Hoje já se tornou corriqueiro falar sobre Big Four. São aquelas quatro grandes bandas do Thrash Metal que, eu creio, não tenho a menor necessidade de listar. Discussões ou preferências à parte, eu tenho convicção de que o Anthrax está nesse grupo ocupando o devido espaço que merece, mas, também sem dúvidas, posso afirmar que esse lugar foi conquistado, muito em parte, pela existência do álbum “Among The Living”, que hoje comemora trinta anos de seu lançamento.
Isso porque o status que o Anthrax tem hoje foi alcançado com esse disco e com nenhum anterior (onde ainda tentavam encontrar uma identidade), nem posterior (onde tentavam repetir a fórmula). Os dois primeiros discos do Anthrax – “Fistful Of Metal” e “Spreading The Disease” – são espetaculares, acima da média, e tem algumas músicas que estão, certamente, entre minhas favoritas, mais até do que muitas que constam no “Among The Living”, mas não tem como negar que, por melhor e mais cultuados que sejam, o estilo Anthrax de fazer Thrash Metal se consolidou no “Among The Living” e fez com que a banda dominasse o mundo em 1987. Se, naquele ano, houvesse algum instrumento de aferição para medir qual a fita k7 mais copiada, creio que não iria sobrar espaço no pódium para outra banda. “Among The Living” soava tão violento quanto inovador e era impossível parar de ouvi-lo.
Após terem feito suas experiências crossover com o S.O.D., Scott Ian e Charlie Benante, os dois cabeças do Anthrax, introduziram de vez os elementos sonoros das bandas de Hardcore de sua New York natal, dentro da musicalidade do Anthrax: Agnostic Front, Cro-Mags, Murphy´s Law… A vibe hardcore, mesclada com as bases thrash de Scott Ian, um dos melhores guitarristas base nesse estilo, proporcionou um disco cuja perfeição só resvala (bem pouquinho) na capa, que até que é legal, mas peca por homenagear um filme muito ruim, “Poltergeist 2”, que felizmente já foi esquecido pela memória cinematográfica coletiva.
Além de Scott Ian, a banda tinha o privilégio de ter instrumentistas extraordinários como o já mencionado baterista Charlie Benante e o versátil baixista Frank Bello. Esses, acrescidos do guitarrista Dan Spitz e dos vocais de Joe Belladonna que é, e sempre será para muitos, o vocalista definitivo do Anthrax, compuseram um disco tão variado quanto equilibrado, onde a excelência das canções menos presentes em seus setlists, como “Skeleton In the Closet”, “One World”, “Horror Of It All” e “Imitation Of Life” convivem no mesmo nível das mais conhecidas, como “I Am The Law”, com sua letra sobre o personagem Judge Dreed, “Caught In A Mosh”, “Indians”, que sempre estará vinculada à figura de Beladonna atravessando o palco usando um cocar de índio, ou a faixa título, baseada no livro “A Dança Da Morte”, de Stephen King.
https://www.youtube.com/watch?v=tCdsO1mBGE4
Em 1987, nenhum dos outros membros do Big Four lançou disco. O Thrash Metal, nesse ano, viu nascer, entre os seus destaques, os álbuns “Taking Over”, do Overkill, e “The Legacy”, do Testament, que são geniais, é claro, mas que transitavam dentro de uma pegada mais tradicional de thrash. “Among The Living”, pelas novidades que trouxe e pela produção impecável, sob a condução de Eddie Kramer, atingiu de forma fulminante o gosto dos fãs de metal. É certo que, no ano anterior, o Nuclear Assault do ex-Anthrax e também S.O.D., o baixista Danny Lilker, já tinha registrado o seu marco de thrash crossover com o álbum “Game Over”, mas o Nuclear Assault ainda era uma banda estreante, e trabalhava com a pequena Combat Records, enquanto que o Anthrax já possuía um nome de mais evidência no cenário, além de ser distribuído pela Megaforce em parceria com a Island, que pertencia à Polygram, sendo essa uma das razões prováveis para seu álbum ter tido mais destaque, mais alcance, que o de seu ex-integrante que, é importante registrar, co-assinou duas das músicas do álbum: “I Am The Law” e “Imitation Of Life”.
Mas, quem-fez-primeiro-o-quê nem sempre importa tanto. “Among The Living” é relevante e essencial por seu próprios méritos. Foi o disco certo, no momento certo, feito pela banda certa, e inseriu, de forma definitiva, o Anthrax no patamar que ele hoje ocupa, com composições carismáticas e colocando a palavra mosh permanentemente no linguajar cotidiano do Thrash Metal. Se havia alguma dúvida sobre a excelente fase pela qual a banda estava passando, essa pode ser dissipada assistindo o home vídeo “Oidivnikufesin”, que captura um show da turnê de “Among The Living” realizado no extinto Hammersmith Odeon, em Londres, onde a banda aproveitou para quebrar mais alguns paradigmas do thrash, exibindo um clima de diversão que se chocava com a imagem mais sóbria que bandas como Metallica e Slayer ostentavam. Passando por cima dos narizes torcidos, o Anthrax cravou seu nome entre os principais nomes do cenário e influencia, até hoje, muito do que é efeito nas fusões entre groove e velocidade.