Todos sabem que quase todo Headbanger é aficionado por coleções de CDs, pôsteres e souvenires. Se a coleção tiver referência com a sua banda preferida então, a coisa assume ares quase religiosos.
Exemplos de bandas como Kiss (sempre à frente no marketing), Metallica, Iron Maiden, ou seja, os medalhões do rock nos mostram bem que existe toda uma indústria que se move no intuito de trazer novos produtos para os fãs. Um caso clássico é o que envolve o sepultamento de Dimebag Darrell e sua urna mortuária estilizada com a marca Kiss.
Bom, esses são exemplos da cena mundial e que certamente vivem uma realidade econômica bem diversa da que temos em nosso quintal.
É ponto pacífico que nem todo Headbanger nutre interesse ou simplesmente ignora a cena local. Isso nos leva a momentos de reflexão e também de buscar compreender por que isso ocorre. Um caso que reverberou durante uma temporada nas redes sociais foi o vídeo da reclamação feita pelo vocalista Edu Falaschi com relação a pouca presença de público em uma apresentação de sua banda. Além disso, somos sabedores de bandas que diminuem ou encerram suas atividades por não encontrarem respaldo positivo em relação ao seu trabalho, e, em certos casos, são bandas de qualidade inquestionável e que ralam muito para oferecerem produtos de qualidade aos apreciadores do estilo.
É lamentável você chegar a uma casa de shows com capacidade para 500, 700 ou 1.000 pessoas e dar de cara com um local vazio ou com menos de 20% de sua capacidade ocupada. Esse tipo de situação atua de forma contrária ao que se espera de um “cenário” que existe única e exclusivamente por causa da música (NR: esse trem de ideologia no Heavy Metal é balela de quem não tem mais nada para fazer da vida). Uma vez que alguns espaços abrem para as apresentações de bandas autorais, recebem este tipo de evento única e exclusivamente buscando agregar um novo tipo de público e com isso manter o espaço, pagar os salários de funcionários, água, luz, internet, material de divulgação e, em quase sua totalidade, o aluguel do lugar que, aqui no Brasil, como bem sabemos, é um dos mais caros do mundo.
O brasileiro se condicionou a atacar de forma pejorativa qualquer um que venha a público falar dos problemas e das mazelas de uma sociedade. Atacar se tornou a ferramenta dos que nada fazem e, dentro do nosso cenário, isso tem ocorrido cada dia mais, sejam os que reclamam do crowdfunding do Dorsal Atlântica, das turnês vitoriosas da Nervosa pelo mundo ou das comparações entre o Torture Squad atual com o Voodoo Priest, apenas pela passagem do vocalista Vitor Rodrigues pela banda. E melhor, se obervarmos os dois trabalhos com exceção de serem voltados ao Heavy Metal, não existe qualquer similaridade no trabalho dos citados. Reclamam e crucificam até mesmo do desavisado que erroneamente cumprimentou um amigo de longos anos na rua depois que esse se converteu a alguma religião.
Eu acredito que quando uma banda busca se expor pedindo ajuda dos fãs, como o citado Dorsal Atlântica, e – mais recentemente – o Claustrofobia com um projeto de crowdfunding, primeiro mostra que ela (a banda…) acredita cegamente em seu projeto; segundo, que a nossa realidade monetária não favorece grandes projetos e, no caso do Metal brasileiro, não favorece as pequenas e médias bandas do país; terceiro, a banda tenta vender o seu trabalho antecipadamente, e já que as regras do crowdfunding reconduzem o dinheiro investido ao seu dono no caso de não alcançar ao meta estipulada, ela busca apenas quem se interesse pelos produtos oferecidos na campanha. E, nisso, eu acredito que a vantagem é exclusiva do fã, que, muitas vezes, recebe um produto de qualidade superior e agregado a isso ainda pode adquirir camisetas, adesivos, ou seja lá o que for. Já se a banda ou os produtos não lhe interessam, não existem leis nesse mundo que o forcem a colocar o seu dinheiro em qualquer campanha.
De tempos para cá, eu vejo que o brasileiro apenas se interessa em reclamar e fazer vista grossa ao que está aí, e com isso perdemos espaço, bandas, festivais de médio e grande porte e sobrevivemos graças ao suor e dedicação de uma dúzia de almas (NR: figurativo, tá?), que ainda se prestam a manter o nome Heavy Metal brasileiro em ascensão, isso a duras penas, seja ela de muito trabalho, muito investimento monetário e pessoal e de muito tempo dedicado ao que, para eles, é uma forma de vida e uma demonstração de amor.
Ultimamente, tivemos dois episódios de comoção geral: o falecimento de dois grandes nomes da música pesada nacional, Mário Linhares e Fabiano Penna (NR: das bandas Dark Avenger e Rebaelliun respectivamente) que vieram a falecer de forma inesperada e seus familiares e amigos buscaram a ajuda dos fãs para arcarem com as despesas hospitalares e de funeral de ambos. Confesso a vocês que me senti agradecido por ver que foram muitas as pessoas que se propuseram a ajudar, fosse da maneira que fosse, com pequenas ou grandes doações, mas que, naquele momento, foram de grande ajuda humanitária. Mas que deixaram claro que até em momentos muito difíceis, os fãs são a base de sobrevivência de quem se arrisca a viver em função da música neste país de forma profissional e, muitas vezes, não recebe retorno suficiente para sobreviver com o mínimo possível de dignidade. Aproveito o momento para render homenagens a Cherry Sickbeat, guitarrista do Nervochaos e Hellsakura, pelo seu passamento precoce.
Eu acreditava cegamente que o Metal brasileiro havia perdido muito de sua irreverência, de sua espontaneidade e, acima de tudo, havia perdido muito de sua humanidade, mas a iniciativa de muitos diante dessa necessidade me fez rever alguns pontos e voltar a acreditar que um dia nosso cenário possa vir a ser grande, como já deu mostras de ser um dia.