Quer queiram, quer não, o rock brasileiro dos anos 80 foi uma página marcante da história de nossa música. Talvez, o período de maior popularidade desse estilo em nossas terras, visto que, a geração dos anos 70, por mais antológica que tenha sido sua contribuição, não teve grande alcance midiático para além de seus estados de origem e, a geração posterior, dos anos 90, além de ter competido por espaço com o crescimento de estilos de música mais populares, fragmentou-se em diversas vertentes, ora misturando-se com ritmos regionais, ora avançando para uma espécie de hardcore mais pop, com temáticas românticas e de esportes radicais.
Ao som oitentista, restou sobreviver na perseverança de alguns dos principais artistas daquele período – que ainda permanecem ativos – sendo poucas vezes revisitado. No entanto, em casos pontuais, surgem algumas novas bandas que recuperam o que de melhor houve na época, não se olvidando, necessariamente, de atualizar a roupagem para a musicalidade deste novo século. O Dr. Kong é uma banda de Goiânia, criada em 2015, que executa um rock and roll com bastante frescor, em uma levada que tem tanto o ritmo swingado do blues quanto a pegada mais dinâmica do hard rock, resultando em uma sonoridade que nos remete tanto a Celso Blues Boy quanto a Barão Vermelho.
Barão Vermelho é, por sinal, uma presença constante no decorrer do disco, pois o timbre de voz de Flavio de Carvalho lembra demais o de Roberto Frejat, podendo também ser associado, em outros momentos, como em “Honoráveis Primatas”, a Marcelo Hayena, do Uns e Outros. Mas, ao longo da audição das treze composições próprias que perfazem ó álbum “Protagonista”, estréia da banda, a similaridade vai se esvanecendo em detrimento de podermos perceber a personalidade do vocalista.
Flavio, juntamente com o guitarrista Eliel Carvalho, forma o duo de compositores responsáveis pela maior parte do que está no disco, em canções bem agradáveis, que ganham bastante força por suas letras, que são muito positivas sem deixar de registrar críticas sociais e comportamentais, fazendo isso com uma leveza que transmite a mensagem sem tirar o seu clima lúdico, como, por exemplo, no trecho de “Indignação”, que diz: “Eu não vou querer pensar / Porque pensar faz a cabeça doer / Quero me anestesiar / É muito fácil, é só ligar a TV”.
Contando com Gustavo de Carvalho na guitarra, Gustavo Silva no baixo e a bateria de Wagner Arruda, a banda abre o disco com a faixa-título, dando a tônica do que virá pela frente, com uma levada na linha do ZZ Top, referência praticamente inevitável para quem pretende fazer o bom blues elétrico. A partir daí, virá um apanhado de boas composições, como a cativante “Fale Tudo”, “Consciência”, “Passos”, “Não Perca o Humor”, que é uma agridoce balada com acompanhamento de violão, e “Por Sorte”, cuja melodia remete a algo de Guilherme Arantes.
O Dr.Kong é uma banda bastante habilidosa dentro de sua proposta e usa o blues de forma bem inteligente e atual. Não vai, naturalmente, reinventar a roda, mas também não precisamos disso. Só precisamos de bandas que nos tragam o prazer de ouvir um bom disco de rock feito com honestidade e competência. O carisma do repertório de sua estréia é um indício de que esses pré-requisitos estão presentes. Que continue assim.
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7.5/10