstate
07 – I Will Not Accept the Truth
08 – Inside the Machine
09 – Headswitch
10 – Meltdown
11 – Octavia
12 – Innerspace
13 – Strange Death in Paradise
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6/10