É muito interessante poder acompanhar a evolução de uma banda álbum a álbum. A busca pela identidade sonora, os elementos musicais que são agregados a cada lançamento, a melhoria técnica ou criativa de um integrante, os erros que vão sendo consertados… Tudo isso faz parte de um processo que exige, antes de tudo, muita paciência, além de boas doses de determinação e persistência.
A banda paulista Fallen Idol chega neste momento ao lançamento de seu terceiro álbum de estúdio, Mourn The Earth, que está sendo lançado graças a uma parceria entre os selos Tales from the Pit, Nomade Records, Mutilation Records, The Metalvox Produções, Nuktemeron Productions e Left Hand Records. Um dos nomes de maior evidência no cenário Doom Metal nacional quis provar neste novo trabalho que pode ir muito além do mero rótulo “Doom”, pois o grupo soube trabalhar com competência seu lado mais Heavy Tradicional, sem abandonar a veia Epic Doom que é a essência do grupo.
Não que o tal rótulo “doom” seja um limitante criativo. Muito pelo contrário: o Gênero Maldito criado e ensinado pelo Black Sabbath é o mais versátil e maleável filho do Metal. Seu ritmo lento, que não exige pressa nem urgência, permite que seus praticantes usem e abusem da criatividade e da vontade para que o som saia como bem planejam. Não a toa, o Doom Metal foi o filho que deu mais “netos” ao velho Papai Metal.
Mas ok, isto é outro assunto. Voltando ao novo álbum do Fallen Idol, o mesmo foi registrado no Estúdio No Limits em Arujá, cidade-natal da banda, tendo a frete da produção as pessoas de Ivi Kardec, Felipe Stress e do próprio Rod Sitta, vocalista e guitarrista da banda. O grupo junto com esta equipe buscou nesta gravação um som mais sujo e orgânico, diferente da sonoridade cheia e imponente de Seasons Of Grief, o álbum antecessor. Junto a isso, tudo soa nítido e compreensível, algo que favoreceu bastante a pegada mais Heavy que rege Mourn The Earth. As guitarras de Sitta estão cortantes e com uma ótima timbragem, enquanto o contrabaixo de Márcio Silva emerge estalado e bastante forte e o caixa de Ulisses Campos soa mais como um tiro.
Foi falado anteriormente sobre busca pela identidade sonora. Não obstante as influências de nomes clássicos do Heavy/Doom como Black Sabbath e Candlemass, o Fallen Idol não se omite em experimentar novos elementos em seu som. A faixa que abre os trabalhos, Witches Of Lucifer, se apresenta variada e com a inclusão de vocais operísticos em seu refrão, trechos que remetem o ouvinte inevitavelmente a Rainbow e uma passagem “celticfrostiana” próximo de seu final. Algo a se constatar desde já é a notória evolução nos vocais de Rod Sitta, principalmente no que se refere aos tons agudos.
O baterista Ulisses Campos (belíssimo timbre de bateria, diga-se de passagem!) dá o pontapé inicial na groovada Time To Mourn The Earth, dona de um lamuriento refrão tocante. A condução desta música por parte de Ulisses é primorosa, tanto quanto o solo de guitarra, que é um dos grandes momentos do álbum. Wait é o primeiro “Doomzão cavernoso” do álbum, cujos arranjos o fariam se encaixar perfeitamente no álbum anterior, o elogiado Seasons Of Grief. Aqui, o Fallen Idol ensina ao Candlemass atual como fazer um Heavy/Doom de respeito com riffs assassinos e climas negros. Grande destaque do álbum!
Destruindo tudo ao redor chega a bruta faixa Shattered Mirror, variada em todo seu tempo indo de andamentos rápidos até passagens mais lentas. O baixo de Márcio Silva aqui está imponente, Sitta demonstra mais uma vez sua grande evolução como cantor (em especial na parte final) e Ulisses dá mais uma aula de condução e viradas. De fato, as melhores formações de Heavy Metal continuam sendo os power-trios. Cliff Burt… Opa… Márcio Silva conduz junto ao seu contrabaixo e pedal de distorção, com a maior calma e competência, a bela instrumental Chrisalism.
No melhor estilo Alice In Chains, o Fallen Idol apresenta em Lucidity mais uma vez que não está com nenhum receio em trabalhar de mãos dadas com a ousadia. E se você ainda pensa que ousadia ou experimentação se fazem com sons estranhos ou instrumentos atípicos, o Fallen Idol apresenta a sua versão somente com o básico. Aqui, valeu a máxima de que “menos é mais”. A faixa que encerra o álbum, Secret Place, começa com um trabalho Doom mortal de guitarras antes de seguir até o final criando no ouvinte um confortante clima etéreo, como se sua alma fosse levada pelas nuvens negras da morte debaixo de um céu escarlate. Apesar disso, se fosse um pouco mais enxuta, esta música seria bem mais palatável; seus quase 10 minutos tornaram-na um pouco cansativa.
Mas sim! Tudo isto faz parte da evolução musical de uma banda! No dia que um grupo de Metal pensar que atingiu a perfeição e tomar a decisão de não ousar mais, já será tempo de encerrar seus trabalhos. Em Mourn The Earth, o Fallen Idol encontrou seu som. O lado mais cru e agressivo do debut juntou-se a faceta mais Doom do álbum anterior Seasons Of Grief e fizeram de Mourn The Earth um dos grandes álbuns já lançados este ano no Metal nacional e um dos melhores que este redator já ouviu este ano a nível de Doom mundial. Tanto é que a capa parece resplandecer este fato: a arte de Cesar Benatti e Rodrigo Bernardo é colorida e melancólica, refletindo assim a variedade que o Fallen Idol consegue trabalhar sem largar a essência Doom de seu som. Nem só de bandas de sons rápidos e extremos vive o Metal nacional. O Gênero Maldito também possui grandes nomes em nosso país. Não conhece ainda o Fallen Idol? A Terra lamenta por você.
Mourn The Earth – Fallen Idol (vários selos, 2018)
Tracklist:
01. Witches Of Lucifer
02. Time To Mourn The Earth
03. Wait
04. Shattered Mirror
05. Chrisalysm
06. Lucidity
07. Secret Place
Line-up:
Rod Sitta – vocais, guitarras
Márcio Silva – contrabaixo
Ulisses Campos – bateria
Ficha técnica:
Produção, mixagem e masterização e teclados adicionais: Ivi Kardec, Felipe Stress e Rod Sitta
Vocais adicionais em Witches Of Lucifer: Paula Nogueira
Vocais adicionais: Daniela Costa
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9/10