Esses textos, sobre aniversário de clássicos, costumam conter muitas lembranças de cunho pessoal, e é ótimo que sejam assim. Creio que, uma grande maioria daqueles que foram fãs de Metal nos anos oitenta, exercitaram bastante os limites de seu radicalismo. Comigo não foi diferente. Quantas vezes, nos anos em que eu comia e bebia apenas Thrash Metal, passei por esse disco nas prateleiras, tendo a atenção chamada somente pela capa impressionantemente chamativa. King Crimson??? Progressivo, na minha pretérita e restrita visão, era apenas Pink Floyd e ponto final! E quer dizer que aquele cara, que toca sentado, é um gênio da guitarra??? Ora, faça-me o favor…
Ainda bem que a passagem do tempo trouxe-me, além do envelhecimento, a necessidade de ampliar o acervo de sonoridades e é claro que os amigos também auxiliaram no processo. Ninguém segura uma banda boa apenas para si. Insiste-se para que os demais façam a degustação daquilo que nos agrada. No caso do King Crimson, isso foi essencial porque, se por um lado, a banda não é desconhecida, também não tem o mesmo apelo de mídia que seus pares tal qual Pink Floyd, Yes, Jethro Tull ou Genesis…
Não me lembro em qual momento eu finalmente resolvi escutá-los, mas sei que a experiência foi aquela de um típico desbravamento por regiões inexploradas. Aquela jornada pela compreensão das nuances de um som mais elaborado, com alternância de climas, para dentro do sistema digestivo do gigante avermelhado que expressivamente escancara sua boca. Qual seria, em 1969, há mais de 40 anos, o impacto de um álbum abrindo com “21st Century Schizoid Man”? Música que se une aos trabalhos do Cream, Who e Jimi Hendrix Experience na origem do Heavy Metal, com o vocal distorcido e abafado de Greg Lake, que fazia aqui sua estreia em um álbum completo, dando vida às poesias de Peter Sinfield, letrista e iluminador do grupo. Nós escutamos a música de ontem com os ouvidos de hoje, mas às vezes é necessário um exercício de imaginação para vislumbrar como aqueles artistas, que já inovavam o Rock na década de 60, soavam desafiadores e pesados perante o cenário da época.
De “21st Century…”, passando pela melodia acústica de “I Talk to the Wind”, pela carga dramática de “Epitaph”, pela utilização do silêncio como elemento musical em “Moonchild” ou pelo clímax quase operístico de “In the Court of the Crimson King”, foram erguidos os tijolos de uma instituição que, conduzida por Robert Fripp, único membro original a prosseguir com o legado, nunca se acomodou, nunca repetiu fórmulas, sempre experimentando novos timbres, novos efeitos e até mesmo novas possibilidades de formação de uma banda, extendendo sua influência para os mais diversos grupos, do Primus ao Voivod. O crítico Valdir Montanari defendia que a nomenclatura correta para esse tipo de música seria Rock “Progressista”, sendo que o usual “Rock Progressivo” deveu-se a uma tradução equivocada de Progressive Rock. Progressista, portanto, no sentido de inovador, vanguardista. Logo, que outra banda seria então mais merecedora do título do que o King Crimson? Era suave, era etéreo, era sinfônico, mas também era pesado, denso, neurótico, angustiante…
Aliás, aquele cara, que toca sentado, é um gênio da guitarra??? Sim, com toda certeza, ele é!
Formação
Robert Fripp – guitarra
Michael Giles – bateria, percussão
Greg Lake – vocal, baixo
Ian McDonald – saxofone, flauta, clarineta, teclados
Peter Sinfield – letras, iluminação
Músicas
01 21st Century Schizoid Man
02 I Talk to the Wind
03 Epitaph
04 Moonchild
05 The Court of the Crimson King